sábado, 30 de outubro de 2021

Pablo Ortellado - Em defesa da meia-entrada

O Globo

Foi aprovado na Assembleia Legislativa de São Paulo um projeto de lei que tenta pôr fim à meia-entrada, desconto concedido a estudantes e idosos para a compra de ingressos. O projeto deve ser vetado pelo governo do estado, mas reacendeu um antigo debate sobre a justiça desse tipo de política.

A meia-entrada é uma forma de subsídio cruzado, por meio do qual quem paga a tarifa cheia subsidia quem paga a meia. Conceder o benefício a estudantes significa que os adultos pagarão um pouco mais em cinemas e teatros para que os jovens paguem um pouco menos. Isso faz muito sentido, porque a renda dos estudantes é pequena, seja porque os jovens recebem apenas uma mesada dos pais, seja porque, se trabalharem, ganham muito menos que os mais velhos.

O desconto, se bem implementado, produz justiça distributiva. Além disso, estimula a autonomia e a formação cultural dos jovens, que estão num período-chave da educação. É boa política pública. O problema nasce com sua implementação.

Historicamente, a concessão do desconto foi condicionada à apresentação da carteirinha de estudante emitida por entidades como UNE e Umes. Isso sempre gerou desconforto entre os estudantes, porque os obrigava a se filiar e a financiar entidades estudantis zelosamente controladas por grupos político-partidários.

O desconforto levou a uma longa batalha jurídica e legislativa sobre se os estudantes precisavam da carteirinha das entidades ou se apenas deveriam apresentar um comprovante de matrícula.

Em meio à disputa, perdeu-se o controle sobre quem teria direito à meia-entrada, tanto porque não havia clareza sobre que comprovação era válida, quanto porque a fraude era disseminada nos comprovantes de matrícula e nas carteirinhas.

A solução óbvia e simples de conceder o benefício aos jovens em idade escolar —o que seria fácil de aferir visualmente e por documentos —sempre foi sabotada pela esquerda, que defendia o monopólio das entidades estudantis que formavam seus quadros políticos jovens.

Com muitas fraudes, o subsídio cruzado perdia o sentido. Como, em muitos casos, a maioria dos ingressos vendidos era com meia-entrada, a inteira não conseguia subsidiar a meia e, na prática, virava uma entrada dupla, paga pelos bobos que não fraudavam o sistema.

Para piorar, Congresso e assembleias estaduais estenderam o desconto a outros grupos, como idosos, professores e doadores de sangue. Com isso, a compra do ingresso inteiro passou a ser completamente excepcional, e cinemas e teatros passaram a dar meia-entrada também a quem apresentava cartão de determinado banco ou tinha celular de determinada operadora, criando a farsesca política da “meia para todos”, que, obviamente, era meia para ninguém.

A meia-entrada é uma boa política pública e precisa ser defendida como direito dos jovens a sua autonomia e formação cultural. Mas, para isso, precisa ser bem implementada, com beneficiários delimitados e um sistema simples e seguro de aferição.

 

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