Rosangela
Moro, advogada do marido, acionou o STF pedindo a Fachin a revogação da liminar
de Lewandowski que dá à defesa de Lula acesso às mensagens trocadas entre
Sergio Moro e os procuradores da força-tarefa de Curitiba. A reclamação ilumina
o desprezo do Partido da Lava-Jato pela verdade factual e, ainda, pela verdade
jurídica.
A
peça da advogada repete as duas alegações básicas do ex-juiz e dos
procuradores: 1) “Não há prova da autenticidade das mensagens”; 2) As mensagens
“não provam fraude na condenação ou suspeição do juiz”.
A
primeira afirmação é uma tentativa de circundar, por um artifício jurídico, a
questão da verdade factual. Temendo cometer perjúrio, os acusados não declaram
que as mensagens são falsas — mas referem-se a elas como se fossem diálogos
entre terceiros desconhecidos sobre os quais nada sabem.
A segunda afirmação, se verdadeira, tornaria a primeira desnecessária. Afinal, se os diálogos não contêm ilegalidades, por que não admitir sua autenticidade? Contudo, como as trocas de mensagens evidenciam graves violações da lei, a advogada tira da cartola um terceiro coelho manco e solicita a eliminação processual delas: seriam um “nada jurídico”, devido aos meios ilegais utilizados na sua obtenção.
Nos
diálogos, Moro oferece orientações aos procuradores sobre fontes, os instrui
sobre possíveis provas e combina com eles a sequência de operações policiais.
São evidências abundantes de conluio entre o Estado-julgador e o
Estado-acusador. A gangue de Curitiba suprimiu do processo legal o juiz imparcial.
A
verdade jurídica não é idêntica à verdade factual, pois a segunda só se torna a
primeira quando percorre a estrada do devido processo. Sorte de Moro e de seus
comparsas: a verdade factual expressa nas trocas de mensagens seria suficiente
para condená-los por subversão do processo legal, se não tivesse vindo à luz
pelo túnel da ilegalidade. Tal circunstância não implica, porém, a completa
invalidação jurídica dos diálogos criminosos.
A
jurisprudência não admite o uso de provas obtidas ilegalmente para condenar
alguém, mas permite utilizá-las para sustentar a presunção de inocência. Lula
pode até ser factualmente culpado — mas, na vigência do estado de direito, não
é possível condená-lo ao arrepio do devido processo. É dever do STF anular as
sentenças condenatórias do líder petista tingidas pela mão de gato de Moro.
Moro
enxerga a lei como fonte de privilégios e discriminações. No pacote anticrime
que formulou quando ministro de Bolsonaro, introduziu o “excludente de
ilicitude”, mecanismo destinado a impedir a punição de crimes cometidos por
policiais. Na reclamação ao STF, sua advogada alega que as trocas de mensagens
“não provam inocência” de Lula, como se cidadãos acusados tivessem o ônus de
provar ausência de culpa.
“Nada
jurídico” — o qualificativo não serve para invalidar os diálogos que repousam
no STF, mas define à perfeição os processos conduzidos pelo Partido da
Lava-Jato. As mensagens expõem acertos entre o juiz e os procuradores para
plantar notícias na imprensa e financiar a divulgação de propostas
legislativas, além da ambição de reformar o sistema político-partidário. Nada
jurídico, tudo político: a gangue manipulava suas prerrogativas de agentes da
lei para deflagrar um projeto de poder centrado na figura de Moro.
A
demanda da advogada ao STF pretende soterrar tanto a verdade factual quanto a
jurídica. A guerra contra a verdade tem a dupla finalidade de evitar a
desmoralização jurídica da gangue e de conservar os resíduos de um projeto
político envenenado pela associação de Moro com Bolsonaro.
Na hora da morte da força-tarefa, o Partido da Lava-Jato conta com três fiéis militantes no STF. Mesmo assim, diante do grito das evidências, a manutenção integral das condenações tornou-se um sonho improvável. Circula, por isso, a ideia criativa de preservar, ao menos, o legado da interdição de candidatura de Lula. “In Fux We Trust”: o compromisso imoral concluiria, melancolicamente, a trajetória de juízes que confundem a lei com suas próprias convicções políticas.
Mas, Demétrio da Libelu, o sítio de Atibaia e o apê do Guarujá continuam a se impor como memórias petrificadas da verdade, não?
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