Folha de S. Paulo
Partido deverá ser linha auxiliar de
aliados e focar na disputa em SP neste ano
A
implosão da candidatura do ex-governador João Doria (SP) encerra uma
era no PSDB, que assistirá agora a uma luta entre seus caciques remanescentes
pelo espólio daquele que já foi o partido mais importante do país.
A
natureza do embate será central para o futuro da sigla, que nesta eleição
tenderá a ver seu papel federal reduzido ao de linha auxiliar de aliados. Se
quiser sobreviver, terá de apostar todas as fichas na manutenção de sua
fortaleza paulista, que comanda desde 1995 —incluindo dois breves interregnos
com vices aliados que assumiram o governo.
Símbolo do estado das coisas é o fato que essa disputa será tocada por Rodrigo Garcia, que construiu toda sua carreira no DEM, antigo PFL, e só entrou no tucanato dentro de um esquema de conveniência após o seu partido entrar em colapso no começo do ano passado.
O
atual governador paulista tem uma árdua tarefa pela frente, precisando
desbancar Márcio França (PSB) e Tarcísio de Freitas (Republicanos) para buscar
a disputa do segundo turno com Fernando Haddad (PT), a seguir o desenho
político atual. Não será fácil, apesar de algumas vantagens competitivas de
quem tem a caneta e é desconhecido, logo pouco rejeitado.
Na equação do governador há a parceria
entre Palácio dos Bandeirantes e a Prefeitura de São Paulo, que Ricardo Nunes
(MDB) herdou do falecido Bruno Covas (PSDB), e a proximidade com o União
Brasil, megapartido que uniu o seu DEM de origem e o PSL.
Para o entorno de Rodrigo, a candidatura
ideal a ser apoiada pelo PSDB é a da senadora Simone Tebet (MDB-MS). O presidente
tucano, Bruno Araújo, só faltou anunciar a
adesão a ela em entrevista após o pronunciamento de Doria.
Ela não traria para a sua campanha nenhum
resquício da rejeição associada a Doria, que dispensou mesuras a Rodrigo na sua
fala derradeira que não refletem o que seus aliados falam do ex-vice. O clima
entre ambos nunca foi o
mesmo após a ameaça do então governador de permanecer na cadeira quando
percebeu que sua pretensão presidencial estava longe de ser garantida.
Contra essa aliança entre Rodrigo e Araújo
concorrem outros grupos tucanos. A velha guarda do partido até admite o apoio a
Tebet, contando discretamente com que ao fim o MDB não lhe conceda a legenda.
Algo semelhante se vê no grupo parlamentar associado ao deputado Aécio Neves
(MG), adversário
de Doria que passou
a defender uma candidatura própria, ainda que inócua.
No fundo, o que
está em jogo é o controle do partido, que encerra uma era aqui. O PSDB, que
governou o Brasil de 1995 a 2002 e concentra uma grande quantidade de
formuladores econômicos e de políticas públicas em sua órbita, ainda tem peso
relativo. Comanda a quarta maior fatia do Fundo Eleitoral, R$ 380 milhões,
elegeu o quarto maior rol de prefeitos em 2020. Já no Congresso, encolheu, hoje
tendo apenas 22 deputados.
A decadência de sua influência política já
havia ficado evidente quando Geraldo Alckmin amealhou 4,76% dos votos numa
eleição presidencial que pedia uma candidatura com o perfil de Doria, em 2018.
Coube ao tucano eleito governador paulista naquele ano carregar a bandeira do
partido.
Não foi um processo bem-sucedido
pelos erros
e o voluntarismo de Doria,
associados à resistência que ele sempre recebeu na sigla e de aliados. Apesar
de filiado há anos, ele nunca foi visto, nem quis ser, um quadro partidário.
Após emergir na esteira do antipetismo de 2016, flertou com o bolsonarismo em
2018 só
para virar o maior antípoda estadual do presidente.
É discutível se uma atitude mais política
teria gerado um resultado diferente. O argumento central de aliados e adversários
reside, contudo, nisso, já que tecnicamente Doria tinha a faca de um governo
considerado eficaz e o
queijo da vacina na mão para apresentar ao país. De fenômeno eleitoral a
patinho feio, o arco narrativo do tucano ainda será objeto de muito estudo.
Sua
desistência ocorreu ao longo do fim de semana, quando ficou claro que a
Executiva Nacional do PSDB iria defenestrá-lo de forma menos digna caso ele
insistisse na postulação. Alguns aliados defendiam a judicialização do caso,
com o argumento de que as prévias tucanas vencidas pelo paulista seriam
soberanas, mas a avaliação foi de que o desgaste seria grande e inútil.
Doria
chegou a anunciar a hipótese por
meio de uma carta do advogado Arthur Rollo. Ele esperava o apoio do
PSDB paulista e de Rodrigo, mas o próprio governador disse ao ex-chefe no dia
seguinte à divulgação do documento que o gesto havia feito a Executiva fechar
questão contra a candidatura.
Com
isso e com o encaminhamento de Tebet como o nome preferido por Araújo, na
quarta passada (18), foi apenas uma questão de maturação do anúncio da
desistência. Rodrigo e o dirigente tucano são nomes proscritos por ora nos
círculos ainda fiéis a Doria.
Se o futuro do PSDB é o de disputa, o de
Doria é uma incógnita. Houve quem falasse numa candidatura ao Senado, embora a
praia legislativa não seja a dele, além de que a ideia seria bombardeada
imediatamente pelo entorno de Rodrigo. Outros citam a hipótese de volta ao
páreo em 2026, quando o tucano fará 68 anos.
João Doria vivia a contradição de ser a
face pública de um tucanato que nunca o apoiou de forma consensual. Conhecido
pela obstinação,
concedeu a pior derrota de sua carreira nesta segunda (23), mas já disse que
segue no partido e na vida pública. Se haverá um PSDB para abrigá-lo, esta é
outra questão.
Tudo que sobe desce,a queda de Bolsonaro será a pior de todas,o coitado contraiu um carma pela eternidade afora.
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