domingo, 25 de setembro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

A relevância política dos evangélicos

O Globo

Aproximação entre religiosos e políticos merece atenção quando ameaça o caráter laico do Estado

São óbvias as razões que levam Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro a cortejar o apoio de evangélicos. Como mostrou uma série de reportagens no GLOBO, no começo da década de 1990 havia 30 mil templos em todo o país. De lá para cá, o número pulou para mais de 178 mil. Na ausência de um Censo recente, não se sabe ao certo quantos professam tais religiões. Os institutos de pesquisa estimam em cerca de 25% dos eleitores. Se, há três décadas, políticos em busca de votos já faziam peregrinação por igrejas de diferentes denominações, hoje a atenção se tornou prioridade.

Nem sempre esse interesse é benigno. O proselitismo político em templos deveria ser evitado por todos. Infelizmente não é assim. A Igreja Católica tem regras sobre a participação de sacerdotes em disputas eleitorais. Em várias denominações evangélicas, porém, religião e política se confundem. Não há problema se candidatos defendem valores de sua religião ou se pastores prestam apoio a candidaturas fora de suas atribuições sacerdotais. O problema começa quando se usa o púlpito para pedir votos ou quando se quer influir em políticas públicas em favor de medidas que ameaçam o caráter laico do Estado. É por isso que a aproximação entre os religiosos e a política merece atenção permanente.

Em época de campanha, tudo o que os candidatos querem é conquistar esse eleitorado. Na disputa deste ano, o PT demonstra ter mais dificuldade. É certo que Lula vem galgando apoio entre os evangélicos. Saiu de 26% no final de agosto para 32% na semana passada, segundo o Ipec. Apesar disso, Bolsonaro tem mantido vantagem nunca menor do que 16 pontos percentuais.

Embora costumem ser tratados como bloco monolítico, os evangélicos são um grupo plural. Há as igrejas da Reforma Protestante do século XVI (batistas, presbiterianos, metodistas, luteranos e anglicanos); as igrejas pentecostais (movimento criado nos Estados Unidos no início do século XX); e as neopentecostais (criadas a partir da década de 1970). Diferenças teológicas somem diante de pautas comuns, como o perdão às dívidas de igrejas, conquista da bancada evangélica no Congresso.

Parte do apoio recebido por Bolsonaro pode ser explicada pela defesa desse tipo de demanda de interesse pecuniário. Mas não só. Outro componente são as guerras culturais. As declarações do presidente sobre família e sexualidade encontram eco genuíno no público evangélico. Bolsonaro é o primeiro presidente a fazer campanha como cristão, apesar da nada cristã defesa das armas, à qual os pastores que o bajulam fazem vista grossa, assim como aos erros do governo na pandemia.

Republicanos e PL são os partidos que atraem mais parlamentares evangélicos, mas há representantes noutras legendas. A pulverização partidária dá aos líderes religiosos muitas opções. Chama a atenção haver poucos petistas na frente evangélica da Câmara: quatro entre 187 deputados.

Em governos anteriores do PT não houve dificuldade para obter apoio das principais denominações. Caso se confirme a vitória de Lula em outubro, será interessante observar como reagirão os pastores hoje colados em Bolsonaro. Continuarão fiéis à pauta bolsonarista de costumes, ainda que isso represente um lugar na oposição? Ou serão parte da base governista em troca do apoio a decisões que os beneficiem? Ficou impossível analisar a política brasileira sem levar em conta os evangélicos.

Risco de volta da pólio exige urgência do governo federal na vacinação

O Globo

Campanha nacional que previa alcançar 11,5 milhões de crianças vacinou menos de 4 milhões

O governo federal, estados e municípios têm o dever urgente de vacinar contra a poliomielite pelo menos 95% das crianças com menos de 5 anos para impedir o retorno da doença. A campanha que começou em 8 de agosto com prazo de um mês foi prorrogada até 30 de setembro. O motivo? Números vergonhosos. A meta da campanha era vacinar cerca de 11,5 milhões de crianças, mas menos de 4 milhões tinham sido vacinadas.

Em 2021, apenas 69% das crianças brasileiras foram imunizadas, nível bem abaixo do considerado seguro para evitar o ressurgimento da doença. Em 2013, foram 100%; um ano depois 96%; em 2015 98%. “Durante a pandemia, a cobertura da pólio caiu no mundo inteiro, mas a queda foi mais acentuada no Brasil”, afirma Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações.

O desleixo poderá ter consequências graves agora que novos casos foram identificados fora do Paquistão e do Afeganistão, os dois países onde a pólio continua endêmica. Há registros recentes nos Estados Unidos e em Israel. O vírus também foi achado no esgoto do Reino Unido.

