sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Maria Cristina Fernandes - A eleição que desafiou 37 anos de democracia

Valor Econômico

Polarizada pelo alto grau de definição dos eleitores, campanha tem a 3ª via menos expressiva desde 1989

O Brasil chega à sua décima eleição presidencial desde a redemocratização depois de enfrentar a maior ameaça às instituições que a garantiram. Polarizada desde o início, com alto grau de definição do voto, esta é também a eleição em que a terceira via deverá ter o menor percentual de votos.

Nenhuma outra campanha da história brasileira antagonizou, como esta, o presidente-candidato e o Tribunal Superior Eleitoral. Desde a redemocratização, o Ministério da Defesa e o comandante do Exército jamais haviam respaldado a desconfiança nas urnas eletrônicas como os atuais o fizeram.

O ataque às instituições eleitorais desencadeou manifestações de apoio e confiança de seis emissários do governo americano, em visita ao Brasil, inclusive o secretário de Defesa, Lloyd Austin. Em carta, 50 eurodeputados pressionaram a Comissão Europeia por um repúdio inequívoco à subversão das regras democráticas no Brasil.

O apoio doméstico ao TSE foi demonstrado na posse do ministro Alexandre de Moraes à qual compareceram todos os ex-presidentes, à exceção de Fernando Henrique Cardoso, por enfermo, todos os ministros do Supremo Tribunal Federal, além dos principais candidatos à Presidência e aos governos, governadores e presidentes das casas legislativas.

O tom belicoso adotado ao longo do governo e da campanha colaborou para que Jair Bolsonaro, quarto presidente a disputar a reeleição, seja rejeitado por mais da metade do eleitorado. Foi com este patamar de repúdio que Fernando Haddad perdeu a disputa pela Presidência em 2018.

Depois de vencer nas asas do antipetismo, o presidente enfrentou, na campanha, a muralha do antibolsonarismo. Quatro anos depois de chegar ao Palácio do Planalto, o presidente transformou-se no principal cabo eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Ao longo da campanha, a taxa de aprovação do governo melhorou com a redução na inflação, o aumento do emprego e um pacote incomum de benesses num ano eleitoral, a começar pelo aumento do Auxílio Brasil e por quatro reduções no preço da gasolina.

A dificuldade de angariar votos entre os beneficiários do Auxílio Brasil, segmento em que se manteve em desvantagem ao longo de toda a campanha, sepulta uma percepção, longamente acalentada, de que o voto dos mais pobres é “comprado” por benefícios como o Bolsa Família ou o Auxílio Brasil.

A avaliação pessoal do presidente não seguiu a melhora na percepção sobre o governo. Nos últimos dez meses, segundo o Datafolha, a avaliação positiva do governo cresceu dez pontos percentuais, enquanto a rejeição do presidente nunca esteve aquém dos 50%.

Colaboraram para a manutenção dos patamares elevados da rejeição presidencial a opção pela valoração do discurso armamentista, o ataque às urnas e a incúria na pandemia, que poderia ter evitado até 400 mil das 680 mil mortes. É no eleitorado feminino que Bolsonaro colhe os piores indicadores de sua rejeição.

Diferentemente de 2018, quando disputou por dois partidos marginais, PSL e PRTB, sua coligação tem três das maiores legendas do Congresso, PL, PP e Republicanos. A aliança lhe deu o segundo maior tempo no horário eleitoral (2’39”), ao contrário de 2018, quando teve só oito segundos.

O aparato de propaganda surtiu não surtiu efeito na rejeição bolsonarista ou na sua intenção de voto. Ao longo dos 45 dias do horário eleitoral, ambos os índices se mantiveram inalterados.

O ex-presidente Lula, por outro lado, atraiu um antigo adversário, o ex-governador Geraldo Alckmin, e reuniu uma coligação de dez legendas (PT, PSB, PCdoB, Psol, Rede, PV, Solidariedade, Avante, Pros e Agir), que se equiparou ao recorde estabelecido pela campanha de Dilma Rousseff em 2010.

