segunda-feira, 24 de maio de 2021

Fernando Gabeira - Festa na floresta

- O Globo

"Regozijem-se os campos e tudo o que neles há. Cantem de alegria, todas as árvores da floresta." (Salmos, 96: 12)

Dessa forma, o delegado Alexandre Saraiva comemorou o afastamento de dez funcionários do Ministério do Meio Ambiente e a batida policial nos escritórios do ministro Ricardo Salles.

Saraiva estava feliz com a Operação Akuanduba, realizada por outro delegado, Franco Perazzoni, que, como ele, também é especializado no tema, com doutorado em meio ambiente.

O delegado Saraiva havia denunciado Ricardo Salles por ter atuado na tentativa de liberar um grande carregamento de madeira ilegal, apreendida por ele. A denúncia lhe valeu o afastamento do cargo. E ainda é muito audacioso, no governo Bolsonaro, denunciar um ministro que se associe a bandidos ambientais travestidos de empresários.

A denúncia de Saraiva foi parar nas mãos da ministra Cármen Lúcia, que a enviou para a PGR e, lá, adormeceu na gaveta de Augusto Aras. Acontece que, correndo por fora, numa outra investigação, o delegado Franco Perazzoni investigava algo parecido, as alterações de normas do Ibama para favorecer madeireiros.

Ricardo Salles, na célebre reunião em que falou em passar a boiada, aproveitando-se da pandemia, revelou seus métodos. É preciso uma caneta, dizia ele, e um parecer. Caneta sem parecer dá cana.

Ricardo Noblat - Pazuello corre o risco de ser punido pelo Exército

- Blog do Noblat / Metrópoles

No Rio, Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde e general da ativa, participou de ato de motociclistas comandado por Bolsonaro

General da ativa, sem máscara, embora a lei mande que use, pode participar de manifestação política? O que o “nosso Exército” diz a respeito? Ficará por isso mesmo? Não será punido pelo Exército que Bolsonaro insiste em chamar de seu?

Especialista em logística militar, ex-ministro da Saúde demitido por incompetência, o general Eduardo Pazuello participou, esta manhã, no Rio, de uma manifestação político-partidária de motociclistas comandada pelo presidente Jair Bolsonaro.

Chegou de máscara ao local no bairro da Tijuca. A primeira coisa que fez foi baixar a máscara, contrariando decreto do governo estadual e lei aprovada pelo Congresso em junho do ano passado. Subiu no carro de som, e discursou.

Desrespeitou o Estatuto dos Militares e o Regulamento Disciplinar do Exército. Entre as transgressões previstas e sujeitas a punição no regulamento, está:

 “Manifestar-se, publicamente, o militar da ativa, sem que esteja autorizado, a respeito de assuntos de natureza político-partidária”.

Pazuello e Bolsonaro serviram juntos nos anos 1980 na Brigada de Paraquedista no Rio. Por ter planejado detonar bombas em quartéis em protesto contra o salário que recebia e que considerava baixo, Bolsonaro foi afastado do Exército. Pazuello seguiu carreira.

Os dois se reencontraram no governo que está repleto de paraquedistas – entre eles, os generais Braga Neto (ministro da Defesa), Augusto Heleno (ministro do Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (chefe da Casa Civil).

Na última quarta-feira, Augusto Heleno disse à Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara que militares da reserva podem participar de manifestações, mas os da ativa, não. E completou:

“Os da ativa não podem e serão devidamente punidos se aparecerem em manifestações políticas”.

Marcus Andrá Melo* - Bolsonaro e o Orçamento rabilongo

- Folha de S. Paulo

O 'Orçamento secreto' é mecanismo opaco para premiar o apoio legislativo para além dos controles institucionais

Rui Barbosa foi a um só tempo espirituoso e preciso quando chamou o Orçamento federal de rabilongo: as leis orçamentárias continham adendos sem relação com o Orçamento. O rabo era longo —as chamadas “caudas” e a Constituição de 1891 só previam o veto total que funcionava como uma camisa de força, pois o presidente era forçado a acolher os adendos à sua própria proposta orçamentária. Era pegar ou largar.

Era comum a inclusão na “cauda” de dispositivos prevendo novas despesas (sem previsão de receita) pela criação de órgãos ou cargos, e matérias alheias ao assunto, incorporadas na 25ª hora diretamente no plenário do Congresso.

