sábado, 2 de março de 2019

João Domingos: Governar é preciso

- O Estado de S.Paulo

Um presidente demonstra que quem manda é ele quando pensa no sucesso do governo

Dois meses depois de tomar posse como presidente da República com um discurso de que a partir de agora trabalharia para unir o Brasil e os brasileiros, a impressão que ainda se tem de Jair Bolsonaro é a de que ele continua em campanha. É até chato escrever isso. Torna-se repetitivo, parece que o assunto não muda. Mas Bolsonaro tem agido mais como o combatente que sempre foi nos quase 28 anos numa cadeira na Câmara dos Deputados do que o presidente de todos os brasileiros.

Na Câmara, logo que assumiu seu primeiro mandato, em 1991, Bolsonaro combateu pela melhoria das condições de trabalho dos militares em marchas e concentrações junto com as mulheres de oficiais, repetindo o que fizera como capitão do Exército, em 1986, ao escrever um artigo para a revista Veja, no qual criticava os baixos salários nos quartéis. Foi preso por 15 dias, por indisciplina, por causa de seu ponto de vista, mas conquistou simpatias de colegas por todo o País. À frente, foi absolvido pelo Superior Tribunal Militar (STM). Também como deputado combateu para ter o direito de matricular os filhos no Colégio Militar de Brasília, atacou o governo de Fernando Henrique Cardoso, que segundo ele prejudicou os militares, e até pregou o fuzilamento do ex-presidente.

Ao longo de sua carreira de deputado, Bolsonaro notabilizou-se também por combater os governos do PT, sua política de direitos humanos, alguns colegas da Câmara, como a deputada Maria do Rosário (PT-RS) e o ex-deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que renunciou ao mandato e foi morar no exterior, sob o argumento de que não se sentia mais seguro no País. Foi essa mesma vocação para o combate que levou Bolsonaro à vitória, pois conseguiu passar ao eleitor a mensagem de que era o candidato anti-Lula e anti-PT. Por consequência, contra a corrupção e a favor de uma agenda conservadora nos costumes, além de ser favorável à liberação da posse de armas.

*Murillo de Aragão: Desvendando o enigma Brasil

- O Estado de S.Paulo

A questão da imagem do nosso país no mundo deve ser abordada de forma estratégica

A eleição de Jair Bolsonaro e a extensa agenda de reformas e oportunidades econômicas no Brasil fazem crescer o interesse internacional pelo País. Investidores querem saber se o ambiente de investimentos vai ser melhor e se a reforma da Previdência Social vai passar, entre outras perguntas. Porém muitas delas revelam desinformação sobre o que o Brasil fez e comprovam que ainda somos um enigma para a maioria no exterior. Faltam informações sobre o que já foi feito no nosso país em termos de reformas.

Fica claro para mim que o Brasil, mesmo sendo a oitava economia do mundo e um dos principais parceiros dos Estados Unidos, da China e da Europa, é um país de nicho. Ou seja, as pessoas olham o Brasil por motivações muito específicas. Impressiona quanto o nosso país não é percebido, com seus problemas, oportunidades e vantagens, de forma precisa.

A chave da desinformação está nas percepções sobre a região. Parte da opinião pública internacional acha que a América do Sul não está inserida nos atuais problemas da humanidade. Sem grandes conflitos globais, ficamos numa região periférica para o fluxo de informações no mundo e, também, para o debate geopolítico ora em curso. Mas dadas as circunstâncias atuais, tanto o ambiente econômico do Brasil quanto a configuração geopolítica do mundo podem favorecer muito o nosso país. Cada vez mais seremos estratégicos na produção de alimentos e de energia, entre outros aspectos essenciais para a humanidade.

*Miguel Reale Júnior: O estamento burocrático

- O Estado de S.Paulo

Cumpre apoiar a redução da desigualdade previdenciária entre o setor privado e o público

A maior preocupação do dr. Ulysses Guimarães, a partir do texto produzido pela Comissão de Sistematização na Assembleia Nacional Constituinte, dizia respeito à previdência social, em vista dos benefícios concedidos ao servidor público e ao valor mínimo da aposentadoria no setor privado. Em reuniões prolongadas com técnicos em cálculo atuarial, faziam-se exames de receita e despesa para ver se a conta fechava. Havia, então, diferença em face dos dias atuais, com taxa menor de desemprego e reduzido índice de trabalho informal, sem o elevado número de hoje dos não contribuintes do INSS.

Mas a questão principal consistiu na criação de duas distintas camadas sociais. No primeiro degrau foi colocada a massa de trabalhadores do setor privado; acima, o estamento burocrático, composto pelos servidores públicos dos três Poderes das unidades da Federação: União, Estados e municípios.

Raymundo Faoro, em Os Donos do Poder, bem assevera que “o estamento burocrático comanda o ramo civil e militar da administração e, dessa base, com aparelhamento próprio, invade e dirige a esfera econômica, política e financeira”.

Com a supremacia do estamento instala-se a forma patrimonialista de exercício do poder, que atua segundo critérios personalíssimos, confundindo o público e o privado. O importante era ter a caneta que nomeia, cimentando-se a rede de relacionamento entre os detentores do poder, na qual vige a cordialidade de que fala Sérgio Buarque de Holanda.

Adriana Fernandes: A Receita virou alvo

- O Estado de S.Paulo

Alvos poderosos querem desqualificar operação que investiga fraudes tributárias

O vazamento de dados sigilosos da Receita Federal relacionados a agentes públicos que foram alvo de um pente-fino mergulhou o órgão na mais grave crise institucional da sua história. Nenhuma das crises mais recentes pelas quais passou o Fisco brasileiro o colocou em atrito com poderes diversos como Judiciário, Congresso, Ministério Público e o Tribunal de Contas da União (TCU).

