domingo, 30 de janeiro de 2022

O que pensa a mídia: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Vacinação avança, mas índices são desiguais no país

O Globo

Depois de um início marcado por negligência na compra de imunizantes, incompetência no gerenciamento da crise e escassez de doses, a vacinação contra a Covid-19 no Brasil avançou, principalmente a partir do segundo semestre do ano passado, quando os estoques aumentaram. Pouco mais de um ano após o início da campanha, o país tem quase 80% de cidadãos imunizados com a primeira dose, cerca de 70% com o esquema vacinal completo e em torno de 20% com o reforço. A imunização infantil, apesar das barreiras criadas pelos arautos do atraso, está deslanchando. No entanto, esse panorama favorável esconde peculiaridades. Tal qual acontece em outras áreas, o Brasil é desigual também na vacinação.

Se há estados, como São Paulo, Piauí, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Ceará e Santa Catarina, que já vacinaram completamente mais de 70% de suas populações, há outros que se mantêm bem abaixo da média nacional, como Amapá (42%), Roraima (43%), Acre (50%), Maranhão (55%) e Amazonas (55%). Dentro dos estados, também há disparidades. Como mostrou reportagem do GLOBO, há cidades que vacinaram completamente apenas um em cada cinco moradores. De acordo com levantamento do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz, os bolsões de não vacinados se concentram principalmente nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e no norte de Minas Gerais.

São muitos os motivos que contribuem para travar a vacinação, como a dificuldade de acesso, a desinformação e a influência de líderes religiosos negacionistas. “A população não acredita na imunidade da vacinação”, afirma o secretário de Saúde de São Félix do Xingu, no Pará, Raphael Antônio Souza, que luta para superar o patamar de 20% de imunizados. Ele disse que ampliou o horário de funcionamento dos postos e levou o carro da vacina aos bairros distantes, mas as estratégias falharam. Em Santa Maria das Barreiras, também no Pará, o secretário de Saúde Vanderley Oliveira conta que parte da população se recusa a ir aos postos de saúde por achar que as vacinas são um experimento, o que não é verdade.

Apesar da campanha antivacina capitaneada pelo presidente Jair Bolsonaro e seguidores, de modo geral a vacinação tem resistido bem aos ataques negacionistas, como mostram os percentuais crescentes de imunização no país. Mesmo a vacinação infantil, alvo de lamentáveis mentiras e intimidações, tem recebido forte adesão dos brasileiros, comprovando o que pesquisas de opinião já indicavam.

Mas de nada adianta ter regiões com a maior parte da população vacinada e outras áreas altamente vulneráveis à doença. O país só estará protegido quando conseguir imunizar praticamente toda a população. O Ministério da Saúde deveria fazer uma campanha de esclarecimento focada nas regiões que detêm baixos índices de cobertura. Com o avanço da Ômicron, os casos de Covid-19 explodiram, e o número de mortes voltou a subir. Em várias cidades, as taxas de ocupação de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) estão se aproximando do limite. Autoridades de saúde têm dito que a maior parte dos que procuram os hospitais é de não vacinados ou de pacientes com o esquema incompleto. Sabe-se que a vacina evita internações e mortes. Portanto, mais do que nunca, é a ela que se deve recorrer neste momento de crise.

STF acerta ao suspender decreto de Bolsonaro que põe cavernas em risco

O Globo

Fez bem o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), em suspender trechos do decreto do presidente Jair Bolsonaro que permite empreendimentos em áreas de cavernas e grutas. A decisão de Lewandowski, em resposta a uma ação da Rede Sustentabilidade, ainda será apreciada pelo plenário.

O decreto, assinado em 12 de janeiro, tem sido alvo de críticas de espeleólogos, ambientalistas e cientistas por ameaçar sítios históricos, à medida que permite intervenções em regiões de cavernas classificadas com o grau máximo de relevância, revogando a legislação que proibia impactos irreversíveis nessas cavidades.