Paradoxalmente o Orçamento rabilongo não expressava o poder do Executivo, mas sua impotência. O veto parcial introduzido na reforma constitucional de 1926 foi acompanhado de dispositivos para fortalecer o poder presidencial (na área da intervenção federal nos estados etc).

Celso Rocha de Barros – Pazuello e as ‘coisas de internet’

- Folha de S. Paulo

Bolsonaristas aplaudiram ex-ministro na CPI porque querem general preso

Em seu depoimento à CPI da Covid, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello provou que é mais leal a Bolsonaro do que ao Brasil. Já seria triste ver um general se prestando a isso se Bolsonaro fosse só mais um político porcaria. Na verdade, Jair é uma das maiores ameaças que o Brasil já enfrentou. Não é fácil encontrar, na história recente, uma força beligerante que tenha matado mais soldados inimigos do que Bolsonaro matou brasileiros durante a pandemia.

Na CPI, Pazuello mentiu sobre tudo: mentiu que não atrasou a compra de vacinas, mentiu que um hacker invadiu o site do Ministério da Saúde para instalar o programa TrateCov, mentiu que não promoveu o uso da cloroquina depois que estudos científicos provaram sua ineficácia contra a Covid-19, mentiu sobre os crimes do governo durante a crise do oxigênio em Manaus. Omitiu o fato de que, enquanto o governo fazia isso tudo, generais responsáveis seguiam as orientações da OMS no Exército, garantindo com isso uma baixíssima mortalidade entre os militares brasileiros.

Catarina Rochamonte - O diabo na CPI da pandemia

- Folha de S. Paulo

O tinhoso está sempre atento às oportunidades e, no momento, não perde uma sessão da CPI da pandemia

Há um interessante trecho de C.S. Lewis no qual ele explica a estratégia do diabo para nos pegar: “Ele sempre envia ao mundo erros aos pares —pares de opostos. E sempre nos estimula a desperdiçar um tempo precioso na tentativa de adivinhar qual deles é o pior”. Deus é brasileiro, mas o diabo gosta da nossa terra e está esfregando as mãos com a expectativa de um segundo turno entre Lula e Bolsonaro: “Ele usa o fato de você abominar um deles para levá-lo aos poucos a cair no extremo oposto”.

No cinema, por vezes, o diabo é boa pinta, sedutor e perfeito anfitrião. No Brasil, dependendo da ocasião, toma uísque, cachaça, vinho ou tubaína; e também articula “almoços democráticos” entre ex-presidentes.

O tinhoso está sempre atento às oportunidades e, no momento, não perde uma sessão da CPI da pandemia, cuja gravidade exigiria apurado senso moral, imparcialidade e sentimento de dever: coisas que o diabo não pode permitir. Quase posso vê-lo soprando no ouvido de alguns senadores, insuflando os ânimos, manipulando os incautos, jogando com a vaidade de todos e, sobretudo, gozando com a naturalização da mentira e a banalização do mal (notada pelo senador Alessandro Vieira que comparou o depoimento de Pazuello ao julgamento de Eichmann).

Denis Lerrer Rosenfield* - Hamas e o terror

- O Estado de S. Paulo

Não se busca a paz, nem a coexistência pacífica, nem a criação de dois Estados...

Confundir o Hamas e a Jihad Islâmica com a causa palestina é um imenso desserviço aos próprios palestinos e a uma paz durável e justa no Oriente Médio, com dois Estados, judeu e palestino, vivendo lado a lado e cooperando entre si. Vitimizar os habitantes de Gaza como se estivessem submetidos ao arbítrio dos israelenses é não somente um erro de cálculo, como um desrespeito à verdade. Infelizmente, esse tipo de narrativa tem vigorado em boa parte da cobertura jornalística, fazendo a propaganda do terror ter valor de verdade.

Convém, preliminarmente, caracterizar o Estado do Hamas como um Estado de terror, que utiliza arbitrariamente a violência para atacar os israelenses e oprimir a sua própria população. Se os palestinos vivem lá na miséria e em péssimas condições sociais, isto se deve principalmente a que os recursos são utilizados para a compra e fabricação de armas, foguetes e mísseis, além da construção de túneis subterrâneos empregados em operações militares, para proteger os seus militantes, e não os palestinos, cujo bem-estar é literalmente menosprezado.

