quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Ricardo Noblat - Presidente deu mais um tiro no pé – desta vez no dos militares

Blog do Noblat / Metrópoles

Parada bélica e inócua fora de hora vira motivo de chacota

O que foi mais vexaminoso em Brasília? Uma minúscula parada militar não prevista em nenhum calendário para a entrega de um convite ao presidente da República? Ou o estado deplorável de parte dos equipamentos bélicos exibidos com a intenção de meter medo nos deputados prestes a decidir sobre o voto impresso?

A exibição de 40 veículos da Marinha, entre blindados, caminhões e jipes, provocou riso e foi motivo de deboche nas redes sociais. Ali, segundo levantamento da Quaest Pesquisa, dos 2,3 milhões de posts publicados, 93% foram de chacota ou crítica ao governo federal. Mais um tiro no pé, e desta vez no das Forças Armadas.

Na época da ditadura militar, essas coisas eram feitas com mais cuidado. Foi montado em um cavalo branco, com a farda impecável e um chicote na mão, que o general Newton Cruz, notório pelos maus bofes, reprimiu manifestantes que esperavam defronte ao Congresso a aprovação da emenda das Diretas, já.

Verdade que não faltou um toque de ridículo. O Exército depois distribuiu fotos do saque a um supermercado onde aparecia um homem carregando um suposto explosivo que não chegou a ser detonado. O Jornal do Brasil descobriu que o explosivo não passava de uma lata de Nescau. O guerrilheiro Nescau.

Faltou gente na rua para observar a entrega pelo comandante da Marinha do convite ao presidente Jair Bolsonaro que ostentava seu sorriso de plástico ao lado do ministro Braga Neto, da Defesa, e dos chefes do Exército e da Força Aérea. Desperdiçou-se combustível com um ato que se revelou inócuo.

Uma militante do PT, vestida com uma blusa onde pedia o impeachment de Bolsonaro, ainda tentou salvar as aparências oferecendo flores ao piloto de um dos blindados. Quando nada, lembrava vagamente uma cena da Revolução dos Cravos, em Portugal, que inspirou uma música de Chico Buarque de Holanda.

O esforço valeu, mas as aparências não foram salvas. Vozes em off tentaram salvar a face do comandante do Exército ao soprar que ele estava ali visivelmente constrangido. Se Bolsonaro alcançar seu objetivo de dar um golpe caso não se reeleja, só faltará que digam que os militares o apoiaram por puro constrangimento.

Derrota do voto impresso enterra impeachment de Bolsonaro

Oposição celebra a vitória da democracia sobre o autoritarismo, e Bolsonaro a falta de votos para tirá-lo do poder

Gol de mão não vale. Mas Diego Maradona entrou para a história do futebol não só por sua genialidade, mas por ter feito um gol de mão na Copa do Mundo de 1986 quando a Argentina venceu a Inglaterra por 2 x 1. O segundo gol, considerado até hoje o mais bonito de todas as copas, foi dele também.

A democracia derrotou o autoritarismo na sessão da Câmara que sepultou a proposta de restabelecer o voto impresso nas próximas eleições. Seriam necessários para sua aprovação 308 votos de um total possível de 512, uma vez que o presidente da Câmara só vota em caso de empate. O placar foi de 229 a favor e 218 contra.

64 deputados faltaram à sessão ou preferiram não votar. Um, o deputado Aécio Neves (PSDB-MG), absteve-se. Pouco importa, assim, que o presidente Jair Bolsonaro, o pai do voto impresso, tenha obtido mais votos no cômputo geral – ele perdeu. Colheu até aqui sua mais fragorosa derrota no Congresso.

Mas o resultado, se lido ao pé dos números, mostra também que ele tem o que comemorar, e não só porque as pitonisas diziam que o voto impresso seria derrotado por larga margem de votos e erraram. A aprovação da abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro foi para as calendas gregas.

É o Senado quem cassa ou não o mandato de um presidente da República. Mas isso só acontece se a Câmara, por um mínimo de 342 votos, autorizar. Há pedidos de mais para a abertura de um processo de impeachment contra ele, e votos de menos para aprovar um deles. De resto, a oposição finge querer, mas só finge.

A oposição disposta a votar em Lula torce para que Bolsonaro dispute com ele o segundo turno. Seria, nos seus cálculos, o candidato mais fácil de derrotar. Bolsonaro torce para enfrentar Lula porque pensa a mesma coisa. O que ele mais teme é que um candidato do centro lhe roube o lugar.

O candidato nem Bolsonaro nem Lula ainda não deu as caras, mas há tempo para isso. A de Bolsonaro é uma sucessão aberta. De mais a mais, no Brasil, tudo pode acontecer, inclusive nada, como disse um dia Marco Maciel, ex-governador de Pernambuco e vice-presidente da República durante o governo Fernando Henrique.

 

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