quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Bruno Boghossian - Bolsonaro e a emergência

Folha de S. Paulo

Governo avista abismo político e prepara gambiarra com cara de programa social

Jair Bolsonaro dizia, em dezembro de 2020, que o país vivia "um finalzinho de pandemia", mas era também um negacionista da crise econômica. À época, o presidente avisava que o auxílio emergencial seria interrompido na virada do ano porque a prioridade do governo era manter as contas públicas em equilíbrio.

O Planalto nunca deu muita bola para o controle de gastos, como mostram as despesas generosas com benefícios para caminhoneiros, policiais e outros integrantes da base que apoia Bolsonaro. O presidente provou também que não ligava para uma situação que se agravaria na população mais pobre.

Para Bolsonaro, a emergência não é a fome de quem perdeu renda na pandemia. Ele só se mexeu nessa área ao ver seu futuro político ameaçado. Quando a popularidade do presidente despencou, no início do ano, o governo voltou a pagar o auxílio por alguns meses. Agora, improvisa um novo programa para recuperar fôlego na corrida pela reeleição.

O time de Bolsonaro arquiteta uma gambiarra com cara de benefício social. O governo quer manter o valor fixo do Bolsa Família em R$ 189, mas inventou um complemento temporário para levar o pagamento a R$ 400 até o fim do mandato. Além da manobra, uma parte das despesas deve ficar fora do teto que limita o crescimento de gastos públicos.

Bolsonaro atropelou as restrições da equipe econômica porque avistou um abismo político com o fim do auxílio emergencial, no fim de outubro. Na primeira interrupção, em janeiro, a popularidade do presidente entre os mais pobres caiu de 37% para 27%. Desde então, mesmo com a retomada do pagamento em valores menores, esse índice foi a 17%.

Durante o governo, o presidente tratou a fome e a proteção social como degraus políticos. Afirmou que as restrições à economia provocariam saques que nunca ocorreram, ameaçou cobrar de governadores a conta do auxílio e chamou de idiota quem afirma que é preciso comprar feijão em vez de fuzil. Não será diferente em 2022.

 

 

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