Em jogo, está a atuação da fiscalização da Receita que colocou um time de elite de auditores, no ano passado, para investigar indícios de fraudes tributárias de agentes públicos. A operação chegou a alvos poderosos que agora se movimentam para desqualificar a operação, com a pecha de ser comparada a uma espécie de “Gestapo” de um Estado policialesco no País.

Dos 134 agentes públicos mapeados pela Equipe Especial de Programação de Combate a Fraudes Tributárias (EEP Fraude), que demonstraram a necessidade de análises adicionais, 79 foram descartados em um segundo momento por falta de indícios concretos. Do restante, 20 agentes públicos são alvo de investigação, 17 possuem procedimento agendado e outros 26 estão “sob análise para programação”.

Os nomes não foram divulgados. Mas o vazamento a conta-gotas de que integrantes do alto escalão do Judiciário, entre eles o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes; Roberta Maria Rangel, mulher do presidente do Supremo, Dias Toffoli; e a ministra Isabel Gallotti, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estavam em uma lista preliminar do grupo provocou um contra-ataque sem precedentes à atuação da fiscalização da Receita.

José Márcio Camargo*: Um difícil começo

- O Estado de S.Paulo

A desarticulação do governo ficou patente recentemente; risco de a Nova Previdência fracassar não é desprezível

Os primeiros dois meses do governo Bolsonaro foram particularmente difíceis. Além das dificuldades naturais de um início de governo, o presidente ficou quase 20 dias internado no hospital e foi submetido a uma nova cirurgia, a quarta em menos de seis meses.

Antes mesmo de receber alta, Jair Bolsonaro se indispôs publicamente com um de seus mais próximos aliados, um aliado de primeira hora, que comandou a campanha eleitoral e era considerado um dos pilares do governo. Os ríspidos diálogos por meio das redes sociais mostraram um presidente claramente nervoso e com pouco controle emocional.

Sem dúvida, pelo menos em parte, este comportamento está ligado aos efeitos de quatro anestesias gerais em menos de seis meses, ao longo período de internação hospitalar, além do nervosismo próprio de um início de mandato. De qualquer forma, o episódio levanta preocupação quanto ao futuro.

A eleição para a presidência da Câmara dos Deputados consagrou a liderança de Rodrigo Maia (DEM-RJ), reeleito em primeiro turno com mais de 300 votos, ao mesmo tempo que uma batalha sangrenta se desenrolava na eleição para a presidência do Senado. Ali, no final, o candidato apoiado pelo governo, Davi Alcolumbre (DEM-AP), surpreendeu e venceu o experiente senador Renan Calheiros (MDB-AL), fortalecendo seu “padrinho”, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, credenciando-o para assumir a articulação política do governo.

A batalha deixou feridas, que terão de ser curadas. A nomeação do senador Fernando Coelho (MDB-PE) para a liderança do governo no Senado é parte deste processo. Mas o importante é que as presidências das duas Casas Legislativas foram ocupadas por apoiadores incondicionais das reformas.

Míriam Leitão: Maia no papel de articulador

- O Globo

Rodrigo Maia alerta que o governo ainda não tem votos para a Previdência e diz que quem ganha eleição tem que saber fazer aliados

Em um governo tão cheio de improvisos e erros na relação com o Congresso, o papel do deputado Rodrigo Maia tem crescido. Ele passou a semana dando os conselhos certos na busca da reforma da Previdência. Até os integrantes do executivo acham que Maia pode ser o grande articulador da reforma. “O governo pode encaminhar o que quiser, mas se o presidente da Câmara não quiser não tem pauta.”

Foi o que ele me disse quando, numa entrevista na Globonews, perguntei se não era estranho que ele, presidente de uma das Casas do poder legislativo, seja o grande articulador do projeto do executivo:

— Quando você constrói uma candidatura para a presidência da Câmara, você tem uma agenda. Como o sistema é presidencialista, quem decide o que será colocado na pauta é o presidente da Câmara.

Ele explicou, contudo, que esse poder tem que ser compartilhado com os líderes, e o presidente tem que estar presente sempre na articulação. Disse que exerceu essa liderança no governo Temer, mas “ela estava mais organizada”. Pelas contas dele, hoje não tem mais que 50 votos a favor da reforma:

— A gente precisa, antes de exercer qualquer liderança, tentar organizar junto com os líderes o que vai ser a tal maioria que o governo necessita para aprovar as reformas. O sistema brasileiro é híbrido, é quase semiparlamentarista.

Hélio Schwartsman: Moro se apequena

- Folha de S. Paulo

Desnomeação de Ilona Szabó mostra que ministro não tem plenos poderes para lutar contra a corrupção

O episódio da desnomeação de Ilona Szabó para uma vaga de suplente no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) apequena a biografia do ministro Sergio Moro e engrandece a estultícia do núcleo duro do governo. Comecemos pela última parte.

Não se questionam as credenciais de Szabó para participar do Conselho. Ela atua há 15 anos como especialista em segurança pública, tem título acadêmico na área por instituição estrangeira de renome (Universidade de Uppsala) e goza de prestígio entre os pares. É verdade que ela se opõe à política do governo de flexibilizar a posse e o porte de armas, mas essa é uma posição quase consensual entre os acadêmicos.