Há uma diferença essencial entre o Estado de Israel e o do Hamas. O primeiro está voltado para a proteção de seus cidadãos, pessoas livres num regime democrático, e o segundo, baseado na violência e na submissão dos seus, expõe esses seus súditos à violência por ele mesmo produzida. Se Israel tem um nível muito baixo de vítimas civis e Gaza um tão alto, isso se deve a uma diferença de natureza entre esses dois Estados: um defende os seus membros, o outro os submete à violência.

Alex Ribeiro - BC ainda tem muitas dúvidas sobre a inflação

- Valor Econômico

Dados de emprego são falhos para prever os preços dos serviços

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central parece estar ainda com muitas dúvidas sobre como vai se comportar a inflação daqui por diante, a julgar pelo que andaram dizendo alguns de seus membros nas última semanas.

Numa live do banco Credit Suisse, o diretor de política monetária do BC, Bruno Serra Fernandes, abriu o jogo sobre as duas frentes que podem fazer a inflação subir ou descer: as pressões de oferta e de demanda. Em ambos os casos, pode haver surpresas, para o bem ou para o mal.

Do lado da oferta, ele citou a alta dos preços das commodities em geral e, em particular, do petróleo, que ocorreu em paralelo com uma depreciação cambial. O diagnóstico do Copom é que essa alta é temporária, ou seja, a inflação sobe, mas depois desce. O nível de preços da economia ficaria mais alto e a população teria uma perda de renda real ao fim desse processo, mas lá adiante a inflação voltaria para a meta, que é a forma comum de julgar o trabalho dos BCs.

Bruno Carazza* - Bolsonaro, porcos e sardinhas

- Valor Econômico

Orçamento secreto inova para continuar tudo igual

Rogério Marinho, atual ministro do Desenvolvimento Regional, faz parte de uma linhagem da qual pertenceram Fernando Bezerra, Ramez Tebet, Ney Suassuna, Ciro Gomes, Geddel Vieira Lima, Mário Negromonte, Gilberto Kassab, Fernando Coelho e Helder Barbalho, entre outros. Em comum, são políticos com forte base local e que tiveram sob suas mãos a distribuição de verbas para a realização de obras Brasil afora. Trata-se da árvore genealógica do novo escândalo que ronda o governo Bolsonaro: o orçamento secreto - ou “tratoraço”, como preferem alguns.

Em qualquer lugar do mundo, político adora uma obra pública. Seja no lançamento da pedra fundamental ou no descerramento da placa de inauguração, não podem faltar o discurso das autoridades, a banda de música, a entrevista para a rádio local, as fotos para as redes sociais e aquele “banho de povo” que pode render muitos votos nas próximas eleições.

Enquanto educação, saúde e segurança são políticas públicas difíceis de serem atribuídas a um político em particular - pois resultam da cooperação entre União, Estados e municípios e apresentam resultados apenas no médio e longo prazos -, obras são entregas concretas que levam a marca de quem conseguiu os recursos em Brasília e viabilizou a construção da ponte ou do açude, o asfaltamento da estrada ou o embelezamento da praça da Matriz.

Miguel de Almeida - Os bozos morrem na véspera

- O Globo

Um bom soldado não morre na véspera, reza a lenda. Menos os bolsonaristas —esses morrem antes, durante e depois.

Sendo que o durante (ao vivo e em cores) chega a ser vergonhoso por desnudar o exército olavista com tremores faciais, esgares de medo, tiques inesperados, suores amazônicos e o grito de “mamãe!” entalado na garganta. Canastrões fundamentalistas, suas mentiras são legendadas.

Nunca neste país houve uma corja governante desmentida pelas redes sociais em forma de VAR. A cada mentira dita na Escolinha do Professor Renan, à semelhança de mortos-vivos, de imediato retornam a circular antigos tuítes ou vídeos de quando o prócer bolsonarista bancava o macho-alfa no mundo digital. Na vida real, tremem miseravelmente de medo.

Vou repetir: aqui se posta, aqui se paga.

Parece ser uma invenção de Olavo de Carvalho, plasmada pelo Bozo, o grotesco padrão do valente de salão. Escondido na Virgínia, o raivoso lançador de perdigotos dita o discurso bozonarista em nível de aposto escatológico. Forjou, como um sub-Goebbels, a estampa do ultradireitista brazuca ao surgir com chapéu e espingarda à mão. Ao ser trazido do bunker digital à vida terrestre, condenado a pagar milhões por suas obsessivas calúnias, chorou palavrões. Aí se fez de pobre coitado. É o modus bozus de fuga.

