O Globo
Enquanto Lula anuncia que se for eleito quer rever as reformas tributária e trabalhista, gente do PT opera sobre bases mais realistas e elenca medidas infralegais tomadas pelo governo Bolsonaro e para as quais basta uma canetada do presidente ou do ministro da área para serem revogadas. Para mexer na Previdência ou nas leis trabalhistas, Lula vai precisar do Congresso. Este que está aí, já disse presidente da Câmara, Arthur Lira, é de centro e não quer rever nada. Mesmo que o Congresso eleito em outubro se mova para a centro-esquerda, mudanças legais tomam tempo e exigem dedicação política. Mexer em decretos, portarias e pareceres não custa nada, nem tempo.
São muitas as medidas
que os petistas consideram antidemocráticas, retrógradas ou simplesmente
absurdas. Elas estão sendo listadas por simpatizantes do partido espalhados em
ministérios, autarquias e empresas públicas. O que se quer é promover um
“revogazo” logo depois da posse do presidente e de seus ministros, caso Lula
seja eleito, obviamente. Se for possível e não atrapalhar o cerimonial, o
evento tomaria mais alguns minutos para a assinatura dos atos revogatórios. A
ideia é não permitir que decretos como os que afrouxam restrições para compra e
posse de armas e munições permaneçam em vigor um único dia do novo governo.
As revogações vão desde
decretos de natureza ambiental até portarias sobre direitos humanos. Da boiada
que Ricardo Salles passou enquanto era ministro, constam alterações na
indicação de membros do Conama, redução de multas a agressores ambientais e
permissões de exploração mineral em áreas de preservação ou indígenas.
Bolsonaro também alterou por decreto a lei dos agrotóxicos permitindo que até
pesticida que causa câncer seja comercializado no país. O decreto também muda
procedimentos que afrouxam a fiscalização do emprego de agrotóxicos na lavoura
brasileira. A recomendação é revogar os atos de Salles e o documento dos
agrotóxicos, além de retirar da pauta do Congresso o PL do Veneno, que institui
o “liberou geral” nos pesticidas.
Departamentos extintos em
ministérios, como o de HIV/Aids da Saúde, devem ser reinstalados no mesmo
pacote de primeiro dia de governo por se entender que seu fechamento foi
determinado em razão da homofobia governamental, da mesma forma que a população
LGBTQIA+ foi retirada das políticas de Direitos Humanos por Damares Alves com a
extinção do comitê específico. Que seria recriado.
Ainda na área de Damares,
um grupo de trabalho foi instaurado para rever toda a política de direitos
humanos e criar uma nova, apelidada de PNDH3. O grupo é formado apenas por
representantes governamentais, sem a participação de representantes da
sociedade civil. Uma denúncia contra a medida foi enviada ao Alto Comissariado
das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Caso Lula seja eleito, o grupo do
PNDH 3 será extinto.
O governo Bolsonaro
restringiu por decreto a Lei de Acesso à Informação, autorizando que alguns
documentos públicos tenham sigilo eterno. O decreto foi cancelado por ordem do
Supremo Tribunal Federal, e uma Medida Provisória baixada pelo governo acabou
caducando sem votação. Mesmo assim, pareceres que embasaram o decreto continuam
sendo usados com a mesma finalidade. Neste caso não há revogação a ser feita.
E, embora o PT não tenha lá tanto apreço pela transparência, dificilmente estes
pareceres serão usados por Lula para restringir o acesso a documentos oficiais.
O “revogazo” petista é
diferente do “revogaço” do governo atual. O de Lula tem caráter ideológico. O
de Bolsonaro, que já somam 4.154 decretos, alcançou apenas instrumentos
normativos em desuso ou caducos. De qualquer modo, as revogações de Bolsonaro
também serão revistas por um eventual governo petista. Programas como o Minha
Casa, Minha Vida, estabelecidos por decreto, foram revogados e substituídos por
outros que não funcionam por desinteresse ou pouco caso governamental. Eles
serão restabelecidos no caso de Lula ser eleito.
Justiça militar
O julgamento do traficante de cocaína
Manoel da Silva Rodrigues, preso na Espanha com 37 quilos de pasta base, prova
mais uma vez como é desnecessária a justiça militar. O fato dele ser sargento
da Aeronáutica e ter transportado a droga num avião militar (o da comitiva
presidencial) não mudou em nada o seu destino, mas poderia ter mudado. Pelo
Código Penal Militar, ele deveria ser condenado de um a cinco anos de prisão.
Pela Lei de Drogas, a punição seria de cinco a 15 anos. O presidente da sessão
de julgamento ignorou o Código e sugeriu uma pena de 14 anos, corroborada pelo coronel e pelos três capitães que
compunham a corte. Em tempos de paz, a justiça militar deveria ser mínima,
apenas para atender problemas da caserna. Por crimes cometidos fora do âmbito
militar, melhor deixar que os códigos civis resolvam.
