terça-feira, 23 de agosto de 2022

Hélio Schwartsman - Salvos pela incompetência

Folha de S. Paulo

Se Bolsonaro tivesse acertado melhor timing de intervenções eleitoreiras, seria candidato imbatível

Não sou religioso, mas agradeço aos céus pela incompetência do atual governo. Fossem Jair Bolsonaro e seus sequazes um pouco mais inteligentes, seria dificílimo tirá-los do poder.

A democracia tem um forte viés situacionista. Cerca de 80% dos líderes que se reapresentam para um segundo mandato consecutivo têm sucesso. Para que percam, é preciso que algo grave tenha acontecido. Em geral, isso ocorre por força de crises econômicas.

É verdade que Bolsonaro teve de enfrentar dois problemas a que não deu origem, que foram a pandemia e a guerra na Ucrânia. A conjunção dos dois acabou favorecendo o empobrecimento da população e um processo inflacionário difícil de debelar.

Outros governantes também experimentam dificuldades eleitorais por causa de algum dos dois flagelos. Para parte dos analistas, Trump perdeu a Casa Branca devido ao mau desempenho na pandemia, já que a economia ia relativamente bem. Até Jacinda Ardern, a primeira-ministra da Nova Zelândia, a dirigente de um dos países que melhor lidaram com a Covid, parece em vias de ser derrotada por causa da inflação, contra a qual ela não teve o mesmo sucesso.

O que distingue Bolsonaro da maioria das lideranças é que ele ganhou do Congresso presentes com os quais outros não puderam nem sonhar. O primeiro foi a blindagem. Bolsonaro começou seu mandato antagonizando o Legislativo, em particular o centrão. Mas, assim que viu que correria risco de impeachment, se acertou com o grupo, do qual virou tchutchuca.

O segundo foi o megaultrapacote de bondades eleitorais. O presidente recebeu de mão beijada bilhões de reais para medidas populistas. Pior, numa atitude que desafia a lógica, a oposição votou em massa a favor desse estelionato.

Se Bolsonaro e seus asseclas tivessem tido a competência de dosar melhor o timing das intervenções eleitoreiras, ele seria um candidato imbatível. Felizmente, eles são bem ruins.

 

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