Irapuã Santana - Racismo algorítmico

- O Globo

A discriminação racial é um problema que acompanha a população negra desde o século XVI, com o início do tráfico de pessoas escravizadas e o fundamento moral e religioso de que o negro não tinha alma. Com o passar do tempo, nossa condição de ser humano passou a ser reconhecida pela sociedade, mas, infelizmente, não atingimos o mesmo patamar de acesso a direitos e bens da vida que compreendem a dignidade da pessoa humana, previstos em nossa Constituição Federal.

Nesse percurso até os dias atuais, a forma de demonstração do racismo também foi evoluindo. Novas técnicas surgem e novas formas de exclusão nascem com elas. Em outras palavras, quando uma realidade é restrita na sua criação, quando há um foco para agradar um público específico, outro sem-número de pessoas fica de fora de todo o processo, restando prejudicado.

Cidadania: Pazuello merece punição

- Nota oficial

Sob liderança do general Edson Pujol, o Exército se notabilizou por seguir na caserna as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) enquanto Bolsonaro as desprezava. É já icônica a cena de Pujol cumprimentando o presidente com o cotovelo, o que tanto desagradou o chefe em sua delinquência sanitária.

Neste domingo (23), finalmente, Bolsonaro se vingou, afrontando a hierarquia e a disciplina das Forças Armadas ao exibir o general de divisão Eduardo Pazuello – por razões inexplicáveis ainda na ativa – como uma marionete de sua perversidade, em cima de um trio elétrico, em meio a quase meio milhão de mortos de uma pandemia sem fim.

Sua participação no cortejo homicida do presidente da República pede que as medidas cabíveis sejam adotadas a fim de fazer observar os regimentos internos das Forças e as leis da República. O Alto Comando do Exército não pode deixar passar tal gesto de quebra de hierarquia e indisciplina.

Tratou-se, a um só tempo: 1) de um atentado à Saúde Pública, no contexto de uma terceira onda de Covid, emergência de uma nova variante, a indiana, e escassez de vacinas e kits intubação; 2) e de um ato político de extrema-direita, com Bolsonaro emulando o abjeto ditador Benito Mussolini.

Hora de as Forças Armadas colocarem um ponto final no vexame a que vêm sendo submetidas, com a responsabilização do general Pazuello, o pior ministro da Saúde da história, e deixarem claro que não serão transformadas em instrumento político ou milícias de um ex-capitão do Exército psicologicamente comprometido.

Roberto Freire
Presidente Nacional do Cidadania

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Os partidos e o candidato da terceira via

O Estado de S. Paulo

O País tem um urgente desafio: encontrar um candidato competente e responsável, capaz de representar uma alternativa viável a Luiz Inácio Lula da Silva e a Jair Bolsonaro. A população não pode ser refém do lulopetismo e do bolsonarismo, opções que – por mais empenho que se coloque para identificar diferenças entre elas – convergem de forma tão cristalina no negacionismo (seja na saúde pública ou na economia), na falta de disposição para promover as reformas, na utilização da máquina pública para interesses particulares (familiares ou partidários), na irresponsabilidade da gestão pública e no exercício do poder para fins exclusivamente eleitorais.

Esse desafio à liberdade e à cidadania – encontrar um candidato a presidente da República responsável e com viabilidade política – é, em alguma medida, tarefa de toda a sociedade. Mas, ainda que todos os cidadãos sejam em alguma medida responsáveis – e é muito oportuno que ninguém se sinta alijado do processo político –, há numa democracia representativa atores institucionais sobre os quais recai especial responsabilidade pelo futuro do País. Faz-se referência aqui aos partidos políticos.

De maneira muito especial, cabe às legendas encontrar um candidato viável da terceira via, comprometido com o interesse público.

Essa específica responsabilidade dos partidos não é mero dever de ocasião, em razão das atuais circunstâncias. Nada mais distante disso. A tarefa é decorrência direta da missão institucional dos partidos políticos em uma democracia representativa: assegurar pluralidade de opções políticas. E ao falar da terceira via, é disto que se trata: garantir que o eleitor, ao votar para presidente da República, tenha uma opção de voto viável e responsável.

Por isso, a Constituição de 1988 coloca os partidos políticos entre as instituições fundamentais para a organização do Estado. Essa menção não é uma espécie de homenagem formal ou de regalia institucional. As legendas têm papel decisivo na qualidade dos candidatos que o eleitor tem à disposição. Tanto é assim que, por expressa determinação constitucional, a filiação partidária é uma das condições de elegibilidade.