Quando as redes sociais do bolsonarismo, capitaneadas pela incansável prole presidencial, “vetam” o nome de Szabó, revelam uma ignorância abissal em relação ao que sejam conselhos. Se o objetivo é consolidar certezas que governantes já têm, nem seria preciso dar-se ao trabalho de criar esses órgãos.

Julianna Sofia: Cara de palhaço

- Folha de S. Paulo

Deputados se esbaldam em Carnaval prolongado às custas da Viúva

Embora a mais autêntica pândega brasileira, o Carnaval nem feriado nacional é. À exceção de estados e municípios onde lei local assim o designa, o período equivale a dias regulares de trabalho, em que órgãos públicos e empresas privadas podem exigir atividade normal de seus funcionários, e faltas podem ser descontadas dos salários. Dispensa é questão de liberalidade.

Isso vale para um cidadão ordinário —aquele com cara de palhaço.

Na quarta-feira (27), a Folha flagrou o início da patuscada na Câmara dos Deputados. Eram seis da manhã, quando o painel de presença da Casa foi aberto para que os congressistas pudessem marcar seus nomes para a sessão que só começaria três horas mais tarde.

Antes das 8h, 11 deputados já tinham se registrado. O interesse nas votações que se seguiriam (acordos internacionais) era próximo de zero. O motivo real para a madrugada no plenário era garantir presença, embarcar para o estado de origem e deleitar-se num feriado prolongado.

Demétrio Magnoli*: Diante do enigma venezuelano

- Folha de S. Paulo

A negação de uma estratégia desvairada não equivale à definição de uma positiva

O "Deus de Trump" invocado por Ernesto Araújo não funcionou. No 23 de fevereiro, suposto Dia D, Maduro escapou do "xeque-mate humanitário", provando que ainda mantém controle sobre a alta oficialidade. A estratégia fracassada representou uma nítida derrota para o líder opositor Juan Guaidó, mas também para Donald Trump e o presidente colombiano Iván Duque. O Brasil só não amargou completa desmoralização porque, na hora H, Bolsonaro entregou o comando ao vice, Hamilton Mourão, assinando uma demissão branca do chanceler Araújo. Há lições a extrair do episódio.

A disputa de poder na Venezuela contrapõe o Executivo (isto é, a ditadura do chavismo terminal) ao Parlamento (isto é, a maioria oposicionista oriunda das derradeiras eleições livres no país). O Parlamento conta com apoio internacional majoritário e o respaldo da maior parte do povo. Contudo, o Executivo tem as armas, pois o regime equilibra-se sobre a aliança entre o aparato político chavista e a cúpula militar. Nesse cenário, a queda de Maduro depende de uma cisão entre os componentes da aliança cívico-militar que o sustenta.

A ideia de uma intervenção militar liderada pelos EUA só passa pelos desvarios conspiratórios de correntes extremistas com as quais o neófito Araújo extravasa seus impulsos infantis. Trump não organiza retiradas americanas da Síria e do Afeganistão para se envolver numa ação isolada na América do Sul. Duque não reativará a guerra civil colombiana em nome da democracia na Venezuela. Os militares brasileiros rejeitam a perspectiva de produzir uma Síria na faixa de fronteira amazônica. O chefe do Itamaraty que clamou por um corredor de invasão a partir de Roraima é evidência dos riscos que Bolsonaro corre ao nomear acólitos do Bruxo da Virgínia a postos de responsabilidade.

Ricardo Noblat: Bolsonaro e os apagadores de incêndios

- Blog do Noblat / Veja

Chamem o Mourão!

Repetiu-se ontem o que já se tornou corriqueiro nos últimos dois meses: o presidente Bolsonaro ateia mais um fogo e autoridades do governo e líderes de partidos aliados se apressam imediatamente em tentar apagá-lo. Muitas vezes funciona. Das vezes que não, ficam restos em brasa do estrago provocado. É um perigo.

Em seu primeiro café da manhã no Palácio do Planalto com jornalistas selecionados por ele mesmo, Bolsonaro precipitou-se em identificar vários pontos da proposta de reforma da Previdência que poderiam ser modificados – entre eles, o teto de 62 anos para aposentadoria das mulheres. Admitiu baixá-lo para 60 anos.

Foi um alvoroço dentro da equipe econômica comandada por Paulo “Posto Ipiranga” Guedes, e entre os militares que cercam de perto Bolsonaro. Se logo de saída, sem que tenha começado a negociação com o Congresso para aprovação da reforma, o presidente começa a fazer concessões, como será mais tarde? O que sobrará dela?

O chefe da brigada dos apagadores de incêndio correu a apagar o fogo que ameaçava se alastrar. Acostumado à tarefa, o vice-presidente Hamilton Mourão disse que Bolsonaro foi mal interpretado. E ofereceu a interpretação que julga correta:

– O presidente mostrou que tem coisas que o Congresso poderá negociar ou mudar. Só isso. Não que ele concorde.

O que disse Mourão havia sido antecipado pelo líder do governo na Câmara, major Vitor Hugo (PSL-GO), outro brigadista. Segundo o major, Bolsonaro limitou-se a demonstrar a disposição do governo de negociar” a reforma. Calado estava, e calado permaneceu o ministro de tudo o que tem a ver com a economia, inclusive os penduricalhos.

Francisco Leali: A revogação da carta branca dada a Moro

- O Globo

Quando, em novembro do ano passado, anunciou que embarcaria no governo Bolsonaro, o então juiz Sergio Moro prometeu que não mancharia sua biografia. Na época, tinha recebido do então futuro presidente da República carta branca para combater o crime organizado e a corrupção. No último dia do segundo mês da gestão, Bolsonaro revogou a promessa. Tirou do ministro a autonomia prometida.