A pólio é uma tragédia. Nos casos mais graves, pode causar insuficiência respiratória e até matar. A paralisia permanente é outro desdobramento possível. Quem tem 50 anos ou mais provavelmente lembra as crianças vítimas da doença, em cadeiras de rodas ou muletas.

O combate eficaz à pólio foi uma das poucas marcas positivas do governo João Figueiredo. Em 1980 foram registrados 1.300 casos (o número real era maior devido à subnotificação). Uma campanha ampla de vacinação mudou o quadro ao mobilizar todas as esferas de governo, sociedades médicas e entidades da sociedade civil. No ano seguinte, o total de infectados caiu para 122. Em 1983, foram 45. Antes do final da década foi zerado. O Brasil recebeu o certificado de área livre da pólio em 1994.

Foi um grande passo depois de uma história que começou em 1911, com a primeira descrição de um surto no Brasil, obra do pediatra carioca Fernandes Figueira. A vacina Sabin foi introduzida no país na década de 1960, mas foi só nos anos 1970 que as campanhas começaram a deslanchar. Na década de 1980, o personagem Zé Gotinha foi fundamental para incentivar as crianças a comparecer aos postos de vacinação.

Enquanto a doença existir em qualquer país, haverá o risco de novas epidemias. O vírus da pólio é mais contagioso que o Sars-CoV-2. Nos últimos anos, o descaso de pais e responsáveis com a vacinação trouxe de volta o sarampo. O Brasil não pode retroceder dessa forma outra vez. Temos recursos, profissionais especializados e experiência para manter o país livre da pólio. O que falta é o governo federal coordenar um trabalho eficaz de engajamento dos entes federativos e da sociedade civil. Poderia começar por condicionar o pagamento de programas como o Auxílio Brasil à vacinação. A regra existe, mas não tem sido aplicada.

Tiro no pé

Folha de S. Paulo

Ao omitir economia, Lula desrespeita o eleitor e pode perder votos conservadores

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se aproxima de uma possível terceira vitória para a Presidência em seis tentativas desde 1989. Esse velho conhecido da política brasileira, paradoxalmente, é fonte de grande incerteza quando se trata de antecipar os caminhos de governo que pretende trilhar caso as urnas confirmem seu favoritismo.

Com 50% das intenções de votos válidos na mais recente pesquisa do Datafolha, o petista aumentou as suas chances de eleger-se no escrutínio do próximo domingo (2), dispensando o segundo turno.

Essa perspectiva torna ainda mais criticável a esquiva do ex-presidente de deixar claro quem dará as cartas na política econômica num novo governo --decisão que na tradição brasileira permite prever para que rumo esse setor crucial da administração irá caminhar.

A economia, além de vertebral em qualquer governo, desponta como tema urgente do próximo mandatário. Evitar a recaída na inflação, assegurar que haja recursos para os mais pobres no Auxílio Brasil e manter as condições para um crescimento sustentado do emprego e da renda é do interesse imediato de toda a sociedade.

Mas a esse respeito a campanha de Lula, errática, solicita um cheque em branco do eleitorado.

De um lado, o ex-presidente acena ao programa responsável que caracterizou seu primeiro governo. Compôs chapa com o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB) e nesta semana recebeu apoio de Henrique Meirelles (União Brasil), chefe do Banco Central nos dois primeiros mandatos petistas e ministro da Fazenda de Michel Temer (MDB).

Do outro, o candidato petista arremete contra o teto de gastos públicos sem apresentar substituto, alardeia aumentos de despesas fora da capacidade orçamentária, flerta com quem despreza a autonomia do BC e com o retorno das políticas intervencionistas dos ideólogos do PT, as mesmas que produziram um desastre econômico.

Restam óbvios os ganhos para Lula de comprometer-se com a orientação adotada na sua primeira passagem pelo Planalto. A caminhada para o centro alargaria a base de votos para além dos petistas, tornando mais provável a vitória eventualmente em primeiro turno, e melhoraria desde logo as perspectivas de governabilidade. Não fazê-lo é um tiro no pé.

Mesmo na hipótese de Lula dobrar a aposta intervencionista, é melhor deixar isso claro para evitar o estelionato eleitoral após a posse.

O país deveria saber, e antes da votação, para onde rumaria a quinta gestão petista, se para o programa estatista que ainda encanta boa parte dos economistas do partido ou se para a abordagem pragmática que combina liberalismo econômico e responsabilidade social.

