Correio Braziliense
Ciro (PDT), Simone (MDB) e
Janones (Avante), juntos, somam de 12% a 13%, o suficiente para levar a eleição
ao segundo turno e manter Bolsonaro dois dígitos distante de Lula, que mantém o
favoritismo
O presidente Jair Bolsonaro vive o rescaldo
da grande convenção de domingo que oficializou sua candidatura. Seu discurso no
Maracanãzinho mirou aquilo que as pesquisas estão mostrando e seus marqueteiros
também: (1) precisa do voto das mulheres, daí o discurso de Michelle, a
primeira-dama, na convenção, dirigido ao mundo evangélico para chegar ao
eleitorado feminino; (2) está em franca desvantagem junto à população de mais
baixa renda, em que o ex-presidente Lula nada de braçadas, situação que tenta
reverter prometendo manter o Auxílio Brasil no valor de R$ 600 após as eleições
(apesar de a equipe econômica só conseguir garantir R$ 400 remanejando o
Orçamento da União de 2023); e (3) sonha com os votos de classe média que
recebeu em 2018 e está perdendo, por causa de seu radicalismo, principalmente
nos estados do Sudeste. Jovens e o Nordeste são batalhas perdidas.
Acontece que Bolsonaro não se aguenta e fala o que realmente pensa, não o que as pesquisas qualitativas da equipe de campanha estão mostrando: na convenção, fugindo ao script, partiu novamente para cima do Supremo Tribunal Federal (STF) e das urnas eletrônicas, o que é um tiro no pé, porque reforça a imagem de candidato perdedor e a ideia de que prepara um golpe de Estado, ainda mais depois de ter feito uma nova convocação para mais uma manifestação contra o Supremo no 7 de Setembro.
O Dia da Independência pode ser um Rubicão.
É aí que o papel do candidato a vice, general Braga Netto, precisa ser
observado com atenção. Além de ser o responsável pelo programa de governo, que
promete entregar nas próximas semanas, ascendeu à condição de articulador da
campanha e está viajando aos estados. O ex-ministro da Defesa transita muito
bem no universo de apoiadores de Bolsonaro, não esconde sua afinidade com as
teses golpistas e é o mais preparado para cuidar, com outros militares, da
mobilização da militância de campanha. Como todos sabem, Bolsonaro tem uma
milícia política armada.
Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (cuja
candidatura sofre um ataque da ala lulista do MDB, às vésperas da convenção
para homologar seu nome) e André Janones (Avante), juntos, somam de 12% a 13%,
o suficiente para levar a eleição ao segundo turno e manter Bolsonaro dois
dígitos distante de Lula, caso a polarização entre ambos se mantenha. Mesmo que
esse quadro não se altere a favor de uma terceira via, são candidaturas que têm
um papel a cumprir no debate político e na negociação do segundo turno, porque
forçariam um entendimento em direção ao centro. Entretanto, temos uma eleição
com forte tendência de polarização, com 70% do eleitorado supostamente já
definido, que pode registrar o voto útil tanto em favor de Bolsonaro como de
Lula na reta final do primeiro turno.
Esse é um tipo de aposta incorporada à
narrativa da frente de esquerda que apoia Lula, para vencer no primeiro turno,
alimentada pelos arreganhos autoritários de Bolsonaro e da extrema direita que
o apoia. Mas não existe eleição decidida de véspera, os 45 dias de campanha de
rádio e televisão tanto podem abduzir completamente os candidatos de terceira
via como provocar o contrário, com um dos três postulantes à terceira via se
beneficiando do aumento da rejeição aos dois candidatos, em razão da pancadaria
entre Lula e Bolsonaro.
David contra Golias
A candidatura do deputado André Janones à
Presidência da República foi oficializada no sábado. A convenção foi em Belo
Horizonte, com o grande Teatro do Minascentro lotado. Advogado, filho de uma
empregada doméstica, Janones é um fenômeno das redes sociais, seu primeiro
emprego foi como cobrador de ônibus. Nas pesquisas divulgadas ontem, figurava
com 2% de intenções de votos; vem sendo assim, teimosamente. Ele é um fenômeno
da antipolítica: em 2016, quando se candidatou à Prefeitura de Ituiutaba pelo
PSC, perdeu; em 2018, surfou a greve dos caminhoneiros e foi o terceiro mais
votado nas eleições para deputado federal em Minas. Disputa pela primeira vez a
Presidência da República, é um David contra Golias.
Janones é uma pedra no caminho do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porque a resiliência de seus eleitores
pode inviabilizar uma vitória do petista no primeiro turno, somada aos votos de
Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB). O candidato do Avante tem seu discurso
na ponta da língua: “Só de eu poder dizer que nós temos de fato um projeto para
o país, para mim, já fez tudo valer a pena. Hoje, nós temos um projeto que
contempla todas as áreas: saúde, segurança, educação, agro… Todas as áreas e
todos com a mesma mensagem, com o mesmo objetivo: a diminuição da desigualdade
social no nosso país, a diminuição da distância entre os mais ricos e os mais
pobres”, explica.
O deputado mineiro defende um programa de
combate à pobreza, financiado por uma reforma tributária, para taxar lucros e
dividendos, e criar um imposto sobre grandes fortunas, rever os atuais
incentivos fiscais, sem sacrificar a classe média com mais tributação. Na
convenção, André Janones defendeu a democracia; em entrevistas, já disse que
não apoiará Bolsonaro, no segundo turno. O Avante tem oito deputados federais,
16 deputados estaduais, 82 prefeitos e 1.074 vereadores.
Se Lula conseguisse fazer o que Janones promete, eu já ficaria muito satisfeito. Janones talvez seja menos demagogo que Lula. Mas pode ser que com o passar do tempo Janones consiga superar o autoproclamado "homem mais honesto do mundo".
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