Moro foi submetido ao constrangimento público de ter que revogar a nomeação da cientista política Ilona Szabó, indicada por ele para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, um posto apenas de caráter consultivo. A “desnomeação” ocorreu 24 horas após a escolha de Moro. Bolsonaro, num telefonema, desfez o ato do ministro. Bem diferente do Bolsonaro que, no dia 1º de novembro do ano passado declarou:

Fausto Macedo: A carta não era tão branca assim?

- O Estado de S. Paulo

Acumulam-se ocorrências que vão derrubando inapelavelmente alguns projetos dos sonhos de Moro

Em meio à instabilidade de um governo em ziguezague, a carta publicamente outorgada a Sérgio Moro já não é tão branca como o próprio Bolsonaro, ainda em novembro, anunciou, feito o convite ao então meritíssimo da Lava Jato. Nas últimas semanas, acumulam-se ocorrências que mostram um governo frágil, à mercê das bases e da velha política dominante no Congresso - e que vão derrubando inapelavelmente alguns projetos dos sonhos de Moro.

Já no início do governo, o primeiro revés de Moro foi o decreto que flexibiliza a posse de armas de fogo. O texto levado à Câmara atropelou sete restrições do ministro, que ficou chateado, sim, mas aparentemente relevou.

Depois, o emblemático episódio da criminalização do caixa 2, tão cara ao ex-juiz que, em sua época de toga, tocava o terror nos partidos e enquadrava políticos por corrupção e lavagem de dinheiro, infração eleitoral que nada.

Ao fatiar o pacote anticrime, que altera 14 leis de uma só vez, Moro disse que se tratava de uma "estratégia" para a tramitação do projeto e que o governo foi "sensível" às reclamações "razoáveis" de parlamentares de que o delito é menos grave que o crime organizado violento.

"Caixa 2 não é corrupção. Existe o crime de corrupção e o crime de caixa 2. Os dois crimes são graves", rendeu-se o ministro.

Em dois meses, Moro coleciona recuos após ordens de Bolsonaro

Após interferências em projeto sobre armas e em pacote anticrime, ministro teve que demitir especialista por decisão do presidente

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Dois meses após tomar posse com status de superministro, Sergio Moro já coleciona derrotas e recuos que foi obrigado a fazer publicamente após contraordens do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL).

O ministro da Justiça e Segurança Pública aceitou deixar a carreira de juiz federal para assumir a pasta sob o argumento de que estava "cansado de tomar bola nas costas". Mas, em 60 dias de governo, tem enfrentado problemas parecidos.

A última delas ocorreu nesta quinta-feira (28), quando o ministro da Justiça teve de voltar atrás, a contragosto, na nomeação da especialista em segurança pública Ilona Szabó. Ele a havia indicado para ser membro suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.

Antes desse caso, Moro já havia se deparado com outros episódios de constrangimento, o que tem gerado desgaste e irritado o ministro. Moro, segundo assessores próximos, passou a quinta-feira de cara fechada.

Logo nos primeiros dias no cargo, Moro recebeu a missão de concretizar mudanças na legislação para dar aos cidadãos mais acesso à posse de armas, bandeira de Bolsonaro durante a campanha presidencial do ano passado.

Desde o começo, o ministro tentara se desvincular da autoria da ideia, ao dizer nos bastidores que apenas estava cumprindo ordens do presidente.

Na elaboração do decreto, que foi publicado em janeiro, algumas de suas sugestões foram ignoradas, como o número de armas que poderia ser registrado por pessoa —ele defendeu que tinham que ser apenas duas e não quatro, como acabou estabelecido no decreto sobre o assunto.

Em outro caso, o ministro viu o governo interferir naquilo que mais se dedicou desde a posse, seu pacote anticrime, que reúne projetos de leis apresentados ao Congresso em fevereiro.

Entre as medidas, Moro incluiu a criminalização do caixa dois. Dias depois, no entanto, soube que, por decisão do Palácio do Planalto, o tema iria tramitar separadamente do restante das propostas, que incluem mudanças na legislação sobre crime organizado, corrupção e tráfico de drogas.

A ideia de tirar a criminalização do caixa dois do texto principal visou atenuar a resistência de parlamentares e acabou expondo Moro por confrontar seu discurso de ministro em relação ao de juiz.

Como juiz, Moro enfatizava a gravidade do caixa dois. "Muitas vezes [o caixa dois] é visto como um ilícito menor, mas é trapaça numa eleição", afirmou em agosto de 2016.

Como ministro de Bolsonaro, diante da decisão de separar a proposta de criminalização do projeto principal, Moro afirmou ter atendido à queixa de alguns políticos de que "o caixa dois é um crime grave, mas não tem a mesma gravidade que corrupção, crime organizado e crimes violentos".

Criticada por bolsonaristas decide deixar outro conselho

Um dia depois de ser destituída de colegiado, Ilona Szabó anunciou que deixará órgão de segurança pública

Renata Mariz e Jailton de Carvalho / O Globo

BRASÍLIA - Um dia depois de ser excluída do Conselho Nacional de Política Criminale Penitenciária (CNPCP) por determinação do presidente Jair Bolsonaro, a cientista política Ilona Szabó, do Instituto Igarapé, anunciou ontem que vai deixar o Conselho Nacional de Segurança Pública, presidido pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. Ilona foi afastada do colegiado 24 horas após ser nomeada para o cargo. Ela é defensora do Estatuto do Desarmamento e sua indicação foi criticada nas redes sociais por apoiadores do presidente.