São muitas as aberrações contidas no decreto. Ele autoriza empreendimentos de “utilidade pública” como estradas, ferrovias, linhas de transmissão, extração mineral etc. em cavernas com grau máximo de relevância. Permite ainda que impactos irreversíveis sejam compensados desde que autorizados pelo órgão licenciador. Ora, como compensar um dano num sítio histórico com patrimônio irrecuperável? Outro ponto controverso é que ele dá aos ministérios de Minas e Energia e Infraestrutura o poder de decidir sobre os empreendimentos.

Lewandowski suspendeu os trechos do decreto que permitiam impactos irreversíveis nas cavernas com grau máximo de relevância. Segundo ele, “suas disposições, a toda evidência, ameaçam áreas naturais ainda intocadas ao suprimir a proteção até então existente, de resto, constitucionalmente assegurada”.

Disse ainda que a exploração dessas áreas pode “ocasionar o desaparecimento de formações geológicas, marcadas por registros únicos de variações ambientais e constituídas ao longo de dezenas de milhares de anos, incluindo restos de animais extintos ou vestígios de ocupações pré-históricas”.

O decreto que fragiliza a proteção às cavernas é mais um capítulo do desmonte da legislação ambiental promovido pelo governo Bolsonaro, intenção que foi explicitada pelo então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles na explosiva reunião ministerial de 22 de abril de 2020, quando ele propôs que se aproveitasse o foco na pandemia de Covid-19 para passar “a boiada”, flexibilizando as normas.

Felizmente o Supremo tem imposto limites a essa razia — as balizas da Constituição. Foi assim na decisão que restaurou a proteção a restingas e manguezais, que havia sido extinta por uma decisão insensata do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), na época presidido por Salles.

Mais uma vez o STF é chamado a socorrer a sociedade diante de uma ameaça ao patrimônio ambiental, científico e histórico do país. As cavernas classificadas com grau máximo de relevância são uma minoria, justamente porque reúnem condições que só são encontradas naqueles locais. Por isso precisam ser preservadas. Os ministros do Supremo não podem permitir mais esse retrocesso na legislação ambiental brasileira.

Direita popular

Folha de S. Paulo

Calcada em um líder providencial, corrente populista não é fenômeno passageiro

A direita contemporânea se reconfigurou nas últimas décadas, no Brasil e em outras nações, tendo adquirido respaldo popular e competitividade eleitoral. Nada indica que seja um fenômeno passageiro.

O esquema clássico da política até a passagem desse furacão era a polarização entre, de um lado, a esquerda social-democrata, que enfatizava a intervenção do Estado para reduzir as desigualdades e, do outro, uma direita que priorizava a liberdade empresarial e o crescimento econômico.

Nos costumes, as posições conservadoras estavam alinhadas à direita, e as liberais, à esquerda. Em comum, esses dois campos observavam com respeito as chamadas regras do jogo —as mediações institucionais que legitimam, num Estado de Direito, os resultados da disputa política. Por isso resistiam relativamente bem aos líderes providenciais, vingadores da pátria.

A adesão cega e quase religiosa ao chefe carismático, algo que não prevalecia na política ocidental desde a derrota dos fascismos em meados do século 20, parece ter sido um dos elementos fundamentais na transfiguração da direita.

O amálgama de ideias tão chãs e incoerentes —como o terraplanismo, a rejeição à ciência e às vacinas, a xenofobia e as ridículas paranoias conspiratórias contra organizações públicas e empresariais— é claramente menos importante e estável do que o comando de obedecer ao condutor genial.

Era essa obediência mecânica que ensinava aos seus discípulos o ideólogo Olavo de Carvalho, , morto na segunda-feira (24), que se tornou guia espiritual de legiões de bolsonaristas extremados.

A metamorfose da direita —talvez porque tenha encontrado uma parcela da população mergulhada em inseguranças sobre o futuro— foi bem-sucedida ao firmar-se no tabuleiro político-eleitoral em vários países. Vê-se que a derrota eleitoral de Donald Trump não a liquidou nos EUA. Pelo contrário.

