sexta-feira, 18 de março de 2022

César Felício: TSE pode mudar plano dos grandes partidos

Valor Econômico

Parlamentares temem que teto de gastos com campanha por deputado varie só de acordo com inflação acumulada desde 2018

A polêmica sobre a quantidade de dinheiro público que será gasta pelos candidatos nas eleições deste ano ainda não terminou.

Cresce nos corredores do Congresso a sensação de que uma surpresa poderá vir do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até o fim de maio. O rumor é de que a resolução a ser baixada pela Justiça determinando o teto de gastos para as candidaturas proporcionais não terá crescimento similar à quase triplicação que foi feita do fundo eleitoral, de R$ 1,7 bilhão para R$ 4,9 bilhões, em meio a uma enorme resistência da sociedade, dado o despropósito evidente de um aumento dessa magnitude.

O diabo mora nos detalhes e a providência divina também. Coube ao Legislativo determinar o valor do fundo eleitoral deste ano. A verba para a eleição portanto cresceu e muito. Mas cabe ao Judiciário, desde 2018, determinar o teto de gastos por cargo. Ou seja, não há garantia de que a despesa permitida seguirá a mesma proporção.

A informação com que parlamentares trabalham é que o cálculo de gastos será feito apenas com a correção pela inflação da inflação acumulada desde 2018. Isto significa que cada candidato a deputado teria direito a gastar R$ 3,2 milhões, em valores de hoje, uma vez que foi de 24,8% a inflação acumulada pelo IPCA desde junho de 2018, data da última resolução do TSE fixando os gastos por campanha, Como a inflação está em alta, este valor deve subir um pouco mais nos próximos meses, mas não escapará muito disso.

É um montante consideravelmente menor do que a expectativa dos parlamentares. Esta brecha existe porque, ao votar o pacote das novas regras para a eleição de 2022, o Congresso não retirou do Judiciário a prerrogativa de determinar o teto de gastos para cada um.

“O Congresso dormiu no ponto. E não dá para fazer mais nada. As regras eleitorais não podem ser mudadas doze meses antes do pleito”, comenta o deputado federal Danilo Forte (CE), que acaba de sair do PSDB para entrar no União Brasil.

Se Forte estiver certo e o TSE realmente fixar a variação de gastos das candidaturas proporcionais apenas pela correção da inflação, haveria até a possibilidade dos partidos serem obrigados a devolverem recursos para o Tesouro. ”Diferentemente do que ocorre com o fundo partidário, o fundo eleitoral não pertence ao partido como patrimônio. Se sobrar dinheiro do fundo, é preciso devolver o resíduo”, explicou o advogado eleitoral Ricardo Penteado.

Caso o TSE faça uma correção do teto de gasto para a eleição proporcional apenas pela diferença da inflação, o jogo das eleições deste ano muda um pouco. Para os grandes partidos, donos de um fundo eleitoral maior, cai por terra, a estratégia de limar as chapas a presidente, governador e senador para favorecer as candidaturas proporcionais.De nada adianta montar gigantescas nominatas para a eleição da Câmara, sobretudo nos estados menores, com o voto muito regionalizado “É Por isso que nas últimas semanas aumentou a tendência dos partidos lançarem candidatos majoritários, mesmo sem chances. É preciso encontrar formas de gastar esse dinheiro”, acredita Forte.

Esta preocupação pode justificar recentes movimentos do PSD, do MDB e do União Brasil. No caso das legendas com fundo eleitoral mais modesto, há uma tendência de se deixar o candidato majoritário a pão e laranja para favorecer a nominata para deputado.

Segundo o professor de Direito Eleitoral Diogo Rais, da Universidade Mackenzie, a judicialização do tema pode estar a caminho. “O TSE pode determinar os gastos da forma que quiser, mas se as candidaturas majoritárias tiverem proporcionalmente mais recursos cabe recurso dentro do Judiciário invocando o principio da equidade, da manutenção da simetria”, opina. Assim pensa também Penteado. “ O tribunal não pode estabelecer um limite de gastos que induza á devolução. Não se pode neutralizar um comando legal por meio de resolução. Se isso fica demonstrado, cabe um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal”, disse.

Arthur do Val

Quis o destino que o escândalo que atingiu o deputado estadual paulista Arthur do Val, aliás “Mamãe Falei”, ocorresse durante a janela partidária de filiações. Talvez tenha se aberto desta maneira a porta pra uma possibilidade que a princípio era descartada: a de que ele salve seu mandato.

Mamãe Falei, lacrador da Internet que é, não tem a cultura da política, não estabeleceu relações cordatas com seus pares e tinha tudo para sofrer uma cassação sumária. Tendo ele viajado ao Leste Europeu em autoproclamada missão humanitária, não é pouca coisa ser flagrado em um áudio dizendo que as mulheres ucranianas são fáceis porque são pobres, sobretudo em uma fila de refugiados em meio a uma guerra.

Ainda assim os sinais crescem de que uma solução política que permita a sua sobrevivência está surgindo. Em primeiro lugar, ele manteve o respaldo do movimento que integra, o MBL. Segundo ponto: o presidente da Assembleia, Carlão Pignatari, designou um relator para o caso, Delegado Olin, da sua mais absoluta confiança. Terceiro: o MBL anunciou sua saída do anêmico Podemos, ainda que mantendo apoio a Sérgio Moro.

O próximo passo que, sendo concretizado, dá a senha do desfecho da história, é o destino político do MBL. Caso desague no União Brasil, como se especula, o MBL pode agregar à sigla um latifúndio de votos na eleição que interessa, que é a da Câmara dos Deputados. Em troca, ganha-se a simpatia de uma das principais siglas da base governista na Assembleia Legislativa para uma punição mais branda ao deputado do que seria uma cassação. Talvez uma suspensão temporária do mandato. Esse movimento precisa acontecer ainda este mês.

O voto pela cassação é aberto. Isto significaria um constrangimento em se votar no plenário por uma solução salvadora para Mamãe Falei. Aí é que entra o relator. Se ele estabelecer uma pena alternativa à cassação e seu relatório for aprovado na Comissão, é isso que chegará ao plenário: ou a punição mais branda, ou simplesmente nada. E a maioria dos deputados estaduais poderá salvar o colega a custo político baixo.

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