— Sair de um (conselho) não implicaria sair de outro, mas nesse momento não há condições reais de troca e colaboração. Espero que isso mude ao longo desse governo —disse Ilona. O Conselho Nacional de Segurança Pública faz parte do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e tem, entre suas atribuições, supervisionar a implementação do Plano Nacional de Segurança Pública. Já o CNPCP é uma instância de caráter consultivo e tem como principal atividade a elaboração das regras do decreto de indulto de Natal. As sugestões podem ou não serem acolhidas pelo ministro da Justiça e pelo presidente da República.

O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, criticou o recuo de Moro em relação à nomeação de Ilona. Logo depois da saída de Ilona, Lima também pediu para se desligar do Conselho Nacional de Segurança Pública em solidariedade à colega.

— A carta branca dada ao superministro foi revogada. Ele não consegue escolher nem um suplente do Conselho Nacional de Política Criminal? Alguma coisa está errada —disse Lima.

SEM MULHERES
A promotora Mônica Barroso, do Ministério Público da Bahia, também pediu demissão do Conselho Nacional de Política Criminal na quinta-feira. Ela diz que a decisão é anterior à saída de Ilona, mas também lamentou o afastamento da colega. Com a exclusão de Ilona, logo depois da saída de Mônica, o Conselho Nacional não terá mais mulheres entre seus integrantes. —Acho uma pena que uma representação da sociedade civil com tanto preparo na área da segurança pública não esteja presente no conselho. Enriqueceria muito os debates —disse a promotora.

Moro sofre dissabores no comando da Justiça

Último revés é demissão de cientista política de conselho após pressão do presidente Jair Bolsonaro

Redação, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Desde que trocou a toga pelo cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro, Sérgio Moro vem contabilizando dissabores. O último foi a demissão da cientista política Ilona Szabó de um cargo de suplente no Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Numa queda de braço em que é difícil dizer se o adversário é real ou apenas um robô, Moro perdeu. Bolsonaro optou por atender a parte de seus seguidores nas redes sociais e tirou de Moro a autonomia de indicar até mesmo uma suplente na sua pasta.

Os amigos dizem que Moro se achava preparado para enfrentar Brasília depois de ter tocado a Operação Lava Jato, que prendeu políticos do alto escalão e empresários do primeiro time, mas já teria entendido que o jogo da política é bem diferente.

Apesar disso, quem convive com o ministro diz que ele não sairia do governo por causa do episódio envolvendo Ilona Szabó. Mas ninguém garante que teria o mesmo comportamento se a interferência chegar a cargos do primeiro escalão do ministério. Moro não aceitaria, por exemplo, uma ordem para demitir um de seus secretários.

‘Superministro’. Quando aceitou a vaga no governo, Moro recebeu de Bolsonaro a garantia de que teria autonomia para atuar e ganhou o título de “superministro”. “Eu não vou interferir em absolutamente nada que venha a ocorrer dentro da Justiça no tocante a esse combate à corrupção. Mesmo que viesse a mexer com alguém da minha família no futuro. Não importa. Eu disse a ele. É liberdade total para trabalhar pelo Brasil”, sustentou o então presidente eleito em novembro.

Bolsonaro atendeu também ao pedido de Moro para que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) saísse da alçada do Ministério da Fazenda para ficar subordinado à Justiça. Foi o órgão que descobriu movimentações atípicas nas contas do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho mais velho do presidente, e do seu ex-assessor Fabrício Queiroz. Quando Bolsonaro garantiu autonomia a Moro, ainda na transição, esses fatos não eram públicos.

As descobertas do Coaf tiraram protagonismo do filho do presidente, que reduziu o ritmo de postagens nas redes sociais. Na madrugada de desta sexta-feira, 1.º, porém, Flávio postou uma crítica à nomeação de Ilona. “Meu ponto de vista é como essa Ilana (sic) Szabó aceita fazer parte do governo Bolsonaro. É muita cara de pau junto com uma vontade louca de sabotar, só pode”, escreveu às 2h14.

Queiroz: salários eram investidos na base de Flávio

Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Alerj, disse em depoimento por escrito ao Ministério Público que recolhia parte dos salários de outros integrantes do gabinete para investir na “multiplicação da base’’ do político. Em nota, a Alerj, diz que tal prática não é permitida.

Queiroz: salários ‘multiplicavam base’ de Flávio

Ex-assessor do então deputado afirma ter criado ‘plano’ para gerenciar rendimentos de servidores sem parlamentar saber; para especialista, iniciativa pode configurar improbidade administrativa

- O Globo

Investigado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeira (Coaf), que apontou “movimentações atípicas” em suas contas, o ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL) na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) Fabrício Queiroz admitiu, em depoimento por escrito ao Ministério Público do Rio, que fazia o “gerenciamento” de valores recebidos por servidores do gabinete do então deputado, assim como coordenava “os trabalhos e demandas” para expandir as redes de contato e de colaboradores do parlamentar.

Os salários recolhidos, segundo o ex-assessor, pagariam outros funcionários não nomeados. Queiroz afirmou ainda que, por ter a confiança e autonomia dadas por Flávio Bolsonaro, nomeava assistentes no gabinete por julgar certo que a melhor maneira de “intensificar a atuação política seria a multiplicação dos assessores da base eleitoral”, gerenciando os valores que cada um destes recebia mensalmente, sem precisar dar satisfações a Flávio sobre a “arquitetura interna do mecanismo que criou”. E que seus superiores não tinham qualquer conhecimento de sua atuação.

