Correio Braziliense (27/8/22)
Nas redes sociais, 15 milhões
de pessoas acompanharam as postagens sobre a entrevista de Lula ao JN, mais do
que a audiência de Bolsonaro, que foi de nove milhões
Quem esperava uma entrevista pesada, como a
do presidente Jair Bolsonaro, na segunda-feira, certamente ficou surpreso com a
sabatina do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos jornalistas William
Bonner e Renata Vasconcellos, no Jornal Nacional (TV Globo), na quinta-feira. O
clima de grande expectativa em torno da entrevista, decorrente do histórico de
desentendimentos entre o líder petista e a emissora, foi desanuviado logo no
começo, quando o âncora do programa jornalístico de maior audiência da televisão
brasileira, ao formular sua pergunta sobre a corrupção nos governos petistas,
fez a ressalva de que o ex-presidente não devia nada à Justiça.
Daí para a frente, Lula ficou à vontade, ora sorridente, ora veemente, respondendo às perguntas de acordo com sua conveniência. Algumas vezes, tergiversou; outras, mandou recados aos diferentes públicos que pretende seduzir na campanha eleitoral. Foi o caso da nomeação do novo procurador-geral da República, caso seja eleito. O petista deixou no ar se aceitará a lista tríplice tradicionalmente eleita pelos procuradores, como fez durante seu governo. Sem nunca perder a elegância, foi mais atencioso com Renata Vasconcellos do que com Bonner. O Lula ressentido dos palanques eleitorais deu lugar à nova versão do Lulinha Paz e Amor, 20 anos depois. O petista estava de bem com a vida e convicto de que sua volta ao poder, em parceria com o ex-tucano Geraldo Alckmin, é a chave para resolver os problemas do país.
Não concordo com a tese de que os
jornalistas refrescaram deliberadamente Lula, apenas não tiveram oportunidade
de confrontá-lo como fizeram com Bolsonaro, porque Lula foi muito esperto e
estava preparado para vender seu peixe com competência. Fez isso de forma menos
propositiva do que Ciro Gomes, por exemplo, mas muito eficiente para resgatar
seu legado como presidente da República por dois mandatos, que deixou o governo
com altos índices de aprovação. O caminho crítico era a Operação Lava-Jato, mas
esse tema Lula tratou como um erro judicial, da qual foi vítima, o que muda a
natureza de sua prisão. Aproveitou para desqualificar o ex-juiz Sergio Moro,
que o sentenciou à prisão, e só faltou bater no peito para dizer que seu
governo criou condições para todas as investigações da Lava-Jato, ao fortalecer
os órgãos de controle e não interferir na Polícia Federal nem no Ministério
Público Federal.
Quando questionado sobre o mensalão,
derivou para a crítica ao chamado orçamento secreto, no valor de R$ 16 bilhões.
Aproveitou a oportunidade para fustigar Bolsonaro, que chamou de “bobo da
corte”. Disse que o atual presidente da República entregou o Orçamento da União
ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que libera o pagamento das
emendas parlamentares diretamente com os ministros. Lula defendeu a
ex-presidente Dilma Rousseff, mas dela manteve distância regulamentar. Criticou
os comunistas cubanos e chineses, demarcando território em relação à esquerda,
e encheu a bola do vice Geraldo Alckmin, para agradar aos eleitores de centro e
mostrar que a polarização entre PT e PSDB era do bem, pois se tratavam como
adversários, enquanto a luta do bem contra o mal preconizada por Bolsonaro
seria de natureza fascista.
Caiu na rede
Visto por esse ângulo, Lula aproveitou a
oportunidade para consolidar seu favoritismo nas eleições, mas as coisas não
acontecem tão fácil assim. O resultado da entrevista não pode ser avaliado pelo
desempenho de Lula frente aos jornalistas da TV Globo, apenas. Não, existe uma
guerra de versões nas redes sociais. A imagem que Lula tentou construir não
será exatamente a que gostaria, será o resultado do seu desempenho e das
críticas dos bolsonaristas. Hoje, isso é mensurável nas redes sociais, embora a
prova dos nove seja a pesquisa de opinião feita com os eleitores, em bases
estatisticamente confiáveis.
Nas redes sociais, 15 milhões de pessoas
acompanharam as postagens sobre a entrevista de Lula ao JN, mais do que a
audiência de Bolsonaro, que foi de nove milhões. Lula teve boa aprovação ao
defender a presença de Alckmin na sua chapa. Também faturou quando criticou o
ódio na política. Em contrapartida, as redes reagiram negativamente quando não
respondeu sobre a lista tríplice e chamou Bolsonaro de “bobo da corte”. Também
se desgastou quando disse que a solução para o orçamento secreto era negociar
com os deputados.
Segundo a Quaest Pesquisa, Lula teve 48% de
menções positivas e 52% de negativas. Saiu-se melhor do que Bolsonaro, que teve
35% de aprovação, mas ficou aquém de Ciro Gomes, que somou 54%. Trocando em
miúdos, a percepção de que Lula nadou de braçada na entrevista do JN é válida
se examinarmos seu desempenho na tevê, mas isso não se traduz nas redes
sociais, onde os bolsonaristas são muito mais organizados do que os petistas.
As próximas pesquisas de opinião nos dirão se as entrevistas provocaram alguma alteração do quadro eleitoral. Amanhã, comento o desempenho de Simone Tebet (MDB) ontem à noite, no Jornal Nacional.
Esqueceram de perguntar ao Lula se ele se reconhece na série brasileira “ O Mecanismo”?
ResponderExcluirE Bolsonaro se reconhece em "O selvagem da motocicleta"? Ele também estrelou "O exterminador do futuro"...
ResponderExcluirMuito boa a análise.
ResponderExcluirDetesto is dois, perdeu seu tempo dando respostas, mas é que não aguento o fingimento do Lula e nem a malvadeza do Bolsonaro. Dois cinicos.
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