O Globo
A furiosa escalada de agressão do governo
contra a Petrobras é um evento do mundo da economia, mas integra o processo de
desmonte institucional do país. A Lei do Petróleo de 1995 determina que a
Petrobras funcione como uma empresa de economia mista, o que significa que ela
não pode operar deliberadamente no prejuízo para atender ao interesse de um dos
seus acionistas. A Lei das Estatais limita o governo como acionista
controlador. Dentro desse arcabouço institucional é que se construíram as regras
de governança e de definição de preços da companhia.
O desmonte institucional no qual Bolsonaro se empenha desde o primeiro dia do governo já atingiu outros poderes e diversos órgãos do Executivo. O caso da Petrobras mostra como a democracia brasileira está funcionando mal. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, se comporta, não como um líder de outro Poder, mas como um ajudante de ordens do chefe do Executivo. E tão empenhado em agradar ao comandante que parece histérico. Ontem, falou em “terrorismo corporativo” ao se referir a José Mauro Coelho, que estava no cargo de presidente, apenas para não deixar uma empresa deste tamanho acéfala. Lira exigiu sua saída. Ele, de fato, renunciou. No Judiciário, o papel de ajudante de ordens foi executado pelo ministro André Mendonça, que deu prazo para a companhia “explicar” os preços.
O governo ataca a empresa que o governo tem
o controle e recebe a prestimosa ajuda de integrantes dos outros poderes. Isso
mostra quebra da institucionalidade pelos dois lados. Membros de outros poderes
sendo a longa manus do Executivo. E as regras da economia e do mercado
acionário sendo inteiramente desrespeitadas.
Dentro desse ataque desesperado de
Bolsonaro à Petrobras, ele ameaçou até com uma CPI. Seria a primeira CPI do
governo contra o governo. Seria pedida pela situação para investigar uma
empresa de maioria de capital estatal e a diretoria nomeada pelo próprio
governo. Evidentemente uma situação tão surreal torna o Brasil pouco confiável
como local de investimento, afugenta o capital estrangeiro, que tem hoje 44,51%
do capital total da Petrobras, e o investidor local, que tem 18,88% do capital.
O governo tem apenas 36,61% do total, mas controla a companhia por ter a
maioria das ações com direito a voto. O risco é a Petrobras ser alvo de mais
uma class action, como já enfrentou no caso da Lava-Jato e que a levou a pagar
multas bilionárias.
Os ministérios da Economia e das Minas e
Energia sabem que mentem quando falam em vender as ações para privatizar a
companhia. É parte da simulação de Bolsonaro. Eles, na verdade, integram hoje o
comitê de campanha da reeleição. Por isso nem entrarei aqui nos argumentos para
provar que é mentira. É mentira, simplesmente. Mas ontem as mentes binárias do
mercado financeiro começaram a discutir isso como uma possibilidade. Será usado
em especulação.
Qual é o truque de toda essa delirante
escalada? Bolsonaro tenta pôr a culpa dos preços altos na Petrobras, se afastar
do ônus da impopularidade e ainda dizer para os eleitores que ele tentou
resolver, mas foi impedido. A oposição não sabe o que fazer porque não vai
defender preço alto de combustível em plena campanha eleitoral. Pode, no
máximo, dizer que propôs a criação de um fundo de compensação de preços, e
realmente propôs, que se fosse posto em prática a tempo o país não estaria numa
situação tão delicada.
Se a Petrobras praticar preços abaixo do
mercado terá que importar com prejuízo — comprar a um preço mais alto do que
oferecerá no mercado interno. Isso fere todo o arcabouço institucional que
regula as empresas de economia mista. O Brasil se afastará do modelo que
funciona na Noruega, por exemplo, e se aproximará do desastre que é o modelo da
Venezuela. Esse caminho é contra as leis econômicas e contra as leis que
regulam as empresas estatais. Há um risco dessa confusão acabar produzindo
desabastecimento de diesel.
Se toda essa violência — demissão de três
presidentes, ofensas a um presidente já demitido, ameaças a diretores e à
própria empresa — der certo, o preço cairá um pouco. Não será um grande alívio
para o consumidor. Em compensação, o país terá perdido reputação como destino
de investimento, e o governo estará fazendo tudo isso para subsidiar
combustíveis fósseis em plena emergência climática. Uma completa insensatez.
Afora a certeza de que o Bolso está usando o "affair" Petrobras para se livrar do "affair" Amazônia ()e todos estamos caindo em seu engodo, pergunto-me se o bolso do Bolso não especula com ações da Petrobras ... Já vi uma notícia de que, após uma declaração retumbantemente negativa, todos os presentes na reunião dos bolsonitas saiu celeremente a comprar ações (em baixa) dessa empresa. Por quanto tempo ele continuará especulando para essa empresa-símbolo da eficiência, da eficácia e da efetividade nacional brasileira?
ResponderExcluirBolsonaro opera em regime de insensatez permanente.
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