quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Bernardo Mello Franco - Um palanque em Nova York

O Globo

Jair Bolsonaro tratou a Assembleia Geral da ONU como palanque de sua campanha à reeleição. O presidente usou a tribuna para elogiar o próprio governo e agradar sua base de extrema direita. Chegou a exaltar as marchas do 7 de Setembro, que pregaram golpe e fechamento do Supremo Tribunal Federal.

O capitão se apresentou como um líder que “acredita em Deus”, “valoriza a família” e “deve lealdade a seu povo”. Só faltou concluir o discurso com um “vote em mim”.

Ainda sem partido, o candidato disse que o Brasil estava “à beira do socialismo” antes da sua eleição. Ele recebeu a faixa de Michel Temer, xodó de banqueiros e barões da Fiesp.

Bolsonaro também afirmou que o país estaria há dois anos e oito meses “sem casos concretos de corrupção”. Omitiu a negociata na compra de vacinas, a rachadinha nos gabinetes dos filhos e o escândalo de contrabando que derrubou o ministro do Meio Ambiente.

Visto pelo mundo como um inimigo da Amazônia, o capitão torturou os números do desmatamento e elogiou a legislação ambiental que seu governo tenta desmontar. “Qual país do mundo tem uma política de preservação como a nossa?”, perguntou. Não foi o único momento de escárnio.

Sem compromisso com os fatos, Bolsonaro disse que as manifestações de seus seguidores foram as maiores da História, inflou os valores do auxílio emergencial e mentiu ao culpar prefeitos e governadores pelo desemprego e pela inflação.

Depois de forçar a entrada na ONU sem ter tomado a vacina, ele ainda insistiu em fazer propaganda de remédios ineficazes. E reclamou do passaporte sanitário, que o obrigou a jantar na calçada para não ser barrado nos restaurantes de Nova York.

O Bolsonaro das Nações Unidas foi o de sempre: um porta-voz do extremismo de direita e do negacionismo, que parece orgulhoso em isolar o Brasil na comunidade internacional.

Com a reprovação na casa dos 53%, o presidente precisa radicalizar ainda mais para segurar a sua base. Acreditar que ele ainda possa vestir um figurino moderado é fazer uma opção pelo autoengano.

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