Mais um escândalo

Folha de S. Paulo

CGU constata mau uso de verbas no MEC, que agrava desigualdades entre municípios

Em poucas áreas da gestão o desgoverno de Jair Bolsonaro (PL) se apresenta de modo tão explícito como no Ministério da Educação.

Não bastasse a barafunda administrativa provocada pela constante troca nos cargos de direção, os desvarios ideológicos e a omissão durante a pandemia, na qual abdicou da tarefa de coordenar o esforço de estados e municípios, o MEC, sabe-se hoje, tornou-se também palco de operações nebulosas e mau uso de verbas públicas.

Um relatório elaborado pela Controladoria-Geral da União e obtido por este jornal aponta que o governo federal desprezou critérios técnicos na transferência de recursos do ensino —o que não só distancia a pasta de sua missão constitucional como ainda abre margem para a consecução de "acordos escusos".

O documento se detém especialmente sobre operações realizadas em 2021 com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, entregue ao centrão fisiológico.

O FNDE, cumpre recordar, esteve no centro do escândalo envolvendo dois pastores que, com a anuência do ex-ministro Milton Ribeiro, negociavam com prefeituras a liberação de dinheiro.

Todas essas ações, segundo a CGU, se deram sob o guarda-chuvas do Plano de Ações Articuladas, mecanismo pelo qual são feitas as transferências para municípios em ações como obras, compra de materiais e ônibus escolares.

A distribuição desses recursos deveria seguir um ranking elaborado a partir de indicadores sociais e educacionais, a fim de que fossem priorizadas as cidades mais necessitadas. Entretanto a controladoria constatou que a lista foi ignorada, resultando numa alocação de verbas que favoreceu municípios já em melhor situação.

No ano passado, o FNDE empenhou R$ 170,7 milhões para 538 localidades em condições precárias —atendendo, assim, 32% do universo mais vulnerável e 26% de alunos com esse perfil. Mas reservou o dobro desse montante (R$ 348,7 milhões) para 809 cidades mais ricas (57% dos municípios desse grupo e 44% dos alunos).

Listam-se liberações determinadas, sem motivação técnica clara, pelo próprio presidente do FNDE.

Por óbvio, tais ações precisam ser investigadas, e os autores de eventuais desmandos, punidos —mas o descontrole no uso de recursos públicos, bem como suas consequências nefastas para o aumento da desigualdade, constituem, por si sós, mais um escândalo no MEC.

Bolsonaro prejudica Bolsonaro

O Estado de S. Paulo

No cenário atual, com inflação em queda e emprego em alta, qualquer presidente teria chances de reeleição, por isso se pode dizer que Bolsonaro não sobe nas pesquisas por ser quem é

O cenário econômico e social, se não chega a ser deslumbrante, é menos sombrio do que o observado até há alguns meses. À retomada do crescimento econômico juntou-se a expressiva queda da inflação e, sobretudo, a redução da taxa de desemprego. Há mais pessoas trabalhando hoje do que nas vésperas da eleição presidencial de 2018 e há menos brasileiros sem ocupação. Presidentes que se candidataram à reeleição enfrentaram problemas de diferentes naturezas, mas, ainda assim, tiveram êxito. No caso de Bolsonaro, porém, as pesquisas mostram que, apesar da melhora do quadro econômico, sua reeleição parece difícil.

Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, foi reeleito em 1998 a despeito de sérios problemas cambiais que o País enfrentava no momento por causa da crise russa, que exigiu a explosiva elevação dos juros internos para quase 50% ao ano nas vésperas da eleição. Luiz Inácio Lula da Silva reelegeu-se em 2006 mesmo em meio ao grave escândalo do mensalão. E Dilma Rousseff, conhecida pela gestão medíocre em seu primeiro mandato, teve seu prestígio fortemente corroído pelas multitudinárias manifestações de 2013 e ainda assim alcançou a reeleição em 2014.

Ter a visibilidade garantida pelo cargo e a poderosa caneta para liberar verbas e controlar as ações do governo, que afetam todos, são os fatores que, em geral, explicam parte da vantagem que o candidato à reeleição costuma ter sobre seus adversários. Bolsonaro tem tudo isso e ademais, no momento, conta com uma base governista experiente e veterana de eleições, além das circunstâncias razoavelmente favoráveis para impulsionar suas pretensões eleitorais.

A inflação, que estava acima de 10% no acumulado de 12 meses, vem baixando por causa do registro de duas deflações mensais sucessivas, e as projeções para este ano continuam a cair. A mais recente é de cerca de 6%. Até há poucos meses, as previsões para o crescimento da economia não passavam de 0,5%, um resultado fraquíssimo. Agora, predominam previsões de que o Produto Interno Bruto (PIB) crescerá 2,7% em 2022. O desemprego, que chegou a 14,9% da força de trabalho no auge da pandemia de covid-19, em 2020, hoje está em 9,1%. Há quatro anos, quando Bolsonaro foi eleito, a taxa de desocupação medida pelo IBGE era de 12,4%.

