sábado, 8 de outubro de 2022

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Editoriais / Opiniões

Cortes em educação são inaceitáveis

O Globo

Após repercussão negativa, ministro recua em bloqueio que poderia levar ao fechamento de universidades

No afã de se reeleger, o presidente Jair Bolsonaro abriu a torneira dos gastos. Ampliou valor e alcance do Auxílio Brasil, criou programas eleitoreiros como bolsa-caminhoneiro e bolsa-taxista, antecipou o pagamento de benefícios e assim por diante. Era inevitável que, para equilibrar as contas, precisasse promover cortes no Orçamento. A questão é a natureza dos cortes. Mais uma vez, na hora de conter despesas, o governo avança sem constrangimento sobre setores essenciais, como educação, comprovando a falta de comprometimento com a melhoria do ensino — prioridade máxima para o desenvolvimento.

Diante da grita generalizada das universidades públicas e dos danos previsíveis à campanha do presidente Jair Bolsonaro à reeleição, o ministro da Educação, Victor Godoy, publicou ontem um vídeo informando o desbloqueio dos recursos de universidades, institutos federais e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Ele não deu detalhes sobre valores. A decisão é correta, mas só foi tomada depois da repercussão negativa, para corrigir um equívoco inaceitável. Na quinta-feira, o próprio ministro havia minimizado o contingenciamento, alegando se tratar apenas de “limitação na movimentação financeira” do MEC. Afirmou ainda que as universidades usavam o tema politicamente.

Pelos cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), houve bloqueio de R$ 3 bilhões no Orçamento do Ministério da Educação para 2022 (fora os R$ 2,4 bilhões já cortados na comparação com a dotação orçamentária original). O setor já vem cambaleando em meio à escassez de recursos e ao crescimento das despesas. Nas universidades, colégios e institutos federais, ameaçados de perder R$ 328 milhões (ou R$ 763 milhões, se somados os cortes desde 2021), a notícia gerou uma onda de desespero. Reitores se puseram a fazer cálculos para saber como — e se — conseguiriam terminar o ano letivo. Faltaria dinheiro para despesas básicas, como contas de água e luz. Com o bloqueio, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) poderia ter de fechar as portas. O impasse se repetia noutras instituições país afora.

Tão absurdo quanto o corte em áreas essenciais é a falta de transparência do governo sobre o contingenciamento. O decreto de reprogramação orçamentária, publicado no Diário Oficial, não detalhou onde seriam feitos os bloqueios. A análise da IFI mostra que, além da Educação, onde houve o corte mais drástico, foram afetados os ministérios de Ciência, Tecnologia e Inovações (R$ 1,7 bilhão), Saúde (R$ 1,6 bilhão), Desenvolvimento Regional (R$ 1,5 bilhão) e Defesa (R$ 1,1 bilhão).

É inevitável que o governo tenha de remanejar o Orçamento depois da gastança em ano eleitoral, promovida para favorecer a reeleição do presidente. Mas precisa assumir o ônus da situação que ele mesmo criou. É essencial explicar aos brasileiros onde e por que os cortes serão feitos, independentemente do efeito na campanha eleitoral.

Jamais haverá justificativa, obviamente, para escolher a Educação como alvo preferencial. O ensino em todos os níveis sofreu impacto brutal na pandemia. A paralisação de escolas e universidades causou prejuízos incalculáveis, que precisam ser recuperados com urgência. Voltar a fechar salas de aula, desta vez pela inépcia do governo em se planejar, só agravaria a tragédia.

Redução na produção de petróleo pela Opep é fracasso diplomático de Biden

O Globo

Resultado será alta da gasolina às vésperas da eleição americana, inflação e ameaça de recessão global

Na primeira reunião presencial desde março de 2020, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) decidiu em Viena na quarta-feira cortar sua produção em 2%, ou 2 milhões de barris diários. A decisão elevará os preços no mundo todo. Não foi uma medida qualquer, pelas implicações que a alta na cotação do petróleo terá num mundo ainda convulsionado pelos efeitos da pandemia, agravados pela guerra na Ucrânia.

A alta do petróleo no mercado internacional surpreende por ser um movimento contrário aos interesses da Casa Branca, liderado por um tradicional aliado dos Estados Unidos, a Arábia Saudita do príncipe Mohammed bin Salman. As relações entre sauditas e americanos estavam estremecidas diante das evidências comprometendo Bin Salman no assassinato e esquartejamento do jornalista dissidente Jamal Khashoggi na Turquia em 2018, mas o presidente americano, Joe Biden, esteve com o saudita em julho para uma reaproximação.

A decisão da Opep revela que a investida diplomática de Biden