Folha de S. Paulo
Tanto faz se quebre o país, Bolsonaro vai
fazer o que puder para evitar derrota precoce
Lula da Silva (PT) ganha
a eleição no primeiro turno, com 53% dos votos válidos, no Datafolha desta
semana. A pesquisa não permite dizer quase nada a respeito do que vai ser da
votação dos candidatos nos cem dias até o primeiro turno. Mas a prioridade da
campanha de Jair
Bolsonaro (PL) é diminuir o risco de perder já no dia 2 de outubro.
Para tanto, Bolsonaro precisa não apenas
ganhar votos, mas tem de tirá-los de Lula. Ou, com possibilidade de sucesso
muito menor, também teria de conseguir votos de eleitores avessos a votar em
alguém. De resto, tem de torcer que o eleitorado de Ciro Gomes (PDT) ou Simone
Tebet (MDB) não debande,
Em tese, pela aritmética simples da
pesquisa, a tarefa bolsonarista está longe de impossível. Cerca de 20% dos ora
eleitores de Lula dizem que podem votar em Bolsonaro e vice-versa. A questão é
descobrir o que pode mover o eleitorado.
A resposta fica mais nebulosa quando se nota que, desde março, os resultados das pesquisas pouco mudaram, afora ninharias estatísticas. Do final de 2021 até março, Bolsonaro ganhou uns pontos. Desde então, sua votação ou a nota para seu governo mudaram quase nada. Lula também ficou na mesma. As taxas de rejeição ficaram na mesma. Os demais candidatos continuaram nos seus pequenos nichos eleitorais.
O país, no entanto, parece um tumulto
horrendo e assim ressoa nos mundos e nas bolhas das opiniões públicas, dos
jornais às redes sociais. Por algum motivo, os desastres, os escândalos e a
miséria persistente não influenciaram votos. A informação do ruído (sic) não
chegou ou causou indiferença, não se sabe se por convicção de voto ou outro
motivo.
Mas algo mudara no primeiro trimestre.
Bolsonaro se recuperou, o que preocupou petistas e fez com que o bolsonarismo
previsse virada. O prestígio de Bolsonaro, quase sempre baixo, variou mais no
choque da epidemia, no primeiro semestre de 2020, quando caiu. Melhorou com o auxílio
emergencial de R$ 600. Caiu ainda mais com o fim do auxílio e a inflação
crescente. Mas melhorou mesmo com a inflação em alta neste início de ano
(houve mais emprego).
Se essas coincidências são os motivos da
variação de popularidade é impossível cravar, embora dados e alguma experiência
indiquem que sim, podem ser essas as causas. Pesquisas qualitativas sugerem que
parte do eleitorado, em particular mulheres, pegou aversão duradoura a
Bolsonaro, por causa de sua desumanidade.
Triturar a imagem de Lula vai ser um mote
de campanha. Apenas não está claro quando começa. Mas até antes do recesso
eleitoral no Congresso,
o governo vai aprovar o que puder para tirar votos do PT, não importa se vai
quebrar o governo ou estocar inflação para 2023. Para Bolsonaro, isso jamais
foi problema.
Em vez de aumentar subsídios para
combustíveis, Bolsonaro vai tentar pagar um Auxílio Brasil de R$ 600 até o
final do ano, o que aliás é a providência mais sensata em caso de choque de
preços e de miséria —por ser humana e tecnicamente mais sensata, não havia sido
adotada até agora.
O eleitorado que recebe o Auxílio Brasil
avalia o governo de modo muito semelhante ao da média do país. Pode ser ainda
que note o estelionato eleitoral, pois o dinheirinho extra não seria pago até o
final do ano. Mas não é esse o assunto, aqui e agora.
Como está claro desde o Datafolha de maio,
o importante é arrancar pontos de Lula bastantes para que ocorra um segundo
turno. A situação socioeconômica pouco vai mudar até outubro. É difícil refazer
a imagem de Bolsonaro. Mas um par de pontos evita o risco de derrota no
primeiro turno e garante a possibilidade de subversão até o segundo.
Não sei porque Bolsonaro tenta ir pro segundo turno se a diferença pro Lula fica ainda maior.
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