quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Vinicius Torres Freire – A espera de um milagre na inflação

Folha de S. Paulo

BC eleva juros e afirma que alta na Selic não vai ter refresco até expectativa de IPCA ficar no alvo

O Banco Central avisou que a alta da taxa básica de juros não vai ter refresco tão cedo. Isto é, ainda vai pisar no acelerador até que as expectativas de inflação estejam na meta em 2023. A meta de 2022 já foi meio para o vinagre; se o IPCA ficar abaixo do teto de 5%, já estaria bom.

Trocando em miúdos, por ora, a Selic deve ir pelo menos a 11,75% em algum momento do ano que vem, fechando 2022 em 11,25%.

O aumento da Selic de 7,75% para 9,25% ao ano na reunião desta quarta-feira do BC era meio óbvio. Houve alguma novidade no tom, no recado "duro", talvez para ajudar a desinflar a economia com um pouco de gogó, "no grito", mostrando disposição de salgar ainda mais os juros, mesmo nesta economia à beira de cair na recessão.

Uma economia menos ruinzinha daqui até 2023 vai depender ainda mais, pois, de uma queda meio milagrosa do ritmo de inflação. No mais, não há o muito o que esperar de melhor além de o governo não estourar alguma outra bomba, que os candidatos a presidente não digam disparates excessivos e que a economia mundial não tenha piripaques.

O fogo da inflação teria de baixar muito. A previsão é que o IPCA continue crescendo no ritmo anual de 10% até abril, fechando o ano em 5%. Mas teria de ser bem menor e mais cedo. Assim, a carestia comeria menos dos salários e o Banco Central poderia evitar alta maior da Selic, diminuindo o tamanho do prejuízo para 2023, pelo menos. É bom notar que a gente ainda mal viu o efeito da alta de juros deste ano.

Uma baixa mais rápida e inesperada da inflação depende do preço do dólar. Pode cair um tanto, com a alta da taxa de juros no Brasil, mas depende também de tumultos políticos (Bolsonaro, centrão, campanha). Depende do Imponderável de Almeida da finança mundial. Depende ainda de confirmação de um refresco da crise mundial de energia, de chuva no Brasil, de confirmação de safra agrícola boa por aqui (as expectativas são bem positivas, até agora).

Seria uma melhorazinha parcial, marginal, talvez para evitar a recessão.

Em outubro, as vendas do comércio caíram pelo terceiro mês consecutivo; a produção da indústria, pelo quinto mês seguido, dizem os números do IBGE. Estamos abaixo do nível anterior à epidemia, de fevereiro de 2020. Os primeiros indícios de novembro são de nova queda ou estagnação. O que resta de crescimento está na recuperação do setor de serviços.

A alta de juros vai colocar a dívida pública para ferver de novo. A dívida dos governos em relação ao tamanho da economia (a relação dívida/PIB) deve cair de 89% em 2020 para cerca de 81% em 2021, redução que nem foi tão boa enquanto durou.

O PIB aumentou com a recuperação rápida do início do ano, mas também por causa da inflação. As receitas dos governos cresceram também por causa da inflação, de pagamentos de impostos adiados de 2020, preço de commodities em alta e arrecadação maior de tributos sobre importação, inflados por causa do dólar caro, notam economistas do Bradesco. No ano que vem, não haverá o efeito inflação, o crescimento do PIB deve cair do 4,7% deste ano para algo perto de zero e o pagamento de juros da dívida deve aumentar uns 50% no ano que vem (de R$ 438 bilhões para R$ 658 bilhões, nas contas do pessoal do Bradesco).

Isto é, a ansiedade com o descontrole da dívida vai aumentar. Neste ano, o receio já aumentara, por causa da gambiarra que o governo e o centrão aprontaram com o teto de gastos, o que ajudou a chutar o dólar ainda mais para cima, fora a ajuda das barbaridades de Bolsonaro.

Ou seja, afora milagres, o próximo governo tomará posse com a faca de juros e dívida no pescoço.

 

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