Folha de S. Paulo
Tempestade de más notícias não alterou
adesão a Bolsonaro
A pesquisa Datafolha
divulgada nesta quinta-feira evidencia, uma vez mais, a
estabilidade do quadro eleitoral, mas também demonstra a ameaça de um buraco
civilizatório. O mal atinge outras democracias.
Se a eleição
fosse hoje, Lula (PT) venceria no primeiro turno: oscilou de
48% em maio para 47%. Jair Bolsonaro (PL) variou de 27% para 28%, e Ciro Gomes
(PDT), de 7% para 8%. André Janones (Avante) segue com 2%. Simone Tebet (MDB)
foi de 2% para 1%, mesmo índice de Pablo Marçal (PROS) e Vera Lúcia (PSTU), que
repetem desempenho anterior. No segundo turno, o ex-presidente venceria o atual
por 57% a 34%. Antes, 58% a 33%. A margem de erro é de dois pontos percentuais.
Assim, o mais provável é que nada de
relevante tenha acontecido nas intenções de voto. Mas muita coisa aconteceu.
Eis o buraco que pode inviabilizar o país caso se expanda.
Entre o levantamento anterior e este, houve os assassinatos de Bruno Araújo Pereira e Dom Phillips no Vale do Javari. A tragédia não se deu no vácuo, mas num meio ambiente político de incentivo ao vale tudo. A pergunta é óbvia e a resposta não menos: os valores que emanam do Palácio do Planalto e suas políticas públicas estão mais afinadas com Bruno e Dom ou com seus executores? O próprio Bolsonaro, Hamilton Mourão, a Polícia Federal e os tais "bolsominions" nas redes sociais não hesitaram em apontar o dedo acusatório para as vítimas.
No intervalo, houve um reajuste de
combustíveis, e Bolsonaro, em companhia de Arthur Lira, presidente da Câmara e
governante "de facto", resolveram promover um pega-pra-capar na Petrobras,
somando a histeria à desordem fiscal promovida pelo tal pacote
para baixar o preço, enlaçando os Estados no seu desastre.
O mandatário resolveu elevar a temperatura
da retórica golpista e, sob o seu comando, o TSE passou a ser alvo de um
verdadeiro assédio do Ministério da Defesa. Até Anderson
Torres, titular da pasta da Justiça, enviou um ofício meio
malcriado ao tribunal, anunciando que a PF fará auditoria das urnas,
empregando, provavelmente, ferramentas próprias --não sabemos quais. Todos
querem fiscalizar o tribunal, numa interpretação livre de uma resolução, mas
não sabemos quem fiscaliza os fiscais.
Os pesquisadores do Datafolha foram a campo
na quarta e quinta, em meio às turbulências geradas pela prisão preventiva,
depois revogada, de Milton
Ribeiro, ex-ministro da Educação e dos pastores lobistas, que
pertencem ao círculo de Bolsonaro. Um esteve 35 vezes do Palácio do Planalto; o
outro, dez. Aqui e ali ouvi que isso tudo poderia criar dificuldades adicionais
ao presidente nas urnas. Discordei, como sabem as pessoas com as quais conversei.
A adesão a Bolsonaro não sofreu abalo
nenhum e pode até ter melhorado discretamente. A realidade deixou de ter
importância para os fanáticos. Não se sabe exatamente o percentual que o
absolveria se fosse flagrado dando um tapão na orelha de uma criança. O certo é
que diriam: "Alguma ela deve ter feito para merecer a correção". É
provável que não somem 28% —nesse percentual, também já estão os votos úteis
contra Lula—, mas fiquem certos: pouca gente não é.
Repita-se: não se trata de um fenômeno
nativo. Os seguidores de Donald
Trump, por exemplo, não o admiram porque defensor incansável
dos valores democráticos. Ao contrário: parte considerável da adesão se deve
justamente ao fato de que ele os desafia. Não deixa ser desalentador constatar,
mas a verdade que é milhões de brasileiros —não são a maioria— pensam o que
pensa Bolsonaro.
O fanatismo cria, sim, dificuldades para
que se expanda o círculo de apoios. A pregação a convertidos assusta. Mas impõe
barreiras a que outros nomes surjam na disputa. Convém lembrar: os primeiros
adversários que Bolsonaro liquidou com a sua tática foram os identificados com
a direita não extremista. Como a ameaça fascistoide é explícita, muita gente migra
para Lula já no primeiro turno. E nada surge entre ambos.
Isso vai mudar? O presidente já evidenciou
que as contas públicas não serão um limite. Precisa desesperadamente crescer
entre os pobres. O jogo não está jogado. Mas a economia e os fanáticos não o
ajudam.
pensou errado; milhões de brasileiros não concordam com não é.
ResponderExcluirMAM