O Estado de S. Paulo
A PEC do Desespero de Bolsonaro está ajudando Lula, visto como o que melhor garantiria benefícios
Não há surpresa alguma na PEC do Desespero.
Comprar votos é o que sempre fez a política como ela é. Vergonha na cara não
existe nesse tipo de política (nem gratidão). É um traço aparentemente imutável
da nossa cultura, goste-se ou não.
A questão é saber se a compra de votos vai
funcionar. O universo de eleitores que vivem com renda familiar (atenção,
familiar) de até 2 salários mínimos – o alvo da PEC do Desespero – é estimado
em 60 milhões de pessoas. Esse número equivale à soma de colégios eleitorais
como São Paulo, Minas e Bahia.
É a formidável massa de eleitores da categoria “mais pobres” (40% do total). Nesse enorme segmento a vantagem de Lula sobre Bolsonaro tem sido ampla, constante e, ao que tudo indica, consolidada. Em outras palavras, com a PEC do Desespero a estratégia de Bolsonaro consiste em atacar seu adversário onde ele é mais forte.
Dar dinheiro na mão do eleitor muda voto?
Em parte, funciona. Os profissionais em leitura de pesquisa constataram sem
dificuldades uma correlação entre ajuda emergencial e melhoria dos índices de
popularidade de Bolsonaro, por exemplo. Mas, neste momento, dois fatores
limitam consideravelmente a eficácia da desavergonhada compra de votos.
O primeiro é a deterioração da renda. Os
eleitores mais pobres mencionam a economia como fundamental na formação do voto
e consideram que R$ 600 de ajuda já não são R$ 600, grana que ainda por cima só
será paga até o fim do ano. Ou seja, aos olhos do público-alvo a PEC do
Desespero chega com pouco.
Além de chegar tarde, o segundo fator
limita sua eficácia eleitoral. Existe um reconhecido “time lag” entre a
aprovação/efetivação de um benefício e a melhoria da situação do candidato nas
pesquisas. Fala-se de um processo que demanda em torno de meio ano – e faltam
menos de três meses para o primeiro turno das eleições.
Para piorar a situação de Bolsonaro, ele
está sendo vítima da famosa lei das consequências não intencionais. Ao
dedicar-se desesperado à compra de votos via benefícios sociais, paradoxalmente
o presidente reforça a imagem de seu grande oponente – Lula é visto pelos mais
pobres, em termos de atributos, como aquele que melhor garantiria os benefícios
para além do horizonte de dezembro estabelecido na PEC do Desespero.
Em outras palavras, a derradeira estratégia de Bolsonaro promete trazer pouquíssimo ganho político obtido a um enorme custo financeiro e, principalmente, institucional ao País (algo que pouco importa para a política como ela é). Provavelmente o presidente nem percebe que foi engolido pelos fatos que pretendia mudar.
Será que está ajudando mesmo?
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