quinta-feira, 18 de novembro de 2021

Míriam Leitão - A chuva, a safra e o choque da energia

O Globo

A safra será boa no ano que vem, pode haver um aumento na produção de grãos de 14% a 15%, e isso fará com que a alta dos preços da alimentação no domicílio seja bem menor do que foi nos últimos anos. Mas haverá um choque de preço de energia para o consumidor residencial, por custos que estão sendo elevados agora. Há poucas boas notícias na economia, uma série de previsões ruins e a certeza de muitos ruídos e problemas provocados pelo governo.

O economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados, acompanha com atenção o que se passa no campo e é dele a avaliação de que as chuvas até agora garantiram um bom começo para esta safra.

— Não é chuva de encher reservatório, mas é chuva de permitir uma boa instalação da lavoura. Ela veio mais cedo, choveu relativamente bem em outubro e deve continuar — disse ele sobre o clima deste último trimestre do ano.

Mas a chuva e o agro têm uma relação cheia de riscos. Precisa chover bem agora na instalação da lavoura, depois tem que chover janeiro e fevereiro para formar os grãos, encher a espiga de milho, por exemplo. A terceira fase, março a abril, é da colheita, não pode chover demais, nem de menos, explica Mendonça de Barros.

A chuva também é fundamental na energia, mas na visão de Paulo Pedrosa, da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace), mesmo com a volta da chuva há muitos custos que hoje batem nas empresas e que no ano que vem vão desabar sobre o consumidor. A Aneel soltou um relatório avisando de aumento de 22% em 2022, na conta de luz.

— Este ano o país está tendo uma operação caríssima com as termelétricas. Nós estamos comprando energia dez vezes mais cara que o custo médio das distribuidoras. Equivale ao governo estar comprando gasolina a R$ 70 o litro. Os consumidores do mercado livre pagam isso todo mês. No ano que vem o consumidor terá que pagar uma série desses custos — afirmou Pedrosa.

Se a safra boa se confirmar, o impacto positivo será o seguinte:

— A boa notícia é que os preços dos grãos podem começar a ceder em dezembro, antecipando a entrada de uma safra boa, e isso alivia o produtor de ovo, de frango e de suíno. Aquele item de alimentação no domicílio do IPCA pode ser de 3% a 3,5% no ano, lembrando que chegou a 17%, 18% num tempo atrás — disse Mendonça de Barros.

Mesmo com essa boa expectativa, a MB prevê zero de crescimento do PIB no ano que vem e reduziu esta semana de 4,7% para 4,5% a previsão da alta em 2021.

— Na inflação, tem por outro lado gás de cozinha, gasolina, diesel, etanol, energia elétrica residencial que vão continuar extremamente pressionados. E essa proposta da Petrobras de aumentar o gás natural (em 200%) é de ouvir sentado para não cair — diz o economista.

Pedrosa conta que a Petrobras seguia o brent para reajustar o gás natural, mas agora que os preços do gás aumentaram muito, pela crise na Europa, ela decidiu seguir outro indicador. Mendonça de Barros lembra que “o conto do vigário” era o de que haveria um choque de gás barato. Quanto à energia elétrica, Pedrosa empilha os custos que vão ser repassados para a conta do consumidor. Itens de custos que foram jogados para a frente e no ano que vem cairão na conta:

— Tem a conta Covid, aumentos tarifários que foram financiados pelas distribuidoras, tem o adiamento de recebíveis das transmissoras, tem a conta de termelétricas que foram despachadas fora da ordem do mérito este ano, tem as térmicas emergenciais que o governo contratou a um custo altíssimo, por três anos, tem a aplicação do IGP-M nos contratos das distribuidoras, e tem a correção dos preços dos combustíveis das termelétricas porque o gás e outros combustíveis subiram. Tudo isso deslocado para o ano que vem. Teremos preços altíssimos.

No ano haverá também La Niña. Ela faz chover no Nordeste, mas reduz a chuva no Sudeste, onde estão os reservatórios. Isso preocupa Pedrosa. José Roberto diz que os mapas de clima mostram que o fenômeno será mais mitigado.

Para piorar o cenário, é certo que haverá uma série de confusões criadas por este governo.

— O caminho da estagnação é a única coisa realmente firme que se consegue ver, infelizmente. E vem por causa da inflação, dos juros, do dólar e choques de oferta — diz José Roberto.

É apertar os cintos e atravessar os turbulentos meses à frente.

 

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