sábado, 10 de julho de 2021

Luiz Werneck Vianna* - A pergunta que não quer calar

A saída onde é a saída, a pergunta dos que padecem dos males do pandemônio que nos acomete com fúria não encontra quem indique uma informação útil. Aqui e ali surgem vozes com a sabedoria cediça dos velhos do Restelo que nos aconselham a esperar pelo bom tempo, a decifrar o movimento das nuvens em busca de sinais benfazejos. Aos que acorrem as ruas, principalmente os jovens que imprecam contra a má sorte que o destino lhes reservou, cabe o retorno às suas atividades on line por falta de outras alternativas de ação até que próxima manifestação lhes devolva o sentido da vida. Da política, lugar de organização de um projeto comum, só nos vem os cálculos dos que cogitam das oportunidades para o poder, o centro político, um lugar que foi de Tancredo e de Ulisses no alvo de políticos sem as credenciais necessárias para sua representação, embora apenas dela possa provir as palavras que orientem e organizem nossas ações.

Decerto que a degradação continuada do governo Bolsonaro abre um atalho que pode facultar a irrupção de um impeachment, mas não se deve confiar nisso com o parlamento que aí está. As infaustas circunstâncias atuais parecem apontar para que a sucessão presidencial seja a hora e a vez para que o país se livre do pesadelo que o atormenta. Na aparência, uma solução fácil que reclamaria apenas as virtudes da paciência das forças democráticas para se fazer efetiva, contudo, vista de perto, plena de dificuldades que somente ações políticas bem concertadas podem evitar. Engana-se quem imagina como destituídas de poder e influência as classes sociais e as frações das elites políticas que atuaram decisivamente em favor do sucesso eleitoral da candidatura Bolsonaro. Elas não só garantiram sua presença dominante na sociedade como expandiram em muitas vezes seu poder, removendo obstáculos institucionais que travavam a aceleração capitalista por meio das reformas na legislação protetora do trabalho e da remoção das agências de proteção ao meio ambiente deixando-o a mercê das investidas do agronegócio, hoje o carro-chefe do capitalismo brasileiro.

Ascânio Seleme - Claro que militar rouba

O Globo

Fato de o servidor ser militar não o inocenta prévia e automaticamente de qualquer denúncia

Imagine se a Associação dos Funcionários Públicos Federais emitisse uma nota oficial protestando contra denúncias de corrupção de seus associados. Seria ridícula, tão ridícula quanto a nota assinada pelo ministro da Defesa, Braga Netto, e os comandantes militares contra o presidente da CPI, senador Omar Aziz, por ter observado que o lado podre das Forças Armadas envergonha o lado bom. Qual é o erro nesta afirmação? Nenhum, a menos que os militares honestos não se envergonhem dos malfeitos dos bandidos fardados.

O fato de o servidor ser militar não o inocenta prévia e automaticamente de qualquer denúncia. Para ser honesto, tem que praticar a honestidade. Pode ser que no estrito cumprimento de suas obrigações constitucionais, dentro dos quartéis, seja mais difícil ao servidor fardado aliviar os cofres públicos, em razão da disciplina rígida e do sistema punitivo próprio. Mas, ainda assim, rouba-se até mesmo na caserna. Em 1991, O GLOBO revelou um mega esquema de desvios no Exército através do superfaturamento de fardas e roupas de cama e banho para recrutas. Em 2017, o Ministério Público Militar denunciou 11 pessoas, seis militares e cinco civis, por desvios de R$ 150 milhões em contratos de obras entre 2005 e 2010.

João Gabriel de Lima - O que leva o Congresso a ouvir a voz das ruas

O Estado de S. Paulo

No Brasil, grupos que pensam de forma distinta não conseguem marchar juntos

Os que não votaram em Jair Bolsonaro estão nas ruas pedindo impeachment desde 29 de maio, data da primeira manifestação organizada por movimentos de esquerda. No sábado, dia 3, veio a adesão de militantes do PSDB – que, numa cena lamentável, foram agredidos por integrantes do Partido da Causa Operária, o PCO. Os tucanos não se intimidaram e prometem comparecer em maior número à próxima manifestação.

Os que votaram em Jair Bolsonaro – mas que, nas palavras do deputado Kim Kataguiri, formam o bloco dos “traídos” – marcaram protestos para o dia 12 de setembro. As manifestações reunirão movimentos como o MBL e o Vem Pra Rua e devem contar com a presença de vários integrantes do Partido Novo. A sigla de João Amoêdo aderiu oficialmente ao impeachment na segunda-feira, dia 5.