Além da ampliação partidária, Lula avançou sobre a elite política, jurídica e empresarial, avessas ao petista desde a Lava-Jato. Ao longo das últimas semanas, formalizaram apoio a Lula ministros do STF do “Mensalão” e do “Petrolão”.

A ideia de que estava em curso não uma disputa política mas a sobrevivência da democracia embalou iniciativas como a “Carta às brasileiras e brasileiros em defesa do estado democrático de direito” e beneficiou a candidatura petista.

O movimento acabou por contagiar partidos historicamente adversários do PT. Ex-ministros de governos Fernando Henrique Cardoso, Itamar Franco e Michel Temer declararam apoio, bem como protagonistas do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e formuladores do Plano Real.

Depois de adiar ao máximo encontros empresariais ampliados, o ex-presidente foi recebido nesta semana por alguns dos maiores empresários e banqueiros do país. Apesar do assédio, Lula não detalhou planos para a economia nem o ministro da Fazenda se eleito.

Incapaz de reagir à avalanche bolsonarista nas redes sociais em 2018, o PT foi capaz de montar uma estrutura de comunicação que gastou mais que a de Bolsonaro com impulsionamento nas redes sociais e rivalizou com a do presidente em engajamento.

Contribuiu ainda para a comunicação de Lula a adesão do deputado federal André Janones (Avante-MG), que desistiu da postulação presidencial para assumir, na campanha lulista, a porção mais agressiva da estratégia digital.

A estratégia de colar a campanha na defesa da democracia ampliou a frente de apoios, mas também serviu de subterfúgio para Lula não detalhar seu programa de governo. Esta é uma das razões pelas quais houve tão pouco dissenso interno na campanha.

Nos 90 pontos do programa registrado no TSE, a aliança demonstra comprometimento com a questão climática, recuou na intenção de rever a reforma trabalhista do governo Michel Temer. A campanha ainda sinaliza com a manutenção da autonomia do Banco Central e com uma reforma administrativa. Permanece um vazio de definições sobre a âncora fiscal capaz de respaldar a recuperação do investimento público e das políticas sociais.

Na campanha petista, a expectativa é que tanto Lula quanto Bolsonaro deverão crescer na reta final em cima de indecisos e do voto útil egresso dos eleitores de Ciro Gomes e Simone Tebet. Como Lula já está, segundo o Datafolha, com 50% dos votos válidos, este impulso final garantiria a vitória no primeiro turno.

A viagem do petista à Fortaleza e a Salvador, nesta sexta, porém, além de alavancar votos no eleitorado cearense e baiano, visam a impulsionar as candidaturas locais de Elmano Freitas (PT) e Jerônimo Rodrigues (PT), já que, se houver segundo turno, Bolsonaro terá nas candidaturas de Capitão Wagner (Republicanos), no Ceará, e ACM Neto (União Brasil), na Bahia, palanques competitivos.

Independentemente da disputa pelo Palácio do Planalto, o Congresso que se avizinha, de baixa renovação, imporá grandes dificuldades para o próximo presidente manobrar o Orçamento dado o bloqueio representado pelo poder dos parlamentares sobre as emendas de relator.

 

3 comentários:

  1. "Diferentemente de 2018, quando disputou por dois partidos marginais". MARGINAIS mesmo, no sentido policial da palavra! Outro partido marginal é o presidido pelo criminoso Roberto Jefferson, impedido de concorrer por estar condenado, e que foi substituído pelo religioso fake Kelmon, tão miliciano quanto o presidente do PTB. Autoproclamado "padre", o padreco é sócio de Bolsonaro, mas se fantasiou de candidato pra poder funcionar como cabo eleitoral do genocida nos debates.

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  2. Padre impostor, um laranja mesmo.
    Falso, como tudo ao redor do bozo.
    Bozo deixou nosso país caótico, angustiado.
    Só algo pode ser pior do q o quadro atual: mais 4 anos pro genocida.

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  3. O PT só perdeu em 2018 porque Lula estava preso,as pesquisas lhe davam 20 pontos à frente de Bolsonaro.

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