quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Fábio Alves: Caos nos mercados

- O Estado de S. Paulo

Espiral negativa das bolsas é cortesia de Trump, que voltou a criticar duramente o Fed

Os mercados globais entraram na última semana de 2018 numa espiral negativa de magnitude semelhante à registrada durante a crise financeira mundial de 2008, com o índice Dow Jones, um dos principais do mercado acionário dos Estados Unidos, fechando na segunda-feira com a pior queda em um pregão de véspera de Natal em cem anos.

A lista de problemas que paira sobre os mercados globais é extensa: de uma desaceleração mais forte da economia mundial, passando pelo temor de uma escalada na guerra comercial entre Estados Unidos e China até um impacto negativo maior do que o previsto da trajetória de alta dos juros americanos pelo Federal Reserve (Fed).

Sem falar na incerteza gerada com o fechamento parcial do governo americano em meio ao embate do presidente americano Donald Trump e o Congresso sobre o orçamento federal e o financiamento para construção do muro na fronteira entre os Estados Unidos e o México.

Por aqui, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, que tomará posse do cargo na próxima terça-feira, iniciará o seu mandato com um cenário de crise aguda nos mercados internacionais, o que deve exigir urgência na aprovação da reforma da Previdência e de outras medidas de ajuste fiscal a fim de evitar um estrago maior à economia brasileira.

O nervosismo dos investidores já vem afetando com intensidade as bolsas de valores, as cotações das principais commodities e as moedas internacionais desde a semana passada, mas nesta semana a turbulência pode se agravar e contaminar um maior número de mercados.

Ontem, dia de Natal, o índice Nikkei, da bolsa de valores de Tóquio, despencou 5%, entrando no que os investidores chamam de bear market – quando um ativo acumula queda de mais de 20% em relação ao seu pico mais recente de alta.

Historicamente, o bear market é o prenúncio de um longo período de vacas magras, pois, desde a Segunda Guerra Mundial, esse declínio nos preços dura, em média, 13 meses, levando um determinado mercado a perder até um terço de seu valor.

Nos Estados Unidos, na sessão da véspera de Natal, o índice Dow Jones recuou mais de 650 pontos, ou 2,9%, para 21.792,20 pontos. O índice S&P 500 fechou em queda de 2,7%. O Nasdaq, que havia entrado no bear market na sexta-feira passada, caiu 2,2%. Na semana passada, o Dow Jones já havia caído 6,8% e o S&P 500, 7%.

Também na segunda-feira, o preço do barril do petróleo West Texas Intermediate (WTI) desabou 6,7% para US$ 42,53, o menor nível em 18 meses. A cotação do barril do petróleo Brent caiu 6,2% para US$ 50,47.

O caos desta semana nos mercados financeiros é cortesia de Donald Trump, que usou sua conta numa rede social, na segunda-feira, para voltar a criticar duramente o Fed ao dizer que o Banco Central americano é “o único problema da nossa economia”.

Essa declaração deixou os investidores mais nervosos, após relatos, em notícias de bastidores publicadas na semana passada, de que Trump estaria cogitando demitir o presidente do Fed, Jerome Powell.

Mesmo que a demissão dele, do ponto de vista jurídico, não seja tão simples, embora esteja nas mãos do presidente americano o poder de nomear o chefe do Fed, a mera discussão de remover Powell do cargo alimentou a insegurança dos investidores, uma vez que o BC americano é a referência de solidez em tempos de crise global.

Para agravar a instabilidade dos mercados, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Steven Mnuchin, divulgou, na segunda-feira, um comunicado informando que havia se reunido com os principais executivos dos seis maiores bancos americanos para se assegurar que essas instituições operavam com liquidez e com capacidade para fazer empréstimos a consumidores e empresas.

Essa tentativa de acalmar os mercados acabou colocando mais lenha na fogueira, uma vez que os investidores interpretaram isso como um sinal de que o governo americano está, de fato, muito preocupado com a situação da economia e dos mercados nos Estados Unidos.

Na crise financeira de 2008, toda vez que um representante de um banco vinha a público dizer que estava tudo bem, a instituição acabava sofrendo um ataque especulativo. Quanto mais se falar desnecessariamente neste momento, pior pode ser o resultado. Mas alguém precisa dizer isso a Trump.

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