sábado, 25 de setembro de 2021

Adriana Fernandes - A guerra das projeções do PIB

O Estado de S. Paulo

As manchetes do Estadão e dos principais jornais do País do último dia 15, estampando uma queda abrupta das previsões de crescimento para um patamar abaixo de 1% em 2022, promoveram tamanha inquietação entres os governistas que logo depois começou a tomar forma o acordão para a aprovação dos projetos mais imediatos para destravar o Orçamento.

Àquela altura, o presidente Jair Bolsonaro já tinha divulgado a “Carta à Nação”, escrita pelo ex-presidente Michel Temer após as manifestações do feriado de 7 de Setembro, e o comando do Congresso – Arthur Lira e Rodrigo Pacheco – insistia na tecla de que era preciso se voltar para o “Brasil real”.

O derretimento das previsões puxado pelo banco Itaú, que cortou a sua previsão de 1,5% para 0,5%, foi um banho de água fria na aposta do governo e de aliados na melhora do mercado. Ficou tudo fora de controle.

A queda das projeções sinalizava um cenário de piora das expectativas alimentado pela perspectiva de inflação e juros mais altos, que (aliás) vão se confirmando.

O ministro Paulo Guedes se indignou, porque viu na redução das previsões um movimento de pressão política contra o governo Bolsonaro.

Para não botar lenha na fogueira e alimentar esse processo de queda das previsões, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, responsável pela elaboração das estimativas usadas no Orçamento, manteve a sua projeção de alta de 2,5% para 2022.

Fez uma aposta de alto risco, rompendo uma sintonia fina observada nos últimos tempos entre as expectativas do governo e as do mercado – enquanto a última pesquisa Focus do Banco Central, que coleta previsões do mercado, desacelerava a projeção de alta do PIB de 1,72% para 1,63%. Patamar bem mais baixo do que o do governo, mas ainda acima do 0,5% projetado pelo Itaú e outras consultorias.

Nessa queda de braço de projeções, o secretário da SPE, Adolfo Sachsida, partiu para o ataque e publicou uma nota para rebater o movimento do mercado. O governo continua contando com a vacinação em massa para dinamizar o setor de serviços, especialmente os prestados às famílias, e o investimento privado (o acumulado em quatro trimestres mostra elevação de quase 11%) para sustentar sua projeção de crescimento mais alto.

E está esperando um aumento forte do emprego informal em contraponto a um crescimento do PIB mais moderado. Chama atenção a posição da equipe econômica de que as projeções mais baixas de PIB do mercado levam em conta uma queda significativa do índice em algum trimestre em 2022 ou uma nova recessão no próximo ano, fatos esses que, na avaliação do governo, seriam difíceis de justificar com base no cenário fiscal atual e na ausência de uma crise hídrica ou de uma piora na pandemia.

A próxima pesquisa Focus, que será divulgada na segundafeira, vai indicar se o governo e os líderes governistas conseguiram segurar a sangria que foi impulsionada também pelos ruídos políticos.

O governo reclama das projeções, mas segue com uma péssima comunicação. Depois dos Ministérios da Economia e da Cidadania indicarem que o benefício do novo Bolsa Família será de R$ 300, o presidente Jair Bolsonaro voltou publicamente a pedir um valor mais alto ao ministro Guedes.

Um jeito meio torto de o presidente justificar mais à frente o que, na verdade, ele e muitos dos seus aliados querem: a renovação do auxílio emergencial, que tem alcance muito maior do que o programa Bolsa Família e cujas despesas ficam fora do teto de gastos, sem ser empecilho para o aumento das emendas parlamentares no Orçamento de 2022.

Bolsonaro volta de novo ao mesmo ponto após esse estágio ter sido superado com a publicação de decreto, assinado por ele mesmo (e já em vigor), para aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para bancar o lançamento do novo programa social neste ano.

Foi, então, em vão o aumento do IOF?

A comunicação do governo continua alimentando as incertezas que empurram as projeções para baixo.

Não dá para o governo aumentar imposto para compensar a criação de um programa social e depois resolver mudar de rota com a prorrogação do auxílio emergencial para combater os efeitos da pandemia da covid-19, que o próprio governo diz que está sendo superada com a vacinação. Não vai colar, se quiser respeitar a legislação em vigor. Mas na política brasileira sempre cabe um jeitinho. Ontem, hoje e amanhã.

 

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