Folha de S. Paulo
Plano Bolsonaro para combustíveis custa
mais que Auxílio Brasil e investimento federal
O pacote
de combustíveis de Jair Bolsonaro-Centrão não
tem pé nem cabeça. Parece ideia anotada em um guardanapo de papel sujo de leite
condensado e farofa. Feitas as contas possíveis, nota-se que vai custar mais do
que alguns maiores programas do governo federal. Pode provocar inflação e
mais endividamento no ano que vem, depois da eleição.
É o estelionato eleitoral típico. Se o
truque não funcionar, Bolsonaro pode tentar jogar a culpa em alguém, nos estados,
seu método irresponsável de desgovernar.
Suponha-se que as reduções de impostos
sobre gasolina, etanol, diesel e gás de cozinha durem de julho a dezembro. A
redução de receita seria de cerca de R$ 48,6 bilhões em um semestre. Em um ano,
de R$ 92,2 bilhões (o consumo nas metades do ano é diferente).
O Auxílio Emergencial, que dá comida para 18 milhões de famílias, custa R$ 89 bilhões por ano.
O BPC (Benefício de Prestação Continuada),
auxílio pago para idosos e pessoas com deficiência muito pobres, custa R$ 71,7
bilhões por ano. O seguro desemprego leva R$ 38,8 bilhões anuais. O
investimento federal em "obras" leva R$ 43 bilhões.
O dinheiro do desconto de impostos sobre
combustíveis é, por assim dizer, indiscriminado. Ricos e pobres, todo mundo que
paga combustível ou preços influenciados por combustível, se beneficia (mais os
mais ricos do que os pobres). Você acha correto isso?
Suponha-se que o preço
dos combustíveis não baixe até 31 de dezembro (se não aumentar ainda
mais). O próximo governo, então, terá de prorrogar o desconto de impostos,
fazendo ainda mais dívida e pagando ainda mais juros (para ricos). Em
decorrência, taxas de juros e dólar tendem a ficar mais salgados, tudo mais
constante.
Se não prorrogar o desconto de impostos, a
inflação dará um salto, talvez bastante para colocar a inflação acima da meta
em 2023. Mais juros.
Alguns países estão dando auxílios para
atenuar esta crise. Mas, a dar dinheiro, porque não beneficiar pobres? Por
falar nisso, governos no Brasil têm tido receita extra por causa da carestia,
mas: 1) Isso não vai durar; 2) Não está sobrando dinheiro: o governo federal já
é deficitário.
Se rolar, o desconto de impostos seria de
R$ 24 bilhões até o primeiro turno, R$ 32 bilhões até um segundo turno. Por
isso, a economia pode esquentar (ou deixar de esfriar) um pouquinho). Isso pode
dar algum impulso à inflação de outros itens que não combustíveis.
Se o consumo de diesel aumentar, dado o
preço menor, aumentam os riscos de que falte combustível, ainda improvável.
Pode ser que nem todo o desconto de
impostos chegue ao consumidor. A diferença pode ficar no caminho, com alguma
empresa (do negócio de combustíveis ou outras).
Esta conta de perda de receita com impostos
é meramente contábil (o que se deixa de arrecadar, dadas a redução de alíquota
e a receita atual). Como deve haver aumento de consumo, parte do imposto volta,
sabe-se lá quanto. Os efeitos econômicos colaterais ficam.
Nessa conta de perda semestral de receita
de R$ 48,6 bilhões entram o desconto de impostos federais sobre gasolina e
etanol (R$ 18,3 bilhões) e o dinheiro que o governo federal promete devolver
aos estados caso reduzam a zero o (possível) novo ICMS sobre diesel e gás de cozinha,
além das perdas estaduais com a possível redução para 17% ou 18% das alíquotas
atuais do ICMS sobre esses combustíveis (R$ 30,3 bilhões).
O plano é socialmente injusto, cria
distorção econômica, é um estímulo econômico ineficiente, bananeiro e empurra
um problemão para depois da eleição. Para variar, Bolsonaro foi negligente,
inepto e laborfóbico. Agora, tenta um estelionato eleitoral.
''Laborfóbico'' é ótimo,além de homofóbico.
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