terça-feira, 22 de junho de 2021

Câmara discute sistema eleitoral que une distritão e voto proporcional

Modelo misto foi apresentado pela deputada Renata Abreu, que negocia com partidos, mas enfrenta resistências

Sérgio Roxo / O Globo

SÃO PAULO — Diante do impasse sobre a mudança do sistema eleitoral do Legislativo, a relatora da proposta na Câmara, Renata Abreu (Podemos-SP), passou a apresentar aos partidos a alternativa de um modelo misto, em que metade dos deputados seria eleita da forma atual e a outra parte pelo distritão.

Criticado por cientistas políticos, o distritão prevê que os candidatos mais votados em cada estado fiquem com as vagas. Já no sistema em vigor, o proporcional, a definição é feita levando em conta os votos em todos os candidatos do partido e em legenda. Mesmo quando um candidato recebe poucos votos, acaba ajudando a sua sigla a ter mais representantes na Câmara

No modelo misto desenhado por Renata Abreu, no Rio, por exemplo, que tem 46 vagas na Câmara, os 23 candidatos mais votados estariam eleitos, e seus votos não entrariam na conta que definiria os outros 23 escolhidos de forma proporcional.

A relatora diz que a proposta do distritão misto é uma tentativa de romper as resistências dos partidos de esquerda e centro-esquerda. Caso não haja adesão dessas legendas, a tendência é o que o distritão puro seja levado adiante.

— Tem duas propostas na mesa hoje: o distritão misto ou fazer alguma transição para chegar ao distrital misto, que pode ser o distritão ou (a volta) das coligações.

O sistema distrital misto prevê a divisão do país em distritos que elegeriam cada um seu deputado. A outra metade seria escolhida pelo sistema atual. De acordo com a relatora, esse modelo entraria em vigor em 2026.

A deputada ainda acrescenta que o modelo de distritão misto, que já valeria para 2022, poderia ser definitivo. A decisão, segundo ela, ocorrerá nesta semana , e a manutenção do sistema proporcional puro atual está descartada.

— Esse sistema proporcional sem coligação está se tornando muito inviável pela quantidade de candidatos (necessária para formar a chapa). Todos os partidos estão tendo problemas.

 “Destrói partidos”

Dentro do campo da esquerda, o PT, que tem a maior bancada Câmara ao lado do PSL, com 53 deputados, coloca-se contra qualquer mudança no sistema eleitoral.

— O distritão é antidemocrático, utilizado em raros países, destrói os partidos, despreza os votos de quem contribuiu no debate eleitoral, mas não alcançou o limite mínimo e estabelece o princípio do cada um por si. É o primado da antipolítica, que favorece os regimes autoritários — diz o deputado Rui Falcão (PT-SP).

Ontem, Renata Abreu apresentou a sua proposta de distritão misto à bancada do PSB, segundo maior partido do campo da esquerda.

— O distritão puro, de certa forma, nega a importância dos partidos políticos. Já o distritão misto é um modelo que, pelo menos, preserva uma parte de lógica de eleição baseada também no fortalecimento dos partidos. São coisas que estão sendo incorporadas e podem ajudar a encontrar um caminho do meio —disse o líder do PSB, Danilo Cabral (PSB-PE), que vê o distritão misto como um caminho para o distrital misto.

A tentativa de alterar o sistema eleitoral do Legislativo é rotina na Câmara. A adoção do distritão já foi levada à votação outras duas vezes. Na última delas, em 2017, a proposta recebeu 238 votos contra e 205 a favor. Agora, o distritão tem colocado em lados opostos presidentes de partidos e parte de suas bancadas.

— Esse sistema (distritão) enfraquece a democracia e a representação da sociedade dentro do Parlamento. Todas as grandes democracias do mundo evoluíram por meio da representação partidária, na qual de fato ocorrem as discussões de bandeiras e ideologias. Distritão é eleição do eu sozinho — afirma o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP).

Raul Henry (MDB-PE), porém, avalia diferente. Ele acredita que o fim das coligações, implantado na eleição municipal do ano passado, mostrou como é difícil para um partido formar chapa nas eleições proporcionais sem se aliar a outro.

— O modelo atual é um horror. Sem coligação, só consegue formar chapa quem tem poder político ou econômico. O distritão é menos ruim do que a regra atual. Se for para votação, voto a favor.

Divisão nos partidos

O deputado Delegado Éder Mauro (PSD-PA) também critica o modelo atual.

— A experiência que se teve nas últimas eleições municipais deixou muito clara a ineficiência. Está na contramão do que o povo quer — diz Mauro, em uma gravação no site do PSD.

Já o presidente do partido, Gilberto Kassab, entende que o distritão teria consequências graves:

— Tenho respeito pelas ideias de todos, mas no caso do distritão tenho uma postura irredutível porque ele traz como consequência o fim da política. Faz com que não exista coletivo, e só projetos individuais.

A expectativa é que o distritão conte com a adesão de metade da bancada de 33 deputados do MDB e da maior parte dos 35 representantes do PSD.

A cientista política Andrea Freitas, professora da Unicamp, avalia que o distritão traz problemas para candidatos, partidos e eleitores. Um deles é tornar as campanhas mais caras porque seria necessário buscar votos em todo o estado.

— Aumenta a personalização de um jeito muito negativo. Também fica mais difícil para o eleitor escolher. Hoje, são levados em conta pelo eleitor o partido de simpatia e a região do candidato. Com o distritão, é a lista completa de candidatos para optar.

De acordo com Andrea Freitas, a Câmara pode ser dominada por famosos:

— O distritão favorece os mais conhecidos, não necessariamente, por motivos políticos, Podem ser youtubers ou celebridades.

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