O Globo
Vai custar pelo menos R$ 100 bilhões pagar
os atrasados que o governo Bolsonaro está jogando para o ano que vem. É o que
acha o economista Nelson Barbosa, que foi ministro do Planejamento e da Fazenda
do governo Dilma. Ele define a economia do atual governo como um “show de
improviso”. Acredita que o número a ser divulgado nesta quinta-feira, do PIB do
primeiro trimestre, será positivo, mas que isso não se sustenta. Barbosa conta
que economistas do PT têm se reunido para preparar um plano, e ele participa,
mas “não há um cacique”.
— O PIB vem forte hoje e o desemprego caiu.
Esse é o lado bom, o copo meio cheio. Mas o copo também está meio vazio porque
essa recuperação não tem fôlego. Com a desaceleração da pandemia, a economia
finalmente reabriu e o setor de serviços se recupera. Isso só acontece uma vez,
você não reabre todo trimestre. Não dá para comemorar porque o resultado não é
sustentável.
Na visão dele, em entrevista que me
concedeu na Globonews, o choque é externo, mas foi agravado internamente:
— É preciso ter um plano de reconstrução. A
covid vai deixar sequelas econômicas e sociais. Do lado da política econômica
há um show de improviso. O governo não tinha plano para o pós-covid, nem para
lidar com a volatilidade de preços de energia e combustível.
Ele é a favor da redução do ICMS sobre alguns bens e serviços, mas dentro de uma reforma tributária:
— A tributação indireta é muito alta no
Brasil. O ICMS ainda se pauta por uma lógica dos anos 1970, quando energia,
telefone, gasolina eram considerados bens supérfluos aos quais poucos tinham
acesso. Hoje são bens populares. O ICMS é alto há 30 anos. Não foi isso que
causou o choque de preços. O governo não se preparou para lidar com a
volatilidade das cotações de energia e de combustíveis.
No caso dos combustíveis, ele defende
atenuar os efeitos do choque externo:
— A maioria dos economistas não concorda
com o controle de preços. Eu também não. Vários países estão adotando políticas
para suavizar os preços. A Espanha, Itália e o Reino Unido estão adotando uma
tributação extraordinária sobre lucros excessivos do setor. É preciso
desmistificar a ideia de que o governo não tem nada a fazer, que o mercado
resolve. Esse é um preço-chave, o governo tem que intervir para atenuar a
flutuação. Já se faz isso com o câmbio flutuante. O BC não tem meta, mas quando
flutua demais ele faz swap cambial, faz leilão de reserva, vende e compra.
Nelson Barbosa, que era ministro quando a
inflação chegou a dois dígitos em 2015/2016, concorda com a atuação do Banco
Central:
— Está correto, já vivemos com inflação
alta, que é muito ruim. Um país como o Brasil sabe que tem que tomar o remédio
amargo.
Ele lembra que parte da inflação é causada
pela instabilidade política do governo, com o presidente que coloca em dúvida a
manutenção da democracia.
Sobre as críticas ao governo Dilma, Barbosa diz que passados seis anos já se
sabe que não foi só um problema de política econômica.
— Houve erros de política econômica, vários
deles reconhecidos e comentados pelas próprias autoridades do PT, inclusive eu,
mas é preciso reconhecer que aquela recessão teve outros fatores. Houve queda
de preços de commodities, seca, e o choque político da operação Lava-Jato. Tudo
isso explica a recessão.
Barbosa tem participado de reuniões para
definir um plano econômico da candidatura Lula:
— Na medida que as eleições forem se
aproximando, os candidatos terão que ser mais claros sobre seus planos, até
porque a legislação manda. No PT, há vários economistas dando ideias, eu faço
parte, mas não há um cacique.
Há um ponto que geralmente gera
controvérsia entre os economistas. Qual a ordem dos fatores? Controla os gastos
e cresce, ou cresce e controla os gastos?
— É preciso aumentar temporariamente o
gasto, para reforçar a transferência de renda e retomar o investimento. Fazer a
economia crescer e reequilibrar o orçamento. Essa é a sequência. É muito
difícil o equilíbrio com a economia estagnada.
Perguntei o que colocar no lugar do teto de
gastos. Barbosa disse que Bolsonaro vai deixar um passivo de pelo menos R$ 100
bilhões de precatórios e despesas atrasadas.
— Depois será preciso fazer uma diretriz
fiscal. Pode ser uma meta de resultado primário ou meta de gastos. Eu prefiro a
segunda opção. Não é nenhuma novidade, é assim que é feito nas grandes
democracias do mundo.
Bolsonaro consegue piorar tudo que toca,é o avesso do Rei Midas.
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