Hélio Schwartsman -Bolsonaro já era?

Folha de S. Paulo

O perigo de golpe é mais um argumento pró-impeachment

A pergunta que não quer calar é se a liquefação do governo já tornou Jair Bolsonaro eleitoralmente inviável ou se ainda corremos risco de vê-lo no páreo em 2022. Adoraria poder cravar a primeira opção, mas, especialmente depois de Bolsonaro em 2018, que eu jurava que não seria eleito, aprendi a não mais superestimar a racionalidade de meus coetâneos.

O último Datafolha mostra que os apuros por que passa o presidente são sérios. As avaliações negativas já chegam a 51%. Em termos de imagem, a situação é ainda pior. A maioria dos eleitores já vê Bolsonaro como desonesto, falso, incompetente, despreparado, indeciso, autoritário e burro. São adjetivos difíceis de combater numa campanha. E nem dá para dizer que a avaliação seja injusta.

Cristina Serra - Baixem o tom, fardados!

Folha de S. Paulo

O Brasil não teme suas carrancas, coturnos e tanques

Generais, brigadeiros e almirantes deveriam ser os primeiros a querer esclarecer as gravíssimas denúncias de corrupção, reveladas pela CPI da Covid, que batem à porta de Bolsonaro e de uma penca de fardados. Mas o que estamos vendo é bem o contrário.

Como em outros momentos da nossa história, a cúpula das Forças Armadas e o Ministério da Defesa preferem esconder a sujeira embaixo do tapete, peitar as instituições democráticas e afrontar a Constituição e a sociedade civil. É esse o sentido da nota assinada pelo ministro Braga Netto e pelos três comandantes militares após a declaração do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), de que há um "lado podre das Forças Armadas envolvido com falcatrua dentro do governo".

Demétrio Magnoli – Uma segunda vida para Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Impeachment parece descer sobre Brasília, mas as aparências enganam

Nuvens de chumbo. As taxas de aprovação de Bolsonaro desabaram para 25%, enquanto a alta finança e o agronegócio finalmente abandonam o presidente. O cerco se fecha no Congresso, com a CPI da Covid, e nas ruas, com manifestações em plena pandemia. A sombra do impeachment parece descer sobre Brasília. Aqui, porém, vale o mais clássico dos chavões: as aparências enganam.

Impeachment exige, além de crimes de responsabilidade, que não faltam, um alto nível de consenso político e social. Consenso político: a ruptura de uma expressiva maioria parlamentar com o Planalto. Consenso social: o rechaço majoritário à figura do presidente, expresso não só em sondagens de opinião mas em massivas mobilizações populares. As duas precondições estão ausentes do cenário.

Na sua primeira etapa, a CPI da Covid documentou a extensa coleção de crimes do governo federal contra a saúde pública. Normalmente, CPIs têm a missão de desvendar mistérios. No caso da CPI em curso, não havia mistério: à luz do dia, o governo federal deixara a nação à mercê da pandemia, agravando desastrosamente a crise sanitária. A tarefa dos senadores circunscrevia-se à coleta de provas dos crimes cometidos pelo presidente e por seu círculo próximo.

Marcus Pestana* - Mudanças eleitorais: duas ideias, dois equívocos

As democracias modernas, sejam presidencialistas ou parlamentaristas, se assentam em instituições essenciais, na Constituição e nas leis. O centro de gravidade reside no parlamento, onde a pluralidade de interesses e visões estão presentes, e nos partidos políticos, organizadores coletivos das diversas correntes de opinião.

A existência de um legislativo forte e de um quadro partidário consistente, enraizado na sociedade e não excessivamente pulverizado é essencial para o bom funcionamento da democracia. Ainda mais no mundo contemporâneo onde a democracia representativa é desafiada pela demanda de participação de uma sociedade cada vez mais exigente, e pelo surgimento das redes sociais que, de certa forma, autonomizaram a sociedade e os cidadãos em relação à intermediação institucional.

Presidentes de Senado e TSE reagem às ameaças golpistas de Bolsonaro contra as eleições de 2022

Barroso falou em crime de responsabilidade; já Pacheco chamou de inimigo da nação aquele que busca o retrocesso democrático

Danielle Brant, Washington Luiz, Matheus Teixeira, Ricardo Della Coletta / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luís Roberto Barroso, reagiram às recentes ameaças golpistas do presidente Jair Bolsonaro ao processo eleitoral e democrático do país.

Ambos se manifestaram horas após Bolsonaro ter afirmado, sem apresentar nenhuma prova, que a fraude eleitoral está no TSE, além de ter atacado Barroso, a quem chamou de "idiota" e "imbecil". Um dia antes, Bolsonaro já havia colocado em xeque a realização das eleições de 2022.

