O Globo
Diante da perspectiva, cada vez mais
concreta, de não reeleição de Jair Bolsonaro, o Centrão parece empenhado em
sugar até a última gota e não deixar sobrar país nenhum para quem assumir em
2023 — tornando, assim, seu apoio ao próximo presidente tão vital quanto
custoso.
Arthur Lira, hoje, dá as cartas no Brasil.
A partir da presidência da Câmara, opera coordenado com seu parceiro da Casa
Civil, Ciro Nogueira, e, depois de dominar o Orçamento-Geral da União, quer
retomar para seu partido e o consórcio de legendas que comanda a ingerência
perdida sobre as estatais, com a Petrobras como joia a recuperar.
É escandalosa em grau inaudito até para os
padrões do bolsonarismo a ideia de rasgar a Lei das Estatais a menos de quatro
meses de uma eleição em que o grupo que está no poder está em desvantagem.
É outro braço do golpismo que campeia na
esfera institucional, aquela em que Bolsonaro articula as Forças Armadas e a
Polícia Federal para questionar e, se possível, tentar empastelar o pleito.
A lei, aprovada no governo Michel Temer, foi uma resposta ao escândalo do petrolão, que, a despeito de revisões que tenham sido feitas em condenações decorrentes dos processos da Lava-Jato, foi um escândalo que resta comprovado.
Por meio de um acordo político consentido
pelos governos do PT, partidos como o PP de Lira, Nogueira e companhia bela
loteavam a Petrobras e suas subsidiárias para, em conluio com grandes
empreiteiras e funcionários da companhia, de carreira ou nomeados, desviar
quantias milionárias em contratos superfaturados, com cartas marcadas e outros
conchavos.
Ao estabelecer regras de governança e
critérios técnicos para o preenchimento de cargos em conselhos e diretorias das
estatais, a lei que Lira e aliados querem agora incinerar funcionou como uma
blindagem à repetição desse tipo de esquema.
Com o pretexto “popular” de baixar o preço
dos combustíveis, os partidos do Centrão querem assegurar mais um espaço de
poder, também para o futuro, no momento em que os que desfrutam estão ameaçados
pela perspectiva de derrota de Bolsonaro nas urnas.
Não é a primeira lei que integra o
arcabouço de controle e fiscalização a ser atacada no governo Bolsonaro. A Lei
de Improbidade foi implodida sob o pretexto de evitar exageros, e uma Lei de
Abuso de Autoridade foi aprovada com o claro propósito de intimidar autoridades
a cumprir seu dever.
No mundo invertido bolsonarista, os ataques
sistemáticos ao sistema republicano são sempre travestidos de ideias nobres. O
mais estarrecedor é que os ditos democratas, liberais e pró-mercado — que
pegariam em panelas caso qualquer outro governo propusesse arrancar as catracas
para promover a farra do boi em conselhos e diretorias de estatais —calam o
bico diante do avanço da tropa de Lira sobre o arcabouço legal que preserva
minimamente a principal empresa do Brasil da interferência tosca a que está
submetida por Bolsonaro.
Ricardo Barros, o mais literal dos súditos
de Lira, deixou extravasar a intenção real da canhestra manobra que estão
empreendendo ao dizer:
— Ele [Bolsonaro]
demita, mas o cara não vai embora.
Evocou, com essa fala esparramada, o
clássico de um antigo cacique de seu partido, Severino Cavalcanti, quando
venceu de surpresa a presidência da Câmara e se pôs a exigir uma diretoria “que
fura poço e acha petróleo” na mesma Petrobras.
A batalha que se trava para implodir os controles da Petrobras nada tem de nobre preocupação com o alto custo dos combustíveis sobre o orçamento das famílias e com a inflação. Trata-se de desespero do Centrão pelo preço eleitoral que cobra de um hospedeiro, Bolsonaro, que já não tem tanto a oferecer e de quem planejam sugar até a última gota.
É uma farra do boi generalizada.
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