A tudo isso Bolsonaro acrescentou medidas populistas, como o controle dos preços dos combustíveis – que vem tendo efeito notável sobre a inflação nos últimos meses –, o aumento do valor de benefícios sociais e a expansão da oferta de crédito para a população de baixa renda. 

Nem assim, contudo, a popularidade do presidente sobe. Pode-se creditar esse fenômeno à persistência de dificuldades para as famílias mais pobres. A renda real média do trabalho é menor do que a de quatro anos atrás. Embora tenha havido deflação em julho e agosto, o preço da comida continuou a subir. E a evolução da taxa de ocupação vem acompanhada do aumento do trabalho informal e do subemprego.

Tudo isso é verdade, e provavelmente pesa na equação da impopularidade do presidente, mas, em essência, o problema de Jair Bolsonaro é Jair Bolsonaro. Sua gestão, marcada por gritante falta de planejamento e por atitudes erráticas, é reflexo de sua total inapetência pelo trabalho. Deixou a terceiros, em geral incompetentes e movidos a obsessões ideológicas, a responsabilidade por tomar decisões que lhe cabiam como chefe de governo, enquanto gastava seu tempo em desfiles de moto e comícios fora de época. Daí resultam os desastres na educação, na saúde, na questão ambiental e na gestão fiscal. Por palavras, atos e omissões, Bolsonaro criou suas próprias crises – e o eleitor em geral parece inclinado a julgar o presidente pelo conjunto de sua gestão, e não somente pelos últimos três meses.

Mas a grande façanha de Bolsonaro foi ter transformado Lula da Silva, líder de um partido absolutamente desmoralizado por escândalos de corrupção e por incompetência administrativa, em grande favorito para voltar à Presidência. É um feito impressionante, que deixará seu nome marcado na história.

A inflação embutida nas falas eleitorais

O Estado de S. Paulo

Candidatos prometem mexer no teto de gastos e afrouxar a disciplina fiscal, prenunciando maior incerteza econômica e dificuldade para levar inflação à meta de 3% nos próximos anos

Levar a inflação à meta de 3% poderá ficar mais difícil, nos próximos anos, se o controle das contas públicas for afrouxado, advertem economistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast. A advertência é especialmente importante, neste momento, porque os principais candidatos à Presidência prometem mexer no teto de gastos e nos padrões fiscais. Além de se comprometer com a austeridade, os candidatos deveriam, segundo os analistas, levar em conta a expectativa de fortes pressões inflacionárias nas grandes economias.

Quem ocupar o Palácio do Planalto a partir de janeiro terá de se preocupar, ao mesmo tempo, com a gestão orçamentária, a taxa de juros, a expectativa dos investidores, a taxa de câmbio, os preços essenciais, o mercado global e as ações necessárias para um crescimento econômico duradouro. Um claro compromisso com a disciplina fiscal e com a contenção da dívida pública será um sinal muito positivo e muito favorável à movimentação do setor privado.

Sinais de gastança e de menor cuidado com as contas federais transmitirão insegurança, resultarão em dólar mais caro e tornarão mais lenta a redução dos juros pelo Banco Central (BC). Juros elevados aumentarão os custos do Tesouro e prejudicarão, ao mesmo tempo, o consumo familiar, o crédito às empresas pequenas e a aceleração dos negócios. A retomada econômica ensaiada neste ano poderá perder impulso, em pouco tempo, se a incerteza aumentar.

Uma disposição firme e visível de prudência fiscal produzirá, além de confiança entre empresários e investidores, melhores condições para o financiamento do setor privado e maior flexibilidade para ações anticrise. Um governo prudente buscará produzir superávits primários – saldos fiscais positivos sem contar o custo da dívida pública. Concebida no final da administração tucana, essa política foi observada por vários anos na administração petista e abandonada, de forma desastrosa, na gestão da presidente Dilma Rousseff.

Mantida quando as condições são favoráveis, a obtenção regular de excedentes primários garante segurança para a realização oportuna de ações expansionistas, necessárias quando a economia se enfraquece perigosamente ou afunda em recessão. Além disso, a busca regular de superávits desse tipo facilita o controle do endividamento público, aumenta a previsibilidade, sustenta a confiança dos investidores e contribui para a estabilidade e a segurança da economia.