No Brasil, apesar de resultados catastróficos na pandemia e na economia, o presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda conta com 22% de avaliação ótima ou boa, segundo o Datafolha, e mantém sua competitividade como principal adversário do líder Lula (PT) nas simulações para o pleito de outubro.

O instituto calcula em ao menos 10% o núcleo popular fidelíssimo ao atual mandatário, o equivalente a 17 milhões de brasileiros. Não será surpresa se a bancada da direita populista leal a Bolsonaro no Congresso expandir-se com a eleição.

Portanto, a despeito do resultado da disputa pelo Planalto, é provável que as instituições da democracia tenham de continuar lidando nos próximos anos com forças que não se importariam em destruí-la para satisfazer ao chefe.

Coração de porco

Folha de S. Paulo

Transplante com órgãos de animais, que suscita questões éticas, merece avançar

David Bennett Sr. tornou-se, no último dia 7, a primeira pessoa a receber um coração de porco geneticamente modificado. Até este sábado (29), estava vivo —já superando os 18 dias que Louis Washkansky, o primeiro humano a receber um transplante cardíaco (de outro humano), sobreviveu em 1967.

O caso Bennett inaugura a era dos xenotransplantes, em que utilizaremos rotineiramente órgãos, tecidos e células de outras espécies?

Para os puristas, a resposta é negativa. No início do século 20, quando o fenômeno da rejeição não era bem conhecido, cirurgiões experimentaram um pouco de tudo, com resultados pífios. Mais modernamente, a substituição de válvulas humanas defeituosas por válvulas de porcos é há anos procedimento padrão da cardiologia.

Mesmo a implantação de um coração inteiro não representa exatamente um fato inédito. Em 1984, "Baby Fae", uma recém-nascida que sofria de grave anomalia congênita, sobreviveu por três semanas com um coração de babuíno.

A grande novidade na cirurgia de Bennett, nos EUA, é que o porco doador teve seu material genético manipulado para tornar o órgão mais propício ao transplante.

Nesse processo, três genes suínos foram silenciados para impedir a produção dos açúcares que deflagram a rejeição pelo sistema imune humano, seis genes humanos foram adicionados e um gene de crescimento foi alterado.

Se tudo funcionar como a empresa que "fabrica" esses porcos, a Revivicor, pretende, o principal obstáculo à massificação dos transplantes cardíacos, que é a carência de órgãos, terá sido suprimido. Incontáveis vidas serão salvas.

Intervenções como essa sempre impõem questões bioéticas. A grande questão está em se é ético utilizar outros seres vivos como repositório de órgãos para nós.

A discussão filosófica é interessante e deve-se reconhecer que os defensores dos direitos de animais são capazes de produzir argumentos respeitáveis, mas que não sobrevivem a nossas práticas.

Num planeta que sacrifica 1,5 bilhão de porcos a cada ano para alimentação, é difícil sustentar que não podemos matar mais alguns milhares com o objetivo eticamente mais relevante de salvar vidas.

Houve alguma grita com a escolha de Bennett, que cumpriu pena por ter esfaqueado uma pessoa. Essa, porém, não deve ser uma preocupação da bioética, que julga procedimentos, não indivíduos.

Lula esquece, o País lembra

O Estado de S. Paulo

O governo de Dilma Rousseff foi a gestão dos sonhos dos petistas, com a aplicação de teorias equivocadas que o PT sempre defendeu. É isso o que Lula deseja esconder

A história do PT produziu muitos fatos que jogam contra o partido e seus candidatos. Em toda eleição, há muita coisa a esconder e a tergiversar. Mas seria empequenecer a trajetória petista pensar que, na categoria de temas a serem evitados, estariam “apenas” os escândalos de corrupção do mensalão e do petrolão. Há também aparelhamento do Estado, apoio entusiasmado a ditaduras e governos que violam direitos humanos, tolerância a corporativismos e privilégios, confusão entre o público e o privado, sabotagem de políticas públicas responsáveis (apenas porque outros as propuseram), negligência com malfeitos internos do partido, campanhas de difamação contra adversários políticos, abundante difusão de desinformação e várias outras práticas que contrariam o discurso original da legenda em defesa da ética e da renovação da política.

