quinta-feira, 18 de junho de 2020

Vinicius Torres Freire – Economia será mais do mesmo

- Folha de S. Paulo

Decisão do BC sobre juros e Guedes sugerem arrochão e volta a regime pré-pandemia

O ministro Paulo Guedes (Economia) praticamente disse que está encerrado o programa de socorro à economia, ora em hibernação necrosante no inverno pandêmico. Agora, vai tratar de “reformas”. O Banco Central não deu sinal de que pretende se arriscar em um plano inconvencional de política monetária (de juros), como transparece no comunicado da redução da meta para taxa básica de juros (Selic) de 3% para 2,25%, nesta quarta-feira.

Em resumo, a política econômica será a mesma, a não ser em caso de desastre adicional, como insinua o BC, o que parece não estar nem na cogitação de Guedes.

A ideia básica é aprovar a emenda que permite o talho das despesas com servidores federais, tocar as concessões de infraestrutura para empresas privadas e vender a Eletrobras e os Correios, grosso modo, além de programar um Orçamento que ponha de novo as despesas no limite do teto.

O Banco Central afirmou que pode até haver nova redução da Selic, “residual”, mas há incerteza “acima da usual sobre o ritmo de recuperação da economia” na segunda metade do ano.

Além de esperar para ver o tamanho do desastre, da duração da epidemia e da retranca do consumidor, a direção do BC quer saber qual o efeito do crédito e dos auxílios emergenciais. Quer saber, como de costume, se o gasto além do teto vai ser limitado a este 2020 e se haverá “reformas”.

No entanto, mesmo as expectativas de inflação para 2021 (ora em 3,2%) estão abaixo da meta do BC (3,75%, em um intervalo admissível de de 2,25% a 5,25%), no cenário em que a Selic sobe do nível atual para dos atuais 2,25% para 3% no terço final do ano que vem e o dólar flutua pouco em torno de R$ 5. Sim, 2021, porque na prática taxa de juros básica já não teria como bulir com crescimento ou inflação neste 2020. Em tese, a Selic pode cair mais.

Mais importante do que saber da hipótese de um corte adicional de quarto de porcentagem foi o BC ter indicado que não está no horizonte uma política de juro zero. Se a Selic não vai a zero ou perto disso, não há possibilidade, na teoria padrão, de que o BC possa bulir com taxas de juros de prazo mais longo (o que poderia fazer comprando títulos do Tesouro, para o que tem agora autorização do Congresso).

De fato, é controversa a viabilidade de tal política em um país tão desarranjado quanto o Brasil. Em termos bem práticos e imediatos, note-se que as taxas de juros de prazo mais longo (cinco anos em diante) estão acima do nível em que estavam no início de março. É sinal de que há menos gente disposta a financiar o governo, que aliás está evitando pagar o preço (juro) alto. Tem coberto as contas com dinheiro do colchão e se financia no curtíssimo prazo.

Tal situação não pode perdurar por muito tempo. Ou se parte para políticas inconvencionais e/ou terá de haver um talho brutal na despesa ou vamos para o vinagre. Pressupõe-se também aqui que algum crescimento volta em 2021, bastante para recuperar ao menos metade do que vai se perder neste ano em queda do PIB, o que é apenas chute.

O que dá para saber é que, lá por setembro, não haverá auxílios emergenciais nem emprego, que a epidemia só terá terminado em caso de desastre (infecção quase geral e grande morticínio) e que não se sabe se haverá acordão entre governo e Congresso (e, pois, “reformas”), condicionado ainda ao que vai sair das investigações do Supremo sobre o bolsonarismo.

Os economistas do governo vão pagar para ver.

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