A moderação de Lula no debate - que muita
gente está interpretando como fraqueza – indica, a meu ver, que ele está lendo
corretamente o quadro. Ao contrário (para não variar) de Bolsonaro, que saiu
como um raio do debate, resmungando contra o mundo todo, nem sequer ficando
para as breves entrevistas de praxe do pós-debate. Mas são, sem dúvida, as
terceiras vias o que há de mais positivo e interessante a analisar, no momento.
Entre as duas candidaturas relevantes (politicamente) desse "campo" - Ciro Gomes e Simone Tebet - começa a se desenrolar um jogo muito interessante. Ambos foram bem porque trabalharam em paralelo, com distintas perspectivas, o que permite as distinções entre eles aparecerem, sem os colocarem, porém, em colisão, numa disputa ansiosa e estéril pelo terceiro lugar.
Ciro assumiu uma missão mais difícil neste
momento, que é a de se recusar a posição de outsider. Confronta ambos os polos,
simultaneamente. Já Simone auxilia Lula, neste momento, ao desgastar Bolsonaro.
Só foi para o embate com Lula quando provocada por ele. E foi muito bem.
Mas por que Lula provocou com Simone
justamente aquela conversa sobre corrupção? Talvez para não deixar o tipo de
simpatia que ela vem despertando nos últimos dias virar amor. Tentava provocar
nela um discurso lavajatista para afasta-la do playground onde ele vinha
desfilando sem óbices. Mas fez isso com habilidade e elegância para não fechar
portas ao futuro. E ela também não caiu no laço. Foi firme na crítica aos
governos do PT, mas também hábil e elegante com o adversário. Isso foi ótimo!
Ciro vai bem, mantendo sua pegada em
circunstâncias adversas e posicionado na moita. Parece apostar que, se e quando
o desgaste de Bolsonaro (com a ajuda de Simone) atingir o máximo possível, a
ponto de começar a perder eleitores, ele, Ciro, estará em posição melhor para
acolhê-los do que o anti-bolsonarismo de Simone. Se ele e João Santana
estiverem certos, Simone, confrontando-se com Bolsonaro, conquistará indecisos,
mas abrirá espaço para que Ciro, não ela, pesque em águas turvas de Bolsonaro.
Estratégia de risco, pois Simone pode tomar votos de Lula também e passar à
frente de Ciro.
Mas nenhum dos dois candidatos é amador
para fazer disso uma disputa particular, típica de Série B. Prometem uma
campanha de série A, mesmo que não possam, nesse momento, almejar o título.
É de supor que a campanha de Lula monitore
de perto o efeito do excelente desempenho de Simone Tebet. Pesquisas,
divulgadas ou não, ajudarão no monitoramento. Se em áreas até hoje inclinadas a
Lula Simone granjear apenas simpatia, será tratada com a gentileza de uma boa
linha auxiliar, que pode ser liberada a avançar, sem constrangimentos, sobre
eleitores indecisos. Mas sem ilusões: se ela for além e começar a conseguir,
além de simpatia, votos no eleitorado da centro-esquerda, aí poderá receber, do
time de Lula, o tratamento que Marina Silva recebeu na campanha de 2014. Esse
será, inclusive, o teste de fogo político de Tebet: mostrar que tem
consistência e conexão política e partidária relevantes para representar um
campo democrático alternativo ao petismo, ultrapassando a condição de outsider.
No fim das contas, as duas estratégias (a
de Simone e a de Ciro) não parecem ser o que a superfície revela. Confrontando
Bolsonaro, Simone mira, além de indecisos, também eleitores mais instáveis de
Lula; e Ciro, confrontando os dois mais bem posicionados em pesquisas, além de
também mirar indecisos, quer ganhar, no final, eleitores não-raiz de Bolsonaro.
Afinal, todo mundo confronta o "incumbente" e o eleitor que imigrar
de Bolsonaro não terá opção de pouso em terreno amigo, podendo optar por Ciro
como caminho alternativo mais pragmático contra Lula. Continua improvável que
qualquer um dos dois chegue ao segundo turno, mas o impulso desse debate pode
fazer com que Ciro Gomes e Simone Tebet melhorem paralelamente seus desempenhos
em intenções de voto, o que já é boa notícia. E lá adiante, quem sabe, até se
entendam objetivamente, criando um fato novo ainda maior.
Se pensarmos no beco em que se estava até a
campanha começar para valer, é possível dizer que se chegou, nessa semana, num
ponto do beco mais próximo de uma esquina com uma avenida. A terceira via não
se viabilizou para a campanha. Mas a campanha pode viabiliza-la.
Atenção para o mais importante! Nada disso
é apenas pequena política eleitoral. O crescimento da "tal" da
terceira via (com Simone incutindo aversão e indignação contra o bolsonarismo
em eleitores conservadores e Ciro atraindo para si parte do antipetismo)
realizará o que é, desde sempre, o sentido que o centro democrático tem na
grande política brasileira atual: deixar Bolsonaro restrito à sua raiz.
Claro que, além disso, ainda há que se
tirar do aventureiro também os votos que a demagogia a soldo de dinheiro
público pode lhe proporcionar. Mas essa não é uma missão do centro e sim de
Lula da Silva. Na resposta a esse desafio é que ele não pode falhar, porque
essa é a sua briga crucial.
*Cientista político e professor da UFB
Como sempre, uma ótima análise do Professor Paulo Fábio. Faltou apenas explicar o pífio desempenho da direita que realmente defende o Liberalismo Econômico, personificado na candidatura do Partido Novo.
ResponderExcluirFaz falta no Brasil uma direita civilizada.
ResponderExcluirDependente de Olavo de Carvalho e Bolsonaro, a direita é principalmente fascista e antidemocrática no Brasil. O que se pode esperar deste pessoal?
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