Trata-se de um longo passivo, que não surgiu agora e não está apenas relacionado à Lava Jato. Mas há um item, em toda essa longa lista, que se sobressai. É um assunto que Luiz Inácio Lula da Silva tem especial dificuldade de lidar. O líder petista pode até falar do apartamento triplex no Guarujá ou do sítio de Atibaia – temas naturalmente desconfortáveis, que escancararam ao País o modo como o ex-sindicalista, que sempre bradou contra os patrões, lida de fato com os empreiteiros camaradas –, mas não faz ideia de como abordar este assunto: Dilma Rousseff e seu trevoso governo.

É um tema difícil, tanto pela evidência do desastre que foi o período de Dilma Rousseff no Palácio do Planalto como pela responsabilidade direta de Lula no caso. O líder petista decidiu que Dilma Rousseff seria a candidata do PT à Presidência da República em 2010. Afinal, esta é a divisão de tarefas na legenda que se diz democrática: Lula decide, os outros obedecem. Segundo palavras do próprio Lula, a relação entre os dois é de criador e criatura.

O líder petista pode não ter nenhum interesse em lembrar, mas ainda estão frescos na memória do País os resultados produzidos pela criatura lulista: recessão econômica, crise social, inflação, desemprego, desorganização da economia, manipulação de preços e irresponsabilidade fiscal, que incluiu, entre outras manobras, as famosas “pedaladas”. Tudo isso não se deu ao acaso. Foi obra do voluntarismo de Dilma Rousseff, mas foi muito mais do que simples equívoco individual. Sem nenhum exagero, o governo de Dilma foi a gestão dos sonhos dos petistas, com a aplicação – sem freios, sem limites e sem diálogo – de todas as teorias, ultrapassadas e equivocadas, que o PT sempre defendeu e, pasmem, ainda defende.

O resultado ficou evidente para o País. Tão presente nas eleições de 2018, o sentimento antipetista não foi mera consequência de decisões da Justiça Federal de Curitiba. O problema foi muito mais profundo. Com Dilma Rousseff, a população experimentou o que é um governo com o PT pondo em prática suas teses e ideias. Pouquíssima gente quer isso de volta e, por saber bem a dimensão dessa rejeição, Lula deseja de todas as formas esconder Dilma Rousseff e seu governo.

A quem queira diminuir ou relativizar a ojeriza do eleitorado com a gestão de Dilma no Palácio do Planalto, basta lembrar o resultado das eleições de 2018 para o Senado em Minas Gerais. Mesmo com toda a militância do PT dizendo que Dilma Rousseff tinha sofrido um golpe – assim os petistas qualificam atos constitucionais do Congresso, quando não lhes agradam – e com a legenda investindo muitos recursos financeiros na campanha, a ex-presidente obteve dos mineiros um humilhante quarto lugar. Portanto, Dilma é um óbvio fardo eleitoral, mesmo para um veterano prestidigitador como Lula.

Questionado nessa semana sobre o papel de Dilma em um eventual novo governo do PT, Lula não teve dó de sua criatura, atribuindo-lhe a mais cabal irrelevância. “O tempo passou. Tem muita gente nova no pedaço”, disse, em entrevista à Rádio CBN Vale. Se o tempo passou para Dilma, passou também para Lula. O País precisa de gente com outra estatura moral, que não tenha de esconder seu passado nem suas criaturas.

Moro e a imagem do Judiciário

O Estado de S. Paulo.

