quinta-feira, 8 de setembro de 2022

Maria Cristina Fernandes - A virilidade de um acuado

Valor Econômico

Bolsonaro coloca-se em primeiro plano para deixar o Brasil em segundo

Foi um presidente acuado que subiu ao palanque para conclamar sua própria virilidade no palanque do 7 de setembro. No ano passado estava sob cerco do Judiciário. Permanece, haja vista a ausência dos chefes de Poderes no palanque da parada militar, mas quem, de fato, o acua este ano - e mais compromete seu futuro - é o eleitor. Nenhuma pesquisa séria considera sua reeleição o cenário mais provável.

O presidente Jair Bolsonaro afrontou não apenas o Estado, mas a nação aniversariante e a Justiça Eleitoral ao fazer do Bicentenário um palanque. Nem se tivesse xingado os ministros, como o fez no ano passado, teria afrontado tanto o TSE. Teve extensa cobertura ao vivo das TVs e redes sociais, numa flagrante desigualdade de exposição em relação aos demais candidatos. A 26 dias da eleição, porém, dificilmente sete ministros serão capazes de tirá-lo do jogo. No limite, o impedirão de usar as imagens no horário eleitoral.

Em 2021, o ministro Alexandre de Moraes, comandante do inquérito dos atos antidemocráticos, era o “canalha”. Este ano, Bolsonaro chamou para si o atributo. Depois dos ataques em série a mulheres jornalistas, é possível que Bolsonaro enxergue uma valoração eleitoral na definição, supostamente autorreferenciada, de “imbrochável”. Sua nora, Heloisa Bolsonaro, foi orientada no mesmo sentido, dias atrás, quando, num evento em Porto Alegre, conclamou a submissão das mulheres aos maridos.

O presidente valeu-se de Michelle Bolsonaro, vestida de boneca com laço na cintura, para agredir as eleitoras de seu adversário com uma analogia carimbada: “Podemos fazer várias comparações. Até entre as primeiras-damas. Não há o que discutir. Uma mulher de Deus, com presença ativa na minha vida. Não é ao meu lado. Muitas vezes está à minha frente. Procurem uma princesa, se casem com ela para serem mais felizes ainda”.

Bolsonaro sabe que esses valores, numa sociedade em que tantas mulheres chefiam famílias, não são majoritários. Se coloca sua virilidade em primeiro plano é porque precisa colocar o Brasil em segundo. Nem “bicentenário”, nem “independência” entraram no discurso do presidente candidato na Esplanada ou em Copacabana.

O mesmo tom guiou o apelo a uma pátria “majoritariamente cristã, que não quer a liberação de drogas, nem a legalização do aborto, não admite a ideologia de gênero e combate a corrupção pra valer”. Bolsonaro até louvou o preço dos combustíveis, o Auxílio Brasil, a queda na inflação e no desemprego, mas o foco era outro.

Não dá para dizer que tenha fracassado por completo em seus propósitos. Os eventos tiveram um bom público no Distrito Federal, no Rio e em São Paulo, onde Bolsonaro não pisou. Tem imagens para municiar a falácia de que a “verdadeira pesquisa” é a rua.

Se a ausência dos presidentes dos Poderes corrobora a ideia de isolamento institucional de Bolsonaro também contribui para a imagem voluntarista com a qual se apresenta ao eleitor. A roupagem contida do seu voluntarismo, porém, lhe permitirá assumir a condição de moderador de uma base eleitoral que tem sido levada à radicalização nas últimas semanas com o propósito de amedrontar o eleitor.

A ameaça, viu-se, não é militar. A farda deu-lhe o fausto e o artifício, mas o golpe pretendido é o do medo. Como tem sido incapaz de reverter a trajetória das pesquisas, a saída é impedir o voto no seu adversário. Como? Pelo medo de tudo, mas especialmente da insegurança que se pretende fazer imperar nas ruas. Taí um quesito no qual o bolsonarismo é imbatível.

De imediato tem a meta de ampliar a abstenção, tradicionalmente mais alta entre os mais pobres, majoritariamente eleitores do líder das pesquisas, para evitar uma derrota no primeiro turno, cenário ainda não completamente descartado.

A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal reportou um evento sem ameaças, mas estas não faltaram nos dias que antecederam a parada militar e nada impede que voltem a ocorrer no dia seguinte.

Da Secretaria de Comunicação Social da Presidência saíram mensagens por WhatsApp das “ameaças comunistas” ao longo da história; de Eduardo Bolsonaro veio o convite para que os eleitores do pai, se armados, adiram ao exército de “voluntários” da campanha; e do candidato à reeleição partiu a tentativa de forçar as barreiras policiais do Distrito Federal na véspera do desfile.

Na traficância das ameaças o que não faltam são aviõezinhos, como o pastor Silas Malafaia, que chegou a pedir que as urnas fiquem paralisadas no dia das eleições, ou a fabricante de armas (Taurus), que resolveu dar desconto em fuzil para quem comprar seus produtos.

O TSE foi mais ágil em farejar as ameaças do que em impedir a farra bolsonarista no dia da pátria. A reunião mais longa e com o maior número de participantes da Corte eleitoral na temporada aconteceu na última semana de agosto entre seu presidente e os comandantes da PM nos Estados. Primeiro pelo ineditismo do formato. Ministros do Supremo se reúnem com governadores e, no limite, com secretários de Estado. Alexandre de Moraes cortou caminho e foi direto em quem comanda.

Esperavam-se dez. Foram os 27. Começou às 9h com previsão para durar 2 horas, mas avançou sobre a hora do almoço dos participantes. Não houve um depoimento que não fosse de continência às ordens do ex-secretário de segurança de São Paulo, hoje na presidência do TSE. Até o comandante da PM do Rio tocou de ouvido.

São os PMs que, no dia 2, serão chamados a dar conta das situações mais comuns. Do eleitor que desafiar a proibição de entrar na cabine com o celular, aos detentores de porte de arma que ignorarem a suspensão dos decretos que o liberalizaram. As tropas do Exército requeridas, 20% superiores às de 2018, não permanecem no perímetro dos 100 metros dos locais de votação. O território é das PMs.

Que efeito surtirá sobre o comparecimento eleitoral uma ofensiva de amendrontamento? Nas eleições de 2014 e 2018, a abstenção variou entre 19% e 20%. Os mais velhos e mais pobres são os que mais se abstêm. Em 2018, apenas no Sudeste, 14 milhões deixaram de votar no primeiro turno de 2018.

Entre os amedrontados pode estar também o eleitor indeciso de quem Bolsonaro precisa. Se hoje imaginou que assistiria aos festejos da nacionalidade, limitou-se, na verdade, a ver um presidente-candidato cavalgar a efeméride para dar palanque à vergonha nacional.

 

Um comentário:

  1. Anônimo8/9/22 15:03

    A virilidade de Bolsonaro é só da boca pra fora... Bolsonaro está se borrando de medo de não chegar no segundo turno e ter que começar a pagar suas penas em 2023. Ele sabe que é tão imbrochável quanto é bom militar. Sempre foi conhecido como bunda suja, e que potência sexual pode ter um sujeito nesta triste condição?

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