O Globo
O ex-governador de São Paulo João Doria
tomou uma atitude que já estava madura ao renunciar à candidatura à Presidência
da República, mas deveria ter se antecipado à cúpula do PSDB, que agora está às
voltas com a pressão interna para que o partido tenha um candidato próprio. Não
se trata mais de disputar a Presidência com Lula, Bolsonaro, Ciro Gomes.
Trata-se, isso sim, de tentar salvar a própria sigla do desastre anunciado.
Os tucanos, que governaram o país por oito
anos e estiveram no segundo turno em todas as eleições, exceto as de 2018,
foram devastados pelo fenômeno eleitoral chamado Bolsonaro e não souberam
reagir a esse ataque hostil. A saída de Geraldo Alckmim do partido que ajudou a
fundar só fortaleceu a percepção dos eleitores que trocaram o PSDB por
Bolsonaro de que a social-democracia tucana tem mais a ver com o petismo do que
com o liberalismo que eles buscaram nesses anos todos em que a sigla era a
única alternativa viável ao PT. Assim como a adesão do ex-juiz Sergio Moro ao
governo Bolsonaro reforçou a tese petista de que Moro condenou Lula para
facilitar a vitória de Bolsonaro.
Os eleitores do Sul, do Sudeste, do Centro-Oeste que abandonaram Alckmin em
2018 para aderir a Bolsonaro não encontraram motivos para voltar ao ninho
tucano, pois o partido, além de criticar e atacar o presidente eleito, teria de
ter apresentado uma proposta de governo que atendesse a esse eleitorado, que
quer derrotar o PT porque considera Lula e seus camaradas socialistas
enrustidos que usam a democracia para destruí-la.
Agora, como ressalta Marcus Pestana, fundador do PSDB e candidato ao governo de
Minas Gerais, os tucanos propõem a união com o mesmo MDB, sem seus grandes
nomes, com a perspectiva de uma futura fusão entre os partidos. Seria o
retorno, mais de 30 anos depois, à mesma situação rejeitada por seus
fundadores.
Enfim, João Doria saiu da disputa para a Presidência numa boa hora — poderia
até ter saído antes —, terá tempo para rever suas posições e voltar a competir
pelo próprio partido, já que não saiu rompido. Ele tentou superar a barreira da
cúpula do PSDB, mas ela era intransponível. Na verdade, Doria nunca contou com
a boa vontade do grupo e não soube se impor ao partido na base do diálogo e da
confiança.
Quis se impor pelos resultados — e tinha toda a razão, porque fez um bom governo, mas sua figura pública arrogante e não condizente com a realidade não conseguiu convencer os eleitores. Seria um candidato teoricamente forte se tivesse sido apoiado pelo eleitorado de São Paulo. Tinha muita confiança em si mesmo e se esqueceu de que, sozinho, não conseguiria superar todos os obstáculos.
Na fala de ontem, feita com tranquilidade, reconheceu que se excedeu e acelerou
demais quando não devia. O PSDB tem como fortaleza de resistência apenas o
governo de São Paulo, e caso o perca — caminha para isso — será uma tragédia
para o partido. Doria entendeu, afinal, que não poderia ser o responsável pela
maior derrota do PSDB.
Agora, deverá ser lançada a chapa Simone Tebet, do MDB, com um vice tucano de
peso, que pode ser Tasso Jereissati ou Eduardo Leite. Mas há muita gente no
PSDB querendo apoiar Bolsonaro; provavelmente o apoio a ela não será unânime,
e, se não aparecer com perspectiva de vitória, ela será abandonada tanto pelo
PSDB quanto pelo MDB. É devido a essa rachadura nos dois partidos que tucanos
históricos querem lançar uma candidatura própria para garantir a continuidade
do partido.
O baque da votação de Alckmim em 2018, que não chegou a 5% do eleitorado, pode
se repetir nesta eleição, o que decretará o fundo do poço tucano. O PSDB não
pode nem mesmo repetir o MDB, que desistiu de ter candidatos à Presidência da
República para reforçar suas bancadas e ganhar poder de barganha. Os tucanos
não têm essa capilaridade toda, nem unidade partidária. O candidato do partido,
se sair, será lançado às feras.
Doria agiu certo,pra que competir se não tem chance nenhuma de vitória.
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