Bolsonaro tem feito repetidas ameaças contra as eleições, numa radicalização de discurso que coincide com pesquisas que apontam o aumento de sua reprovação e o favoritismo do ex-presidente Lula (PT) no pleito de 2022.

Em entrevista, Pacheco subiu o tom e afirmou que não aceitará retrocessos à democracia do país, em resposta também às manifestações de militares sobre a CPI da Covid.

Dois dias atrás, o ministro da Defesa, Braga Netto, e os comandantes das Forças Armadas divulgaram uma nota na qual repudiavam declarações feitas pelo presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), sobre os militares sob investigação e na mira da comissão.

“Nós não podemos admitir qualquer tipo de fala, de ato, de menção que seja atentatória à democracia ou que estabeleça um retrocesso naquilo que, repito, a geração antes da minha conquistou e que é nossa obrigação manter, que é a democracia no nosso país”, afirmou o presidente do Senado.

 “Todo aquele que pretender algum retrocesso ao estado democrático de direito esteja certo que será apontado pelo povo brasileiro e pela história como inimigo da nação e como alguém privado de algo muito importante para os brasileiros e para o Brasil, que é o patriotismo, neste momento que nós precisamos de união, de pacificação, de busca de consenso.”

Já Barroso afirmou em nota que qualquer tentativa de impedir a realização de eleições em 2022 “configura crime de responsabilidade”. “Qualquer atuação no sentido de impedir a sua ocorrência viola princípios constitucionais e configura crime de responsabilidade.”

O magistrado classificou as afirmações do presidente como “lamentáveis”, afirmou que Bolsonaro foi instado a apresentar as provas de fraudes que diz ter sobre as eleições e que nada apresentou. Acrescentou que a realização de eleições “é pressuposto do regime democrático”.

Barroso citou ainda que também os ministros do STF Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luiz Fux e Rosa Weber presidiram o TSE de 2014 para cá e que as acusações de Bolsonaro contra a corte eleitoral atingem a todos. “A acusação leviana de fraude no processo eleitoral é ofensiva a todos."

O ministro Alexandre de Moraes (STF), que também integra o TSE e chefiará a corte no pleito do ano que vem, seguiu a mesma linha e repudiou as declarações de Bolsonaro.

Ele usou as redes sociais para afirmar que "não serão admitidos atos contra a Democracia e o Estado de Direito, por configurar crimes comum e de responsabilidade".

"Os brasileiros podem confiar nas instituições, na certeza de que, soberanamente, escolherão seus dirigentes nas eleições de 2022, com liberdade e sigilo do voto."

As declarações de Pacheco e de Barroso foram uma reação a Bolsonaro, que pela manhã atacou o TSE, o próprio ministro do Supremo, a CPI da Covid e de novo colocou em xeque as eleições de 2022.

Gustavo Alves - Bolsonaro insiste no confronto para mobilizar base, mas ela está indo embora

O Globo

Depois de dizer na live de quinta-feira "caguei para a CPI" da Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro chamou o ministro Luís Roberto Barroso, que está no comando do Tribunal Superior Eleitoral, de "imbecil", por ser contra a volta do voto impresso. O presidente, assim, mantém o tom de confronto, mesmo diante do recorde de rejeição ao seu governo, segundo pesquisa do Datafolha. A mesma que apontou que o ex-presidente Lula ampliou sua vantagem em uma eventual disputa com Bolsonaro à Presidência.

A agressividade foi mostrada em pronunciamentos voltados diretamente para o público: os que assistem ao presidente nas noites de quinta-feira nas redes sociais e os apoiadores que o esperam no Palácio da Alvorada. Seria uma forma de manter a base bolsonarista mobilizada, para continuar com chances de disputar a reeleição em 2022. Mas há um problema para Bolsonaro apontado no Datafolha, quer ele reconheça ou não a veracidade do levantamento: a base pode estar indo embora.

Rodrigo Pacheco: confia na Justiça Eleitoral e que quem pretender retrocesso democrático será considerado inimigo da nação

Senador concedeu entrevista à imprensa nesta sexta-feira após Bolsonaro levantar novas suspeitas sobre a segurança das próximas eleições

Julia Lindner / O Globo

BRASÍLIA — Após o presidente Jair Bolsonaro voltar a colocar em dúvida a segurança das eleições, o presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), afirmou que "todo aquele que pretender algum retrocesso ao Estado Democrático de Direito será apontado pelo povo brasileiro como inimigo da nação". Pacheco disse que confia na justiça eleitoral brasileira e que não acredita que o sistema esteja suscetível a fraudes em 2022.

