Folha de S. Paulo
Movimentos sociais indicam querer ir além dos consensos alcançados com manifestos
Os atos em defesa
da democracia realizados nesta quinta (11) na Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo reproduziram características que se revelaram
essenciais para alcançar o grande número de adesões
recebidas pelos dois manifestos que foram lidos.
A maioria dos oradores usou seus discursos
para reforçar os pontos que deram equilíbrio aos textos, enaltecendo os valores
da Constituição de 1988, expressando confiança na integridade do processo
eleitoral e rejeitando qualquer tipo de ruptura
da ordem democrática.
Na escolha dos oradores e na cenografia,
valorizou-se a diversidade e a simbologia. Cantou-se o hino nacional no começo
da festa e no encerramento. Três
mulheres e um homem branco leram a carta dos ex-alunos da USP. Uma
delas era negra, e as três vestiam branco e amarelo.
Das 13 pessoas que se revezaram ao microfone antes da leitura do manifesto articulado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) com outras entidades, 7 representavam centrais sindicais e movimentos sociais que aderiram ao documento quando estava pronto.
Partiram deles as raras notas dissonantes
do coro, incluindo duas menções discretas, mas reconhecíveis por todos, ao
presidente Jair
Bolsonaro (PL). Seu nome não foi pronunciado por nenhum dos oradores
para evitar acusações de partidarismo que poderiam mitigar o impacto dos atos.
Candidatos às próximas eleições e políticos
habituados aos holofotes foram mantidos longe dos microfones e dos palcos
centrais. Gritos de repúdio a Bolsonaro e a favor de seu adversário na corrida
presidencial, Luiz
Inácio Lula da Silva (PT), só foram proferidos pelos manifestantes no
fim.
O reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti
Junior, fez menção às 47 pessoas da comunidade universitária mortas pela
repressão política nos anos da ditadura militar (1964-1985), e a presidente da
União Nacional dos Estudantes (UNE), Bruna Brelaz, citou os líderes estudantis
que tombaram na mesma época.
Coube à advogada Beatriz Lourenço do
Nascimento, representante da Coalizão Negra por Direitos, lembrar as vítimas da
brutalidade dos dias atuais ao mencionar a morte do adolescente João
Pedro Mattos Pinto, baleado numa ação policial na região metropolitana do
Rio, há dois anos.
"Enquanto houver racismo, não haverá
democracia", discursou Nascimento. O empresário Horácio
Lafer Piva,
acionista da Klabin, falou depois dela e procurou reforçar a mensagem principal
dos manifestos, em torno de consensos mínimos. "Sigamos juntos",
afirmou.
Miguel
Torres, líder dos metalúrgicos de São Paulo e presidente da Força Sindical,
propôs a convocação de uma assembleia permanente dos movimentos que apoiaram a
carta articulada pelos empresários. Ao discursar, convocou todos na plateia a
ficarem de pé e levantarem os braços, de mãos dadas, em sinal de aprovação.
Todos responderam positivamente ao apelo de
Torres, mas ao final dos eventos ninguém sabia ainda qual será o próximo passo
—nem mesmo o autor a ideia. As centrais sindicais devem se reunir na próxima
semana com o fim de discutir o que fazer para evitar que a energia gerada pelos
manifestos se dissipe.
Os articuladores dos documentos planejam realizar
eventos com os presidenciáveis que os apoiaram e a cúpula do Poder Judiciário,
mas até participantes da redação da carta dos ex-alunos da USP não sabiam o que
acontecerá. Movimentos
populares planejam manifestações nas principais capitais no dia 10 de
setembro.
As falas dos representantes dos movimentos sociais nos atos desta quinta sugerem que muitos apoiadores dos manifestos querem ir além dos consensos estabelecidos pelos documentos em defesa da democracia. Os próximos passos colocarão à prova a solidez dos compromissos celebrados nesta quinta.
Vamos torcer agora para Bolsonaro não ganhar nas urnas.
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