Esta é a primeira vez que Queiroz se manifesta à Justiça sobre o assunto após sucessivos pedidos feitos pelo MP-RJ. Nas primeiras vezes, o ex-assessor faltou aos depoimentos sob a alegação da defesa de que não houve acesso completo à apuração.

Depois, a justificativa passou a ser o quadro de saúde de Queiroz. Ele passa por um tratamento contra um câncer. O depoimento do ex-assessor parlamentar foi revelado pelo SBT. A assessoria do senador Flávio Bolsonaro afirmou que não irá se manifestar sobre o depoimento de Queiroz. O Ministério Público informou apenas que a investigação está sob sigilo.

Após declarações de Bolsonaro, governo faz plano para limitar falas sobre reforma

Possibilidade de alteração da idade mínima para mulheres irritou Guedes e Maia

Thiago Resende, Gustavo Uribe / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Com o incômodo gerado por declaração de Jair Bolsonaro sobre mudança na reforma previdenciária, o Palácio do Planalto prepara um plano para limitar os comentários do presidente sobre o assunto.

A ideia, defendida por integrantes das áreas econômica e militar, é que ele comente em público apenas aspectos sociais ou pouco sensíveis da proposta, evitando pontos polêmicos que possam gerar mal-estar com o Poder Legislativo.

Em café da manhã com veículos de imprensa, na quinta-feira (28), Bolsonaro indicou que a idade mínima para que mulheres tenham direito a se aposentar pode ser de 60 anos. No texto enviado, a previsão é de 62 anos.

Ele também disse que o modelo proposto para benefícios pagos a idosos carentes, o chamado BPC (Benefício de Prestação Continuada),também poderia ser discutido, além da fórmula de cálculo de pensão por morte, que reduz o valor a ser recebido.

Os recuos sinalizados por Bolsonaro irritaram o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que é um dos grandes fiadores da proposta liberal, o que levou a equipe de governo a montar uma operação para conter os danos da declaração.

Guedes e Maia foram surpreendidos pelas notícias, principalmente porque a tramitação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) mal começou. O texto foi apresentado na semana passada e ainda não começou a ser discutido pelo Poder Legislativo.

Segundo relatos feitos à Folha, para evitar novos desconfortos, o presidente foi aconselhado, a partir de agora, a salientar que, apesar da proposta ter sido formulada pelo Executivo, eventuais mudanças são um assunto do Congresso.

A equipe presidencial ainda pretende pautá-lo a focar suas manifestações públicas em apenas três ou quatro itens, que sejam consenso e não tenham discordâncias, do conjunto de medidas que endurece os critérios para o recebimento de aposentadorias.

Apesar de ter 28 anos de experiência como deputado federal, o presidente cometeu um erro, na avaliação de integrantes do governo. Ele se precipitou e mostrou disposição a flexibilizar o texto, inclusive em pontos que não estavam no centro das discussões.

Com economia em ritmo lento, governo tenta destravar crédito para empresas

Equipe econômica trabalha em pacote para facilitar a apresentação de garantias das empresas na contratação de financiamentos

Adriana Fernandes, Idiana Tomazelli e Renata Pedini, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Com a retomada do crescimento ainda em ritmo lento – o que foi demonstrado pela alta do PIB de apenas 1,1% no ano passado –, o governo estuda um pacote de medidas para destravar o crédito às empresas. O Ministério da Economia quer facilitar as garantias que são oferecidas pelas companhias para conseguir financiamento bancário.
Com isso, acredita que pode dar um impulso aos investimentos.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, antecipou que uma das ideias em análise é viabilizar a concessão de garantias com base na expectativa de venda futura, o que no jargão do mercado é apelidado de “fumaça”. Hoje, é permitido que empresas tomem crédito com base em receitas que ingressarão no caixa futuramente a partir de vendas parceladas já realizadas (por exemplo, quando um comerciante vende uma mercadoria em prestações no cartão de crédito).

A intenção agora é permitir que seja dada como garantia a expectativa de receita, e não necessariamente uma operação já feita. Uma empresa com faturamento médio mensal de R$ 1 milhão, por exemplo, poderia empenhar essa projeção como garantia na obtenção de um empréstimo.

Sachsida explicou que, no diagnóstico traçado pelo governo, as empresas continuam com dificuldades de acesso ao crédito por conta de restrições para conseguir oferecer garantias reais nos pedidos de financiamento bancário. Isso ocorre porque, segundo ele, as garantias reais que as empresas detinham foram, em muitos casos, se perdendo durante o longo período de recessão que o País viveu nos últimos anos.

O secretário deixou claro que os modelos de novas garantias que estão sendo analisados servirão para todos os setores e tamanhos de empresas. “Temos a preocupação aqui de que as medidas sejam para todos”, disse. “Vimos no passado que mirar um setor nunca é uma boa ideia. É para todos do mercado.”

O assessor especial do Ministério da Economia, Guilherme Afif, afirma que um dos grandes problemas para o mercado de crédito brasileiro é a concentração bancária, que dificulta o acesso a financiamentos, principalmente para micro e pequenas empresas. “Para os grandes, sempre tem crédito”, afirma.

Pedras da lei: Editorial | Folha de S. Paulo

Ao retirar da Constituição a maioria das regras da Previdência, reforma facilita ajustes no futuro

Se o Congresso aprovar a reforma da Previdência nos termos propostos pelo governo Jair Bolsonaro (PSL), será muito mais fácil mexer nas regras do sistema na próxima vez em que for necessário.

O projeto retira do texto da Constituição a maioria dos dispositivos que regulamentam o acesso aos benefícios previdenciários, o seu cálculo e a forma de reajustá-los.