Ao colocar suas pretensões políticas como continuação do que realizou como magistrado, Sérgio Moro afeta a imagem de seu trabalho como juiz e da própria justiça

Sérgio Moro tem todo o direito de promover sua pré-candidatura à Presidência da República, defendendo suas ideias e propostas políticas. De fato, desde o fim do ano passado, quando se filiou ao Podemos, o ex-juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba tem percorrido o País para expor suas pretensões políticas e intensificado sua participação nas redes sociais.

Goste-se ou não daquele que foi o grande protagonista da Lava Jato, é assim que se faz uma democracia: partidos e pessoas apresentam à população suas propostas, na expectativa de convencer e entusiasmar os eleitores. Dessa forma, a princípio, não há nada de condenável na atual atuação política de Sérgio Moro. É, antes, motivo de elogio, assim como o é o trabalho de todas as outras pré-candidaturas. O regime democrático apoia-se no exercício dos direitos políticos, com cidadãos promovendo livremente suas ideias e pretensões políticas.

Há, no entanto, uma ressalva. Desde que lançou sua pré-candidatura, Sérgio Moro tem colocado suas pretensões políticas como uma continuação do trabalho que realizou como magistrado, em especial durante a Operação Lava Jato. E, ao dar esse específico enquadramento à sua atividade jurisdicional, o ex-juiz coloca em risco não apenas a reputação de seu trabalho na 13.ª Vara Federal de Curitiba, mas a imagem da própria Justiça.

Aparentemente pequenos, os detalhes são importantes. Uma coisa é alguém prometer que exercerá uma eventual função política futura com o mesmo espírito de serviço ao País com que teria desempenhado suas funções na magistratura. Outra coisa bem diferente é afirmar que, da mesma forma como combatia a corrupção e os corruptos como magistrado, continuará combatendo essas práticas e essas pessoas por meio da política. O problema do segundo caso não é a promessa futura, e sim a declaração sobre o trabalho como juiz.

Não é papel da Justiça “combater” a corrupção ou qualquer outro crime. Cabe ao juiz aplicar a lei no caso concreto, o que conduz a uma perspectiva muito diferente. Se o magistrado, após todo o percurso processual, entender que existem elementos suficientes para demonstrar a materialidade e a autoria de um crime, deve punir os autores do crime, com o rigor da lei. Mas isso não significa que o juiz combata o crime, da mesma forma que, se absolver um réu por falta de provas, ele não está sendo conivente com a criminalidade.

A Justiça Criminal não é um sistema com juiz e promotoria de um lado e bandidos de outro. Se fosse assim, não seria preciso sequer sistema de justiça, podendo ser aplicada imediatamente a pena. No início do processo, não se sabe se os réus são culpados ou mesmo se existiu o alegado crime. Existe um processo criminal com a presença de um juiz isento e equidistante em relação às partes precisamente para que se possa avaliar objetivamente se houve crime e se os réus são culpados.

A Justiça deve ser e parecer imparcial. A imagem de isenção do Judiciário é fundamental para que suas decisões sejam acolhidas e respeitadas pela população. Só assim as sentenças serão capazes de pacificar os conflitos sociais, em vez de agravá-los. Por isso, magistrados e ex-magistrados não devem suscitar suspeitas sobre sua imparcialidade. Isso não é nenhum rigorismo, e sim cuidado com o Estado Democrático de Direito.

No caso, há ainda uma agravante. Sérgio Moro tem dado a entender que, em sua atividade jurisdicional, não apenas enfrentava a corrupção, mas combatia a defesa dos acusados. Chama-os de “advogados pela impunidade”. Ao revelar essa dimensão de conflito – própria da política – na relação entre juiz e parte, vislumbra-se um enviesamento ainda mais forte da compreensão de Moro sobre a função judicante.

Como qualquer cidadão, um político pode defender livremente suas ideias. Uma coisa é certa, no entanto: um magistrado que decide ir para a política muda necessariamente de função. Ao dizer que continuará fazendo o que fazia na Justiça, deprecia a Justiça e seu trabalho como juiz. A Operação Lava Jato merece mais cuidado.

 

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