Militares e urnas
O melhor lugar para estacionar tropas é bem
distante de urnas eleitorais. Não faz qualquer sentido associar as Forças
Armadas ao processo eleitoral. O TSE errou ao incluir no ano passado o
Ministério da Defesa na Comissão de Transparência das Eleições. Por essa razão,
as arguições do seu representante causaram estresse agora, com Bolsonaro
dizendo que haviam sido identificadas “vulnerabilidades” no sistema. Equivocado
também foi o convite ao general Fernando Azevedo e Silva para assumir a
direção-geral do tribunal. Parece que se queria buscar a simpatia das Forças
Armadas. Simpatia
desnecessária. O que se quer dos militares é o cumprimento das
suas missões constitucionais, não sua simpatia.
Utilidade militar
Enfim uma situação em que as Forças Armadas
puderam provar sua utilidade, sendo empregadas com eficiência e prestando serviço relevante para
a comunidade. A tragédia de Petrópolis mobilizou Exército, Marinha e
Aeronáutica que enviaram mais de 900 homens além de máquinas, equipamentos e
veículos para o trabalho de resgate de vítimas e recuperação da cidade.
Roendo o osso
Além do garçom do palácio, que só lhe
oferece café frio, o deputado Arthur Lira já o trata de você. Lira usa a segunda pessoa do singular e
sua força política para dar orientações ao presidente. Numa entrevista ao
Valor, o deputado disse que Paulo Guedes deveria se submeter hierarquicamente a
Ciro Nogueira. Ato contínuo, Bolsonaro deu ao ministro da Casa Civil poder para
mediar impasses entre pastas. Mesmo dando as cartas, o Centrão já sinalizou que
tranquilamente abrirá mão de Bolsonaro quando a hora chegar. Enquanto isso, vai
ficando no poder, fazendo política, distribuindo verbas, roendo o osso.
A Bahia aceita
Lula articula muito bem os entendimentos ao
centro de maneira a expandir seu eleitorado. Por isso, faz todo sentido o
movimento que alija o senador Jaques Wagner (PT) da disputa pelo governo da
Bahia em favor do senador Otto Alencar (PSD). Mas, não custa lembrar, esse tipo
de entendimento só acontece fora de São Paulo. Na Bahia, tudo bem, em Minas,
nenhum problema, no Rio, que calem a boca. Mas em São Paulo, não mexam em São Paulo que
o PT vira bicho.
Desmata-me de rir
O ex-ministro da Madeira e do Garimpo,
Ricardo Salles, arrancou gargalhadas, mesmo entre os bolsonaristas mais convictos,
quando disse que o presidente do Brasil evitou a terceira guerra mundial ao
demover Putin de invadir a Ucrânia. Mas ainda pior foi Bolsonaro dizer que por
“coincidência ou não” sua presença na Rússia apaziguou os ânimos. Logo em
seguida os ânimos pioraram. Coincidência.
Boca torta
Ontem, em Petrópolis, depois de servir
de mestre de cerimônias nas
falas das autoridades, chegada a hora da entrevista, Bolsonaro provou mais uma
vez que o uso do cachimbo deixa mesmo a boca torta. “Quem vai conduzir a
imprensa?”, perguntou.
Orgulho
Na entrevista de Petrópolis, ao ser
perguntado sobre seu encontro com Vladimir Putin, o presidente mostrou todo o
seu orgulho e sua alegria ao informar que passou duas horas a um metro e meio do líder russo,
destacando que houve até alguns momentos de grande descontração.
Mortes em Paris
Segundo levantamento da Prefeitura de
Paris, 2,6 mil pessoas vivem nas ruas da capital francesa. Muitos são
recolhidos à noite e levados a abrigos aquecidos. Outros tantos não atendem a
demanda dos funcionários, alguns se escondem. Dez já morreram de frio desde o
início do inverno em todo o país, dois em Paris. No Brasil, dezenas de milhares perambulam pelas ruas das
cidades sem ter para onde ir. Não morrem de frio, mas de fome.
Fake snow
Além de gerar uma sensação de paz em razão das montanhas e dos horizontes brancos de neve, o cenário dos jogos de inverno costuma ser de uma beleza indescritível. Não em Pequim. Algumas das arenas foram construídas dentro da cidade, cercada por prédios feios, galpões e containers. Uma delas, a que abrigou a modalidade Big Air Skiing, que consiste numa descida de prancha com salto em alta velocidade, foi instalada ao lado de uma siderúrgica abandonada que mais se parece com uma velha usina nuclear. E, claro, apesar de ser inverno em Pequim, a neve das rampas e pistas urbanas é falsa.
Me perdi com tantos assuntos.
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