O plano do governo é fixar normas gerais na Carta e deixar os detalhes para leis complementares, que seriam discutidas no Congresso após a aprovação da reforma.

Até a garantia de que o valor real de pensões e aposentadorias será preservado, hoje inscrita no texto constitucional, desapareceria.

Para o governo, a vantagem estaria na flexibilidade adquirida para rever as regras do sistema sempre que mudanças na economia e no mercado de trabalho o exigirem.

Para mudar qualquer coisa na Constituição, é preciso assegurar o apoio de 308 deputados federais e 49 senadores em duas votações na Câmara e outras duas no Senado.

Modificar uma lei complementar requer esforço político bem menor. Bastam 257 deputados e 41 senadores e apenas uma votação no Senado e duas na Câmara.

O desastre fiscal continua: Editorial | O Estado de S. Paulo

A notícia parece animadora, mas ninguém deve iludir-se com o superávit primário de R$ 46,9 bilhões obtido em janeiro pelo setor público. As contas continuam desarrumadas, o governo geral permanece muito endividado e ajustes e reformas seguem no topo da agenda. Saldos positivos são normais nesse período, e o deste ano é praticamente igual ao de janeiro de 2018. O conjunto do setor público é formado pelos governos central e dos Estados, pelas prefeituras e pela maioria das estatais (Petrobrás e Eletrobrás ficam fora).

Ressalva importante: o saldo primário reflete a operação rotineira do setor público, sem contar os juros. Incluindo-se na conta os encargos financeiros, obtém-se o chamado resultado nominal, muito menos bonito. Em janeiro, esse resultado foi um déficit de R$ 26 bilhões, bem maior que o de um ano antes, R$ 18,7 bilhões, segundo relatório publicado mensalmente pelo Banco Central (BC).

Mas a avaliação fica bem mais clara, e realista, quando se observa o valor acumulado em 12 meses. O déficit nominal, nesse caso, chega a R$ 480 bilhões, equivalentes a 6,95% do Produto Interno Bruto (PIB). No final de 2018 esse resultado ficou em 7,1% do PIB, enquanto a média estimada para países emergentes e de renda média ficou perto de 4%.

Também por outros critérios a situação das contas públicas brasileiras é bem mais complicada que a condição média dos emergentes e também da maior parte dos países desenvolvidos. A dívida bruta do governo geral correspondeu em janeiro a 76,7% do PIB, mesmo nível de dezembro. Novamente a comparação é relevante. Pelo critério do Fundo Monetário Internacional (FMI), a dívida bruta dos países da categoria do Brasil ficou em 2018 em 50,7% do PIB. A brasileira chegou a 88,4%.

O pouco caso da prefeitura com o carnaval do Rio: Editorial | O Globo

Desde que assumiu, há dois anos, prefeito reduziu verbas para os desfiles das escolas de samba

‘Ei, você aí!, me dá um dinheiro aí!, me dá um dinheiro aí!’. Seis décadas depois de lançada, a marchinha composta pelos irmãos Homero, Glauco e Ivan Ferreira, em 1959, soa mais atual do que nunca nos barracões das escolas de samba. Afinal, pode-se dizer que a penúria é um traço comum entre as diferentes bandeiras que passarão este ano pela Marquês de Sapucaí. Desde que o prefeito Marcelo Crivella assumiu, há dois anos, as verbas oficiais para os desfiles encolheram.

Este ano, a prefeitura destinou a cada agremiação do Grupo Especial, que reúne a elite do samba, apenas R$ 500 mil — em 2016, foram R$ 2 milhões. As da Série A (antigo Grupo de Acesso) receberam R$ 250 mil. E o dinheiro só foi liberado às vésperas do carnaval. A título de comparação, a prefeitura de São Paulo deu R$ 1,2 milhão para as grandes escolas, e R$ 783 mil para as do Acesso 1. Ou seja, uma campeoníssima do Rio receberia mais se desfilasse na segunda divisão do samba paulistano.

Crivella diz que é preciso fazer o “desmame” das verbas públicas . “Quem sabe, no ano que vem, este bebê parrudo, de perninhas grossas, já esteja desmamado”, afirmou. É evidente que, num cenário ideal, os desfiles seriam bancados com recursos privados, enquanto as verbas do município ficariam reservadas aos serviços essenciais. Mas não é assim que a bateria toca. Patrocínio no samba sempre existiu. Porém, dança de acordo com o ritmo da economia.

Marcus Pestana: A arrancada do Governo Bolsanaro

- O Tempo (MG)

Ufa, o carnaval chegou! Ninguém é de ferro. Nem só de reforma da previdência e de combate ao crime organizado vivem os brasileiros. Serpentinas e confetes já cruzam os ares. Saem de cena os líderes partidários, ministros, analistas da imprensa, entram em campo pierrôs, colombinas, palhaços. Há a lenda urbana de que o ano no Brasil só começa depois do carnaval. Bobagem, mas...

A ausência involuntária do Presidente em função da nova cirurgia, a novela desnecessária em torno do Ministro Bebianno, as denúncias envolvendo o Senador Flávio Bolsonaro – que por sinal me passou ótima impressão em entrevista na Globonews, algumas declarações inacreditáveis de certos ministros em sua cruzada ideológica conservadora, tudo isso, junto e misturado, desperdiçou muita energia política e, sem dúvida, atrasou o calendário.

