Folha de S. Paulo
Única esperança do presidente é gerar
sensação de bem-estar equivalente à do Plano Real em 1994
Na semana passada, o
Senado aprovou uma emenda constitucional que permite a Bolsonaro
quebrar o Estado brasileiro para tentar vencer o Lula.
Com a aprovação, vão para o lixo o teto
de gastos, a lei de responsabilidade fiscal, a regra de ouro e tudo que
controle os gastos do governo.
A medida, entretanto, não vale por tempo
indeterminado: quando o presidente voltar a ser de esquerda, qualquer pedalada
no Plano Safra voltará a ser motivo de impeachment.
Gastar dinheiro é o que sobrou para Jair Bolsonaro,
que está muito, muito
atrás de Lula nas pesquisas eleitorais.
Só houve, até hoje, uma virada em campanha
presidencial nessa altura do ano: a de 1994, quando Fernando Henrique Cardoso
deu uma arrancada espetacular após a implementação
do Plano Real.
Por mais que seu terapeuta lhe diga o contrário, Paulo Guedes nunca foi nem jamais será capaz de fazer um Plano Real. Todos os historiadores concordam que uma das causas do sucesso do Plano Real foi justamente ninguém ter chamado o Guedes para ajudar.
Por isso, a única esperança de Bolsonaro
virar para cima de Lula é gastar dinheiro até gerar uma sensação de bem-estar
equivalente à causada pelo fim da hiperinflação em 1994.
Vai ser caro.
De todas as medidas aprovadas, a única que
pode influenciar o resultado da eleição é o aumento do Auxílio
Brasil. Os beneficiários do Auxílio são um público em que Lula é fortíssimo.
Talvez o auxílio ajude Bolsonaro a diminuir essa diferença, o que poderia
equilibrar a campanha eleitoral.
O aumento do auxílio deve dar votos a
Bolsonaro, mas é difícil prever quantos. Afinal, o adversário é Lula.
Lula criou o Bolsa Família, também
conhecido como "Auxílio Brasil antes do Bolsonaro mudar o nome do negócio
para parecer que foi ele quem fez".
Contra qualquer outro candidato, Bolsonaro
poderia dizer, "votem em mim ou o outro cara vai cortar o benefício de
vocês". Será que isso vai dar certo contra Lula, que garantiu o benefício
original?
É possível, mas é menos certo do que seria
contra qualquer outro oponente.
As outras medidas da "PEC Medo do
Lula" são uma tentativa de Bolsonaro segurar voto que já tem. Caminhoneiros e
taxistas, beneficiados pela PEC, já tendem a votar em Bolsonaro.
Mesmo se as medidas ajudarem o candidato da
extrema-direita –devem ajudar– não vão decidir a eleição.
A não ser, é claro, que Bolsonaro conte com
os caminhoneiros mais para sua tentativa de golpe do que para a eleição.
É muito, muito ruim que a Constituição seja
alterada três meses antes da eleição para permitir ao governo gastar dinheiro
na campanha. É um sinal de clara deterioração institucional, mais um entre os
vários dos últimos anos.
O precedente é péssimo e, tenham certeza,
será utilizado por outros governos. O puxadinho em cima do teto de gastos acaba
de se tornar um arranha-céus.
Já faz alguns meses que os analistas só não
cravam vitória de Lula no primeiro turno porque Bolsonaro controla a máquina do
governo federal. Situação da economia, alianças, "lava-jatismo" de
2018, nada disso vai ajudar Bolsonaro.
Resta o uso da máquina pública, que costuma dar vantagem a quem concorre à reeleição. Sobretudo, resta a Bolsonaro torcer para que o eleitorado não perceba que isso tudo é só por três meses.
O povo precisa ser alertado sobre este estelionato eleitoral a caminho.
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