O Globo
Governo Bolsonaro pode reestatizar a gestão
da Petrobras, se quiser. Só não pode dizer que é liberal na economia
A apresentação do ministro de Minas e
Energia, Adolfo Sachsida, na Câmara, representou um dos maiores desserviços já
prestados ao liberalismo econômico brasileiro. Sachsida condenou o lucro da
Petrobras, o qual chamou de excessivo, sugeriu mudanças na Lei das Estatais,
para permitir interferências políticas na companhia, e defendeu o corte de
impostos sobre combustíveis, sem considerar os impactos fiscais da medida. Para
completar, disse que o governo estará ao lado do Congresso caso seja instalada
uma CPI para investigar a petrolífera.
A verdade é que apenas uma parte do lucro
da Petrobras vem da área de refino. Se, por um lado, o faturamento da venda de
combustíveis é elevado, por outro, os custos também o são, porque a principal
matéria-prima para a produção de combustíveis, o petróleo, está em alta nos
mercados internacionais.
Para se ter uma ideia, no primeiro trimestre deste ano, foram US$ 24,68 bilhões de receitas na área de refino, mas com despesas de US$ 21,54 bi apenas na compra de produtos. O lucro líquido na área foi de US$ 1,98 bi. Já no setor de exploração e produção, que sempre foi o carro-chefe da Petrobras, o lucro foi quatro vezes maior: US$ 7,95 bilhões. Culpar os combustíveis pelo lucro não encontra respaldo nos números.
O lucro da empresa vem subindo por uma
combinação de fatores. Por um lado, investimentos feitos nos últimos 10 anos
nos campos do pré-sal estão amadurecendo. Isso significa diminuição de custos e
aumento da produção. O óleo desses campos já chega a 70% do que é extraído. Por
outro, a companhia vem reduzindo o endividamento, e por isso paga menos juros,
ao mesmo tempo em que vende ativos.
No primeiro trimestre, US$ 2 bilhões
entraram no caixa da companhia com a venda de campos como Bacalhau e Carcará e
de participações em empresas como a NTS. Em 2021, as ações da BR Distribuidora
renderam R$ 11,35 bilhões (ou US$ 2,2 bi pelo câmbio de ontem) e a refinaria
Landulpho Alves, mais US$ 1,8 bi.
Sachsida bem lembrou que a Petrobras se
tornou uma das empresas mais endividadas do mundo, pelos erros de gestão dos
governos do PT. Mas esqueceu de dizer que o PP, do agora aliado Arthur Lira,
era o partido que controlava a diretoria de Abastecimento, justamente a
responsável pelas refinarias que deram errado.
Foi esse alto endividamento que motivou o
saneamento da Petrobras, que teve início no governo Temer. A comparação entre o
primeiro trimestre de 2022 com o primeiro trimestre de 2014, último período em
que o petróleo passou de US$ 100, mostra uma queda de 51% nos custos de
extração, de 62% nas despesas administrativas e de 65% nos juros pagos. A
empresa“fez o dever de casa”, como dizem os liberais.
O governo Bolsonaro pode reestatizar a
gestão da Petrobras, se quiser. Só não pode dizer que é liberal na economia.
Tiro no pé
O risco de mudança da Lei das Estatais é
visto no mercado financeiro como um baque institucional comparado ao furo no
teto de gastos, no ano passado, e que levou ao pedido de demissão do
ex-secretário do Tesouro Bruno Funchal. A ideia é considerada um enorme tiro no
pé. A explicação dos economistas é simples. Ainda que o governo consiga
intervir na Petrobras para segurar os combustíveis, a piora institucional
levaria a uma forte desvalorização do real. Não só a gasolina e o diesel
ficariam mais caros, mas vários outros produtos, de alimentos a automóveis. O
efeito seria espalhado pela inflação.
Alerta do Banco Central
A sinalização mais ao centro no novo esboço de programa do PT, ontem, foi recebida com ceticismo no mercado. O partido ainda fala em revogar o teto de gastos, sem dizer exatamente qual será a nova âncora fiscal. Também voltou a falar em uso de bancos públicos para alavancar o crescimento, via juros subsidiados. Seria bom que os economistas do partido lessem com atenção a Ata do Copom divulgada ontem pelo Banco Central. O ano de 2023 será de juros elevados, com a inflação acima do centro da meta. Em caso de vitória, não será hora de improvisos e experimentalismos na economia.
O governo Bolsonaro não é liberal em nada.
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