O PIB de 2018 reafirmou nosso “voo de galinha”: apenas 1,1%. As contas públicas revelam cada vez mais a fratura exposta do desequilíbrio. O Brasil que deveria perseguir um superávit primário de 3,0% do PIB acumulou, em 2018, um déficit primário de 120 bilhões de reais, fora as despesas financeiras. Temos o desafio do aumento da eficiência e da produtividade. Isto tem a ver com qualidade da educação, inovação tecnológica, desregulamentação do mercado, segurança jurídica, simplificação tributária, privatizações e diminuição do Custo Brasil. Nem tudo são lágrimas. No front externo, temos superávits e reservas confortáveis. E na esfera da política monetária, não há pressões inflacionárias.

O Governo Bolsonaro na verdade começou há quinze dias com a apresentação dos textos da reforma da previdência e do pacote anticrime organizado e anticorrupção. Sem a primeira, não haverá equilíbrio fiscal, juros baixos e volta do crescimento. Na discussão do pacote Moro poderemos não só melhorar os ritos do funcionamento do sistema judiciário, reduzindo o espaço para manobras protelatórias e endurecendo o jogo contra o crime, mas será uma bela oportunidade de regulamentarmos definitivamente questões como delação premiada, execução de sentenças, condução coercitiva, prisões temporárias e preventivas, procedimentos nos inquéritos, etc.

‘Quero oferecer oportunidade para que a revolução seja feita’, diz Roberto Freire no 3º Encontro de Jovens Lideranças da FAP-PPS

- Cleomar Almeida/Assessoria FAP

“Normalmente, as revoluções são feitas pelas novos e não pelos velhos, mas quero, como velho, oferecer a oportunidade para que ela seja feita”. A afirmação é do presidente nacional do PPS (Partido Popular Socialista), Roberto Freire, no encerramento do 3º Encontro de Jovens Lideranças da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), com o apoio do partido.

Diante de 70 participantes de 25 estados brasileiros e do Distrito Federal, Freire confirmou, no final da tarde desta quinta-feira (28), último dia do evento, a realização do Congresso Nacional Extraordinário da sigla, no dia 23 de março, em Brasília, quando deverá ser mudado o nome do partido, em conformidade com as novas exigências da sociedade. O encontro foi realizado pela FAP, em Padre Bernardo (GO).

Apoiado pelo PPS, o evento começou no domingo (24) e foi coordenado por Terezinha Lelis, Paulo Meireles e José Augusto Neves. Durante cinco dias, os jovens realizaram dinâmicas em grupo e assistiram a palestras sobre temas relevantes e de interesse público, como democracia, história do Brasil e do mundo, política, economia, cultura, meio ambiente, sustentabilidade, tecnologia e globalização. Apenas o estado de Mato Grosso (MT) não enviou representante para esta edição do encontro.

O último dia do encontro contou, também, com a presença do diretor financeiro da FAP, Ciro Leichsenring, e do coordenador político nacional da JPS (Juventude Popular Socialista), Samuel da Silva Pinto, o Samuca,

No encerramento, Roberto Freire ouviu a leitura da Carta Aberta da JPS (veja aqui), produzida pelos participantes ao final do encontro e lida pelos porta-vozes escolhidos por eles próprios: o conselheiro da FAP e membro da JPS em São Paulo, Guilherme Mendes; o presidente estadual da JPS no Ceará, Ítalo Alves, que também integra o Movimento Acredito e o PPS Diversidade; e o presidente estadual da JPS no Espírito Santo, Lucas Padilha.

Assim como os demais integrantes da mesa e participantes do encontro, Freire ouviu atentamente a leitura da carta. No documento, os jovens dizem que contam com a colaboração da Executiva Nacional do PPS para atender, principalmente, a cinco reivindicações. Veja abaixo.

1) esclarecimento do atual processo e representação efetiva nos grupos de trabalho para construção do novo PPS;

(2) preenchimento, de fato, da vaga, na Executiva Nacional, por uma ou um membro da JPS;

(3) apoio do partido para ações nacionais e regionais das atividades da juventude para que possam crescer quantitativa e qualitativamente;

(4) garantia de um mínimo de 10% de jovens na composição dos diretórios municipais, estaduais e nacional;

(5) alocação de percentual do fundo eleitoral para candidaturas competitivas da juventude partidária em pleitos eleitorais, conforme critérios a serem estabelecidos em debate interno, refletindo o que já foi feito com os movimentos pela renovação e mulheres, por exemplo.

‘Nova representação’
“A responsabilidade da nova representação está na juventude. Todo [velho] processo político brasileiro e no mundo não vai mais ter retorno”, disse Freire.

“As velhas práticas, as velhas formas de organização e atuação que tínhamos, não vão mais ter retorno. A tendência dominante não será mais essa. Nós precisamos nos preparar para isso”, destacou o presidente nacional do PPS, ressaltando que os jovens abrirão novas portas para realizar um novo modo de fazer política.

Carlos Drummond de Andrade: Um homem e o seu Carnaval

Deus me abandonou
no meio da orgia
entre uma baiana e uma egípcia.
Estou perdido.
Sem olhos, sem boca
sem dimensão.
As fitas, as cores, os barulhos
passam por mim de raspão.
Pobre poesia.
O pandeiro bate
É dentro do peito
mas ninguém percebe.
Estou lívido, gago.
Eternas namoradas
riem para mim
demonstrando os corpos,
os dentes.
Impossível perdoá-las,
sequer esquecê-las.
Deus me abandonou
no meio do rio.
Estou me afogando
peixes sulfúreos
ondas de éter
curvas curvas curvas
bandeiras de préstitos
pneus silenciosos
grandes abraços largos espaços
eternamente.

(do livro Brejo das Almas)