quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Cristovam Buarque* - Brasília tentou

Correio Braziliense 

A substituição do Bolsa Família pelo Auxílio Brasil faz lembrar que Brasília serviu de exemplo para um programa com impacto transformador na estrutura social, e faz perceber que a ideia inicial criada no Distrito Federal se transformou em programa assistencial.

Em 1987, no Núcleo de Estudos do Brasil Contemporâneo, da Universidade de Brasília (UnB), foi elaborada e divulgada a ideia de pagar às famílias pobres uma renda vinculada ao trabalho da mãe para assegurar frequência dos filhos à escola. A ideia carregava a criatividade de ao mesmo tempo mitigar a pobreza, graças à renda, e transformar a estrutura social do país ao colocar as crianças na escola. A renda reduzia a pobreza atual e a escola aboliria a pobreza futura quando as crianças crescessem educadas.

Em janeiro de 1995, a ideia surgida na UnB, se transformou em política pública do Governo do Distrito Federal. Brasília inovou ao criar o programa teoricamente na UnB, e levá-lo à prática de forma pioneira pelo Governo do Distrito Federal. Servindo de inspiração à prefeitura de Campinas, em São Paulo, graças ao prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, conhecido como Grama, e à cidade de Recife, graças ao prefeito Roberto Magalhães. Eleitos dois anos antes do governador do DF, eles começaram programas similares, embora sem o compromisso pleno de vinculação à educação: não adotaram a palavra “Escola” nem colocaram a gestão do programa nas Secretarias de Educação.

Vera Magalhães - É a cara do Bolsonaro

O Globo

Jair Bolsonaro se jactou, como parece que vem se esmerando em fazer em viagens ao exterior, de mais um legado de retrocesso: sim, depois de três anos de desmonte do Ministério da Educação, o Enem está deformado, a cara do governo.

Bolsonaro, é claro, falava daquela pasta ideológica que faz as vezes de suas ideias. Segundo seu tortuoso raciocínio, deve ser celebrado o fato de as questões da prova que deveria medir o conhecimento apropriado pelos estudantes do ensino médio e ser um dos passaportes desses alunos para a universidade reproduzirem essa mesma mixórdia pseudoconservadora em que ele acredita.

Sim, desta vez Bolsonaro acertou, mesmo por essas vias tortíssimas. O Enem tem a cara de um governo que destrói todas as políticas públicas e todos os marcos civilizatórios em que resolve tocar.

Bolsonaro implodiu o Bolsa Família. Achou que deveria ter um programa social com a sua cara, já que o anterior, uma política consolidada, com eficácia comprovada por evidências sociais e estatísticas e institucionalizada ao longo de sucessivos governos, teria a cara do Lula. Imaginem o pavor para um presidente inseguro e paranoico ter de pagar todo mês um benefício com a cara do principal adversário.

Bernardo Mello Franco - A viagem de Lula

O Globo

O ministro Onyx Lorenzoni está irritado com a viagem de Lula à Europa. O bolsonarista reclamou da cobertura da imprensa e acusou o ex-presidente de “falar mal do Brasil”. Fingiu confundir o país com o inquilino do Alvorada.

Lula tem usado o giro internacional para bater duro em Jair Bolsonaro. É o que se espera de qualquer candidato de oposição ao governo. Em Bruxelas, o petista citou o aumento da fome e do desemprego. Em Paris, lamentou a devastação da Amazônia e o fim do Bolsa Família.

Em clima de campanha, o ex-presidente temperou as críticas com mensagens de otimismo. “Apesar de tudo, digo com total convicção: o Brasil tem jeito”, afirmou, na segunda-feira. Foi a senha para dizer que ele próprio, Lula, está pronto e disponível para “reconstruir” o país.

O petista organizou uma agenda sob medida para mostrar prestígio internacional. Reuniu-se com o futuro chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, e será recebido hoje pelo presidente da França, Emmanuel Macron. Bolsonaro não cultiva boas relações com a dupla. Ignorou o alemão no G20 e vive às turras com o francês desde que chegou ao poder.