Nenhum governo pode alardear seriedade fiscal, é importante lembrar, quando recorre a truques ou a espertezas para limitar os gastos anuais. Não se pode falar de política séria quando se adia o pagamento de precatórios, impondo perdas a credores defendidos por decisões judiciais.

Da mesma forma, ninguém deve confundir com austeridade a negligência em relação a despesas fundamentais, como aquelas vinculadas à manutenção e ao fortalecimento das políticas de ensino. Uma das características mais notáveis da atual administração tem sido o corte de verbas destinadas ao setor educacional e à pesquisa.

Nem a pesquisa agropecuária, essencial para o setor mais competitivo, fonte principal da receita obtida no comércio exterior, tem sido preservada pela administração bolsonariana. Que o presidente Jair Bolsonaro ignore o peso econômico do agronegócio, assim como a relevância da pesquisa, pode parecer natural e nada surpreendente, quando se considera seu currículo. Deveria haver no Ministério da Economia alguém capaz de fazer soar um alerta. O ministro Paulo Guedes parece omitir-se dessa tarefa.

Qualquer governo bem preparado tentará implantar, além da disciplina fiscal, maior produtividade na administração. Um ganho importante já será proporcionado pela expansão da eficiência no dia a dia. Isso será possível com novos padrões de trabalho e de organização, algo muito mais ambicioso que a reforma administrativa proposta pelo ministro da Economia, uma justificável, mas limitada reforma de RH. Falta verificar se a semente de algum governo bem preparado será plantada com a eleição de outubro.

Pequenos negócios expandem o crédito

O Estado de S. Paulo

Aumento de 57% do volume de crédito para empresas menores neste ano estimula a atividade econômica

Os pequenos negócios estão mostrando grande interesse por crédito. Entre o primeiro e o segundo trimestres deste ano, o volume de crédito para pequenos negócios aumentou 57%, tendo alcançado R$ 92,8 bilhões, segundo levantamento do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). É o maior crescimento entre dois trimestres sucessivos já registrado pela pesquisa do Sebrae, que se baseia em dados do Banco Central sobre crédito.

É um bom indicador das perspectivas de evolução da economia nos próximos meses, pois as empresas de menor porte são as grandes responsáveis pela geração de emprego no País. De cerca de 1,5 milhão de postos de trabalho formais abertos nos sete primeiros meses de 2022, 1,1 milhão está em micro, pequenas e médias empresas. Em média, essas empresas vêm gerando sete entre dez novos empregos formais. 

O aumento expressivo do crédito, no entanto, ocorre apenas neste ano. Na comparação com os números do ano passado, a expansão é bem mais modesta. O volume de crédito total de R$ 151,9 bilhões para essas empresas no primeiro semestre é apenas 0,62% maior do que o de igual período de 2021.

Apesar da diferença da velocidade de crescimento, os números mostram mais atenção das instituições financeiras para empresas de menor porte. O efeito dessa atenção chega a ser notável, quando se comparam os resultados dos créditos totais envolvendo empresas de todos os portes. Em agosto, por exemplo, a demanda das empresas por crédito avaliada pela Serasa Experian aumentou 1,3% na comparação com os dados de um ano antes. Esse aumento se deve exclusivamente à demanda das micro e pequenas empresas, cujo crescimento de 1,5% foi suficiente para cobrir os resultados negativos da demanda por crédito das empresas de médio e de grande porte.

O presidente do Sebrae, Carlos Melles, vê nesses números uma mudança no relacionamento das instituições financeiras com os pequenos negócios. Programas emergenciais, como o Pronampe – criado em 2020 para ajudar os pequenos empreendimentos a enfrentar as consequências da pandemia e tornado permanente neste ano –, facilitaram a aproximação das empresas menores aos bancos. A proximidade se consolida.

Em 2016, tomadores de crédito classificados como micro, pequenos e médios empreendimentos somavam 5 milhões; no segundo semestre de 2021 eram 6,4 milhões; e um ano depois, 7,3 milhões. Esses números “mostram a importante e necessária evolução do mercado de crédito para essas empresas”, diz Melles.

O crédito impulsiona as atividades dessas empresas, cujo papel na sustentação do emprego é de grande destaque. Os resultados mais recentes sobre as operações financeiras envolvendo esse grupo de empreendimentos apontam, portanto, para a melhora do mercado de trabalho. Há, porém, sinais de riscos. A persistência de dificuldades financeiras do setor público pode exigir a manutenção por mais tempo da política monetária rigorosa pelo Banco Central. Isso quer dizer juros altos por um período ainda incerto. O crédito deve continuar caro.

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