Folha de S. Paulo
Há mais de 11,5 milhões de jovens nessa
condição no Brasil, e a maioria é negra
Na porta de um supermercado do Plano Piloto, área nobre de Brasília, uma adolescente e um menino pedem itens da cesta básica a quem ingressa no local. "Pode comprar um litro de óleo para me dar, tia?", pergunta ela ao me ver passar. Apressada e constrangida, entro no comércio. Na saída, entrego o mantimento e pergunto a idade da dupla. Ela tem 15, ele, 9 anos. São irmãos. Ambos deixaram de frequentar a escola durante a pandemia e têm se dedicado a ajudar a levar comida para dentro de casa.
A cena é tão cruel quanto corriqueira num
país em que a inflação dos alimentos já consome quase 40% da receita
dos mais pobres. E se ocorre na terceira capital mais rica da nação,
não é de surpreender que as regiões Norte e Nordeste, tradicionalmente mais
carentes de oportunidades, sejam recordistas em concentração de jovens de 15 a
29 anos que não estudam e não trabalham – os friamente chamados
"nem-nem". E, claro, entre eles a maioria é negra.
Pensando nos irmãos da porta do mercado e
nas reflexões de um grupo de acadêmicos sobre indicadores sociais brasileiros,
me dei conta do grau de perversidade e de injustiça embutidos na expressão
"nem-nem". Em caso de adoção de uma alcunha para esses brasileiros,
talvez a correta fosse "sem-sem", de sem trabalho decente e sem
oportunidade de mudar de vida.
São mais de 11,5 milhões de jovens nessa
condição no Brasil. O que não significa estar à toa. Ao contrário. É gente que
vai à luta como pode e se vira com os recursos de que dispõe para sobreviver.
Quem não está no "metaverso" é capaz de enxergar.
Será que algum dia poderemos contar com
políticas públicas efetivas de geração de emprego e renda alinhadas com ações
de combate à evasão escolar e de incentivo à educação de qualidade no Brasil?
Talvez aí o país deixe de ter 2,4
milhões de crianças sem saber ler e escrever ao final das séries
iniciais do ensino fundamental e os jovens possam ter esperança de um futuro
melhor.
Tem gente que nem trabalha nem estuda porque não gostam mesmo,convenhamos.
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