quarta-feira, 20 de abril de 2022

Fernando Exman: Semanas críticas para o destino do PSDB

Valor Econômico

Disputa interna atrasa formação de palanque de Doria em Minas

Paulista, Franco Montoro costumava agradecer à representação de Minas Gerais pela sugestão, apresentada nas reuniões preparatórias para a formação do PSDB, de adoção do tucano como símbolo do partido que seria criado em 1988.

O primeiro presidente da legenda elencava três motivos para justificar a escolha: a cor amarela lembrava a campanha pelas Diretas, a ave era símbolo do movimento ecológico e, por fim, o pássaro tinha grande conexão com a própria imagem da nação. No decorrer dos anos, contudo, nem sempre o PSDB foi um habitat onde tucanos paulistas e mineiros conseguiram coexistir em completa harmonia.

Hoje não é diferente. O partido enfrenta grave crise e, dependendo do desfecho do atual processo público de autoflagelo, talvez seja necessário recalcular seu peso no jogo político. O PSDB tem poucas semanas para decidir se mantém um projeto próprio na disputa pelo Palácio do Planalto ou se aceita compor com partidos aliados, inclusive cedendo a cabeça de chapa.

A sigla coleciona desgastes. Na janela partidária, por exemplo, entre adesões e desfiliações, a bancada na Câmara diminuiu: começou a legislatura com 29 deputados e atualmente tem 23 integrantes exercendo o mandato. Ela precisa crescer para manter o partido minimamente forte durante os próximos anos.

Mas talvez o episódio recente mais ruidoso tenha sido a substituição da coordenação da pré-campanha de João Doria à Presidência.

Em reação ao que considerava uma falta de respaldo público à sua candidatura, o ex-governador de São Paulo retirou da função o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, e colocou um aliado próximo, Marco Vinholi. Não demorou para Araújo responder nas redes sociais com uma mensagem cifrada: “Ufa! Comando que nunca fiz questão de exercer. Aliás, ele sabe as circunstâncias em que e o porque ‘aceitei’ à época. Aliás, objetivo cumprido!”

Segundo relatos, tratou-se de uma referência à sua decisão de assumir a coordenação da pré-campanha tucana para assegurar que Doria de fato renunciasse ao governo de São Paulo e deixasse o cargo para o então vice, Rodrigo Garcia. Isso porque, na visão de integrantes da cúpula da legenda, a eventual permanência de Doria à frente do Palácio dos Bandeirantes fragilizaria a estratégia do PSDB de garantir a Garcia mais força para tentar a reeleição.

Araújo assumiu a coordenação da campanha em janeiro. Integrantes da cúpula tucana já vinham captando sinais de que Doria poderia fazer um movimento às vésperas do prazo de desincompatibilização para forçar a convergência das mais diversas alas do partido em torno da sua candidatura, a qual, embora legitimamente conquistada nas prévias realizadas no ano passado, nunca deixou de ser questionada pelos derrotados. Com seus problemas tecnológicos, aliás, as próprias prévias foram um vexame.

Nos bastidores, a substituição de Araújo ainda rende. “Demitiu o dono do cofre”, comentou uma fonte. “Será que ele pensa em se financiar?”, provocou.

Diz esse interlocutor que o rompimento pode facilitar o caminho daqueles no PSDB que querem compor com os demais partidos dedicados a construir uma única chapa da terceira via. Ou então deixar mais recursos do fundo eleitoral para os candidatos a deputado federal, estratégia defendida por quem argumenta que a sobrevivência de qualquer partido depende do fortalecimento da bancada na Câmara.

Para o grupo de Doria, porém, isso não passa de bravata. Em primeiro lugar, porque a definição de como são utilizados os recursos da sigla não é competência exclusiva do presidente. E acrescentam: o tesoureiro, Cesar Gontijo, é aliado. Recentemente, ele divulgou nota afirmando que o resultado das prévias é soberano.

Doria se fia em dois artigos do estatuto do PSDB para se manter na disputa. Um deles estabelece que cabe à convenção nacional do partido apenas proclamar o candidato a presidente, quando tiver ocorrido eleição prévia. Em outro trecho, o documento é explícito ao dizer que os candidatos vencedores em eleições prévias terão seus nomes homologados nas convenções. Algo automático.

Aliados do paulista têm convicção que as recentes pesquisas de intenção de voto, nas quais Doria fica abaixo dos 5%, não refletem a situação em que o pré-candidato chegará à disputa. Reconhece-se que a imagem pessoal dele se desgastou, apesar da avaliação positiva que sua atuação na pandemia possa ter por causa da vacina e das entregas feitas durante sua passagem pelo governo de São Paulo. Não é a primeira vez que tentam prejudicá-lo em disputas internas, argumentam.

De fato, sua rejeição caiu quatro pontos percentuais na última pesquisa Datafolha, para 30%, em relação ao levantamento feito em dezembro. E é menor que a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do presidente Jair Bolsonaro (PL) - 37% e 55%, respectivamente.

Em seu entorno, acredita-se que a rejeição de Doria é mais fácil de ser reduzida do que a dos adversários. Isso se daria combatendo a imagem de que é “marqueteiro”, enquanto Lula teria que responder a questionamentos sobre corrupção e Bolsonaro lidar com acusações de que é negacionista.

Aposta-se, também, que no fim das contas o eleitor buscará alguém que tenha capacidade de resolver os problemas do país. Não um “salvador da pátria”.

Mas isso não tem impedido a intensa movimentação do ex-governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite, que foi derrotado nas prévias. Ladeado pelo deputado Aécio Neves, principal referência do partido em Minas Gerais, Leite mantém o diálogo com lideranças de outros partidos e a esperança de recolocar-se na disputa.

Não há sinal de armistício. É possível dizer, contudo, que toda essa situação já impõe uma dificuldade relevante a Doria: formar um palanque forte em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do Brasil. Sua vida também não anda fácil no Rio Grande do Sul, outro Estado estratégico.

Nenhum comentário:

Postar um comentário