quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Raphael Di Cunto: Congresso convicto da vitória de Lula

Valor Econômico

Desonerar gasolina é a mais nova solução mágica (e errada)

Políticos de diferentes matizes, da esquerda à direita, voltaram para o Congresso do recesso em suas bases eleitorais convencidos de que o ex-presidente Lula (PT) vencerá a eleição em outubro. O sentimento é de que o “timing” para construção de uma terceira via já passou e que há hoje uma forte aversão dos eleitores ao presidente Jair Bolsonaro (PL), seja pela condução desastrosa da pandemia, seja pela inflação alta, seja pela economia parada.

Um deputado do Centrão que pretende ingressar no PL para colar na imagem de Bolsonaro na campanha, principalmente por questões locais, diz que o presidente tem força no interior, mas está muito desgastado nas grandes cidades. A população está cansada do discurso beligerante, irritou-se com a negação das vacinas e vê seu dinheiro minguar com as seguidas altas de alimentos, moradia e combustíveis. Para nenhum desses casos, afirma, parece haver solução próxima.

É daí que surgem ideias “brilhantes”, como gastar mais no ano eleitoral com a desoneração de combustíveis do que com investimentos que poderiam de fato melhorar a qualidade de vida das pessoas, como construir ferrovias, linhas de metrô e de ônibus para diminuir a dependência da população por carros, para ficar em exemplos óbvios. Muito mais inteligente é outra ideia, também vinda do governo, de cortar o IPI para ajudar a indústria (embora menos prestigiada na ala política por render menos na eleição).

Além de ir na direção errada, os R$ 54 bilhões para a gasolina e diesel terão impacto pequeno para o consumidor perto da instabilidade que a política econômica equivocada pode gerar (o dólar subiu de R$ 5,25 para R$ 5,67 na discussão da PEC dos Precatórios, puxando junto a inflação). A moeda deu uma trégua neste início de ano por questões externas e internas, mas um cenário político turbulento pode rapidamente virar isso.

Se a PEC for aprovada e o governo cortar os impostos federais todos, a gasolina cairia R$ 0,69 por litro e o diesel, R$ 0,35. A política de preços da Petrobras, a alta do petróleo no mundo, o real desvalorizado e o modelo de ICMS, porém, fizeram a gasolina sair de um preço médio de R$ 4,57 em 1º de janeiro de 2020, antes da pandemia, para R$ 6,67 em dezembro do ano passado (os dados são da Agência Nacional de Petróleo). O problema, portanto, não são R$ 0,70.

Para o gás de cozinha, hoje acima dos R$ 100, o efeito seria inexistente porque o corte de impostos federais já ocorreu e descontou só R$ 2,18 por botijão, um nada. A PEC também teria efeito pequeno sobre os alimentos, cada vez mais caros enquanto os salários são achatados pela inflação.

Embora possa dar um alívio momentâneo ao bolso do cidadão, o que sempre traz um fator positivo ao governante de plantão, essa PEC pode acabar tendo o mesmo efeito político do Auxílio Brasil de R$ 400. Entre aliados do presidente, já está claro que mudar o Bolsa Família de nome e turbinar os valores não o fez conquistar o eleitorado mais pobre.

Esta coluna conversou com uma dezena de congressistas que fazem campanha por outros presidenciáveis, mas que, reservadamente, dizem que voltaram do roteiro mais intenso de viagens a seus Estados convencidos de que será difícil tirar a vitória do petista. Na avaliação deles, as posturas negacionistas do presidente funcionaram bem para fidelizar seu eleitorado na pandemia e evitar o crescimento de outros candidatos à direita, mas o discurso antivacina causou estrago irreparável ao centro.

Um deputado do PSB que não queria apoiar Lula, mas viu seu candidato preferido desistir, se diz incrédulo com a força do petista. Parcela significativa dos eleitores que votaram em Bolsonaro agora declara abertamente voto em Lula, mesmo que isso, do ponto de vista de pautas e agendas defendidas, não faça o menor sentido. Para ele, é como se a vontade das pessoas de “expiar seus crimes” por ter eleito o atual presidente seja tão grande que eles apoiam qualquer um que possa impedir seu segundo mandato, ignorando o que os fez rejeitar o PT em 2018: os casos de corrupção e a crise econômica do governo Dilma.

Se a troca de ideias dos políticos com seus eleitores durante um cafezinho já aponta um favoritismo para o petista, as pesquisas, não é novidade para ninguém, têm reforçado isso. O agregador do site “Jota”, que reúne dados de vários institutos, mostra Lula com 44% das intenções de voto, contra 28% de Bolsonaro, 10% de Sergio Moro (Podemos), 7% de Ciro Gomes (PDT) e 3% de João Doria (PSDB).

A média das pesquisas espontâneas, feita também pelo “Jota”, aponta Lula com 31,9% e Bolsonaro, 22,8%. Moro (3,1%), Ciro (2,7%) e Doria (0,7%) ficam num patamar bem mais baixo. Esse tipo de sondagem mostra a preferência do eleitor antes que o entrevistador diga quem são os candidatos e, hoje, diz quem está mais convicto de seu voto.

Pesquisas internas dos partidos mostram que Lula estaria vencendo até em Estados do Centro-Oeste, como Mato Grosso do Sul e Goiás, e em cidades como São Caetano (SP), município de altíssima renda e com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil. Ambos foram, nas eleições passadas, tradicionais redutos “azuis”.

Há quem pregue cautela até o fim da janela de filiações em 2 de abril ou das convenções partidárias em 5 de agosto. Mas, para um apoiador de Simone Tebet (MDB-MS), a maior chance da terceira via era Moro, que cresceu e já refluiu logo após os primeiros ataques pela dificuldade de conquistar o eleitorado fiel ao presidente. Já Doria é rejeitado a esquerda e a direita, enquanto Ciro ficou sem espaço também dos dois lados. Os demais, com menor rejeição, têm o crescimento barrado pelo “nanismo”.

Claro, a eleição está longe, faltam oito meses para a campanha de fato começar e há sempre o imponderável (não custa lembrar que as duas eleições anteriores foram marcadas pela queda de um avião e uma facada). Se, contudo, o grande incidente dessa eleição for de novo só uma bolinha de papel, não dá para desprezar que a disputa entre lulistas e bolsonaristas já está na rua e nas redes, dado o nível que polarização que pauta das reuniões em família até o Big Brother Brasil (BBB), e que o petista é franco favorito.

 

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