— Não podemos admitir qualquer tipo de fala, de ato, de menção que seja atentatória à democracia ou que estabeleça um retrocesso na democracia. Tudo quanto houver de especulações em relação a algum retrocesso á democracia, como a frustração das eleições próximas, é algo que o Congresso, além de não concordar, repudia veementemente. Nós não admitiremos nenhum retrocesso nesse sentido.

Pacheco também manifestou solidariedade ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, chamado de "imbecil" por Bolsonaro. "Discordo de qualquer ataque pejorativo que seja feito a ele (Barroso) ou a qualquer cidadão."

Em mais de um momento, Pacheco garantiu que as eleições acontecerão no próximo ano. Ele reforçou que as eleições e a democracia são inegociáveis:

— As eleições são uma realidade da democracia brasileira, são inegociáveis e o formato dessas eleições, que é algo que se discute muito hoje na sociedade, sobre a manutenção do formato atual ou de uma nova tecnologia através do voto auditável, é uma discussão que haverá de se ter com todos os personsagens da República, mas sem ataque a pessoas. Essa discussão não será feita pelo Executivo, não será feita pelo TSE, e sim pelo Congresso.

Presidente do TSE rebate Bolsonaro e chama ataques de 'lamentáveis' e 'levianos'

Em nota, ministro Luís Roberto Barroso diz que agir para impedir as eleições configura crime de responsabilidade; Em queda nas pesquisas, presidente ameaçou não aceitar eleições, xingou Barroso e disse que há fraude na Corte eleitoral

Mariana Muniz / O Globo

BRASÍLIA — O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, rebateu os ataques " lamentáveis quanto à forma e ao conteúdo" feitos pelo presidente Jair Bolsonaro nesta sexta-feira. Em nota, o ministro rebateu em cinco pontos as ameaças feitas por Bolsonaro, e disse que a "acusação leviana de fraude no processo eleitoral é ofensiva a todos" os ministros que já presidiram a Corte eleitoral.

"Desde a implantação das urnas eletrônicas em 1996, jamais se documentou qualquer episódio de fraude. Nesse sistema, foram eleitos os presidentes Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. Como se constata singelamente, o sistema não só é íntegro como permitiu a alternância no poder", diz a nota encaminhada à imprensa.

Ainda na nota, o presidente do TSE afirma que a realização de eleições, na data prevista na Constituição, é pressuposto do regime democrático. "Qualquer atuação no sentido de impedir a sua ocorrência viola princípios constitucionais e configura crime de responsabilidade", afirma.

No comunicado, Barroso ainda esclarece que em relação às eleições de 2014, o PSDB, partido que disputou o segundo turno das eleições presidenciais, realizou auditoria no sistema de votação e reconheceu a legitimidade dos resultados.

"A presidência do TSE é exercida por Ministros do Supremo Tribunal Federal. De 2014 para cá, o cargo foi ocupado pelos Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso. Todos participaram da organização de eleições. A acusação leviana de fraude no processo eleitoral é ofensiva a todos", disse.

O que a mídia pensa: Opiniões / Editoriais

EDITORIAIS

Destempero verbal de Bolsonaro quer desviar foco da CPI

O Globo

Têm se tornado mais frequentes as agressões verbais do presidente Jair Bolsonaro a autoridades ou representantes eleitos que desafiem seus objetivos políticos. No último episódio, disparou ofensas contra o presidente do Tribunal Superior Eleitorial (TSE), Luís Roberto Barroso, que tem defendido com consistência e competência a segurança das urnas eletrônicas dos ataques estapafúrdios que emanam das hostes bolsonaristas. No devaneio em favor do voto impresso, que prenuncia a contestação de qualquer resultado que lhe possa ser desfavorável nas urnas, Bolsonaro chegou a insinuar, como se tivesse poder para isso, que poderá não haver eleição se não for do jeito como ele quer — mais uma entre tantas barbaridades que tem proferido.

Além de Barroso, chamado de “imbecil”, já foram vítimas do destempero verbal de Bolsonaro outros ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Rosa Weber ou Cármen Lúcia. A saraivada de agressões, ataques vis a pessoas honradas na tentativa de desacreditar a própria instituição do Supremo, levou o presidente do tribunal, ministro Luiz Fux, a emitir nota em que “rejeita posicionamentos que extrapolam a crítica construtiva e questionam indevidamente a idoneidade das juízas e dos juízes da Corte”.