Zeina Latif - PEC dos Precatórios: São muitos os sócios do oportunismo

O Globo

A PEC dos Precatórios – que está mais para PEC dos Pesadelos – abarca muitos “jabutis”, temas alheios ao seu objeto principal. Oportunistas se aproveitam da fraqueza do governo para obter benesses, colocando a culpa na pandemia, como se esta não tivesse exigido sacrifícios da maioria.

É o caso de mais uma ajuda a municípios, que só fazem procrastinar o ajuste de suas finanças. A PEC prevê o parcelamento em até 240 meses da dívida previdenciária, que totaliza R$126,5 bilhões, bem como a redução em R$36,3 bilhões com a redução de juros de mora, multas e outros encargos, segundo a CNM (Confederação Nacional dos Municípios).

Como agravante, abre-se exceção a uma regra constitucional, promulgada há apenas dois anos, que proibiu parcelamentos superiores a 60 meses.

Elio Gaspari - A China jogou pesado

Folha de S. Paulo / O Globo

Pequim aderiu à diplomacia de segunda

A revelação veio do repórter Marcelo Ninio. Depois que a China suspendeu a importação de carne bovina brasileira, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, pediu hora para falar ao telefone com seu equivalente, e Pequim respondeu que ele estava sem espaço na agenda. No pedido, não se havia especificado dia nem hora. A resposta esfarrapada foi grosseria inédita para uma diplomacia experimentada como a do Império do Meio.

De um lado, ela mostra como a China é capaz de jogar bruto quando acha que está numa posição de força. De outro, ensina que o governo do capitão cultiva malcriações delirantes, mas é, acima de tudo, disfuncional.

Fernando Exman - Bolsonaro joga luz sobre prévias do PSDB

Valor Econômico

Partido ganhou o status de adversário prioritário do chefe do Executivo em São Paulo

Embora previsível, o entrevero que resultou na suspensão do evento que formalizaria a filiação do presidente Jair Bolsonaro ao PL ocorreu mais cedo do que estimavam aqueles que acompanhavam as negociações de perto. E quem saiu ganhando, desta vez, foi o PSDB.

A poucos dias das eleições internas que definirão o pré-candidato do partido, o PSDB está rachado. Ainda assim, ganhou o status de adversário prioritário do chefe do Executivo no principal colégio eleitoral do país.

Na aproximação entre Bolsonaro e PL, algum atrito era dado como certo. Foi-se o tempo em que ele mudava de partido sem fazer exigências.

Isso ocorreu quando passou pelo PTB (de 2003 a 2005), PFL (2005), PP (entre 2005 e 2016) e PSC (2016, 2017 e 2018). Eram seus tempos de baixo clero. A exceção foi o PSL, onde entrou em 2018 e do qual saiu brigado justamente por querer avançar sobre o domínio dos outros.

Daniel Rittner - Visitas presidenciais e promessas bilionárias

Valor Econômico

Histórico recomenda cautela com declarações e anúncios feitos em encontros de chefes de Estado ou governo

Jair Bolsonaro pede investimentos em Dubai. Paulo Guedes diz que a comitiva no Oriente Médio está atraindo petrodólares. Fábio Faria posa ao lado de Elon Musk e fala sobre uma parceria com a SpaceX para conectar regiões remotas da Amazônia com internet por satélite. Tarcísio Freitas garante que o capital árabe vai chegar em peso nas próximas concessões. Visitas presidenciais costumam ser ótimas ocasiões para promover um país e estabelecer contatos de alto nível. Estreitam relações, frequentemente servem como oportunidade para desatar nós, impulsionam acordos travados por algum impasse técnico. Mas o histórico recomenda cautela, muita cautela, com declarações e anúncios feitos em encontros de chefes de Estado ou governo.

Em outubro de 2019, Bolsonaro e seus ministros anunciavam em Riad um aporte de US$ 10 bilhões da Arábia Saudita em grandes projetos de infraestrutura no Brasil. Entusiasmado, Onyx Lorenzoni já comentava até quais eram as obras preferidas do governo para receber esse dinheiro. Dois anos depois, nenhum tostão chegou aqui.

Luiz Carlos Azedo - Viagem de Bolsonaro ao Oriente Médio agrada eleitores e mira em investidores

Correio Braziliense

O presidente não passou por constrangimentos em Dubai, no Bahrein e no Catar. E aproveitou o périplo para reforçar sua agenda interna e agradar sua base com declarações polêmicas

A viagem das Arábias do presidente Jair Bolsonaro para atrair investidores mirou tanto a sua base eleitoral quanto os petrodólares com os quais o ministro da Economia, Paulo Guedes, imagina financiar a retomada do crescimento da economia no próximo ano, diante de previsões catastróficas dos analistas internacionais, inclusive os da prestigiada revista The Economist, que “erra todas”, segundo o nosso Posto Ipiranga.

No domingo e na segunda-feira, Bolsonaro participou do fórum Invest In Brasil, em Dubai, promovido pela Apex-Brasil, e visitou o pavilhão da Embraer na Dubai Airshow, evento do setor aeroespacial, e o pavilhão do Brasil na Expo 2020, onde a numerosa delegação brasileira festejou a viagem, com a primeira-dama Michele roubando a cena. Dubai é um emirado novo-rico, aberto para o mundo para não depender de uma atividade econômica sem futuro, o petróleo, e criar uma economia baseada no comércio internacional e no turismo, atividades que respondem hoje por 95% da sua economia.

Com o dinheiro do óleo, descoberto na região em 1966, voou do século 18 para o século 21 em apenas uma geração, nas asas da melhor companhia aérea da atualidade. Com um dos mais importantes hubs aeronáuticos do Oriente Médio, tornou-se um centro financeiro e de negócios que atrai executivos e milionários de todo o mundo, devido à segurança e às atrações turísticas de altíssimo luxo. É uma cidade-estado de população global (83% são estrangeiros), com um único dono, Sua Alteza Shaikh Mohammed bin Rashid Al Maktoum, conhecido como Shaikh Mo.

Fábio Alves – A renda se esvai

O Estado de S. Paulo

Quando a inflação ultrapassa os dois dígitos, deixa uma fatura amarga para os mais pobres

A combinação de inflação mais acelerada e reajustes salariais aquém dos índices de preços ao consumidor, como reflexo de um mercado de trabalho ainda muito fraco, está levando os brasileiros a amargar uma perda de renda em velocidade espantosa.

Não à toa, os indicadores de vendas do varejo e de serviços registraram em setembro uma queda mais acentuada do que os analistas esperavam. Essa perda de renda pode afetar a atividade econômica neste quarto trimestre e em 2022.

Segundo o Salariômetro da Fipe, que acompanha os dissídios salariais no mercado de trabalho, o reajuste mediano resultante de acordos e convenções coletivas em setembro – apesar de nominalmente elevado, de 8,5% – ficou 1,9 ponto porcentual abaixo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), maior perda nos últimos 12 meses.

Vinicius Torres Freire - Bolsonaro em fase de destruição fina

Folha de S. Paulo

Governo não tem dinheiro para reajuste de servidor e também alugar o centrão 

Gente que vai deixar de receber auxílio emergencial faz fila para entrar no Cadastro Único, a lista de quem quer receber o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família. A partir de agora, uns 19 milhões vão ficar sem auxílio emergencial e sem Auxílio Brasil.

De modo discreto, essa fila da fome apareceu aqui e ali, em jornais e TVs. Não se dá muita bola para esses "invisíveis" à vista.

De modo espalhafatoso, Jair Bolsonaro disse que quer dar aumento para os servidores federais. Se conseguir, não vai sobrar mais nada daqueles R$ 91,6 bilhões que pretende arrumar com o calote dos precatórios e com o reajuste do teto de despesas do governo.

Não sobraria nada para aumentar o dinheiro de emendas parlamentares: para pagar o aluguel do centrão. Não sobraria nada para aqueles 19 milhões na fila da fome. Já não estava previsto que essas pessoas recebessem ajuda. Agora, Bolsonaro junta insulto ao prejuízo.

Bruno Boghossian - O dilema Biden-Sanders

Folha de S. Paulo

Petistas ainda calculam movimentos para alargar base eleitoral do ex-presidente

Lula e Geraldo Alckmin decidiram trocar gentilezas em público depois que circularam planos para a formação de uma chapa entre os dois no ano que vem. O tucano afirmou na semana passada que o ex-presidente tem apreço pela democracia. O petista retribuiu e disse que tem uma "extraordinária relação de respeito" com o ex-governador paulista.

Famoso por dar declarações ensaboadas quando quer escapar de assuntos espinhosos, Alckmin fez questão de deixar a porta aberta para conversar. Lula, que costuma fazer piada quando surgem especulações sobre candidatos a vice, preferiu dançar em torno do tema e fez um aceno ao dizer que não há nada que não possa "ser reconciliado".

Hélio Schwartsman - Covid-19 ainda é um grande problema

Folha de S. Paulo

Quanto mais o vírus circula, maior a chance de surgirem variantes ameaçadoras

Países que acreditaram ter controlado a Covid-19 por meio da vacinação se veem engolfados em novas ondas de contaminação. Meu propósito aqui não é deprimir o leitor.

As novas ondas são substancialmente menos letais que as anteriores e atingem mais o público que escolheu não imunizar-se. São, ainda assim, um problema. O fato de um indivíduo ser tolo não é razão suficiente para que o poder público perca o interesse em preservar sua vida. Quando a circulação do vírus aumenta, aumenta também a morbimortalidade entre os que fizeram tudo certinho, mas tiveram a infelicidade de não responder tão bem ao biofármaco —em geral idosos e imunossuprimidos.

Mariliz Pereira Jorge - Bolsonaro e o sexo matinal

Folha de S. Paulo

Deu uma aula sobre como qualquer pessoa jamais deveria se comportar

Jair Bolsonaro é o típico conservador que diz preferir um filho morto a um gay, fala em nome da família "tradicional", repudia a educação sexual nas escolas, mas usa um evento oficial do governo para insinuar que transou com sua mulher horas antes. Só faltou dar uma ajeitada nas partes íntimas para coroar o momento constrangedor.

Longe de mim ser pudica. Escrevi durante mais de dez anos sobre sexo em revistas masculinas. Levava àquele público a visão feminina, a minha, sobre a temática na tentativa de diminuir o abismo que há entre homens e mulheres em tópicos como desejo, frequência, filme pornô, consentimento e tudo o mais que deve ser discutido. Ou seja, tudo.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

PEC para toda obra

Folha de S. Paulo

Em sanha eleitoreira, Bolsonaro fala em usar calote para dar benesse a servidor

Faz dois meses que Jair Bolsonaro se dedica a golpear a economia, dilapidando a ordem restante nas contas públicas a fim de diminuir sua rejeição nas urnas. Tal atitude não é rara no país, ao contrário. Mas o comportamento eleitoreiro de Bolsonaro é dos mais vulgares, sem subterfúgios.

Nesta terça-feira (16), o presidente declarou que pretende reajustar aos salários de "todos os servidores federais, sem exceção". Ainda acrescentou, sem pejo ou lógica: ‘Dessa maneira, estamos mostrando responsabilidade".

O dinheiro para a benesse do reajuste viria dos recursos criativamente criados pela PEC dos Precatórios, a proposta de emenda constitucional que prevê um calote em parte dessas dívidas, além de elevar o teto anual de gastos federais.

A matéria ainda depende de aprovação no Senado. Caso permita despesas extras da ordem de R$ 91,6 bilhões em 2022, como prevê o governismo, o dinheiro talvez não seja bastante para satisfazer aos desejos do Palácio do Planalto, do centrão e do Parlamento em geral.

Os servidores federais estão sem reajuste desde o início da epidemia. O Orçamento do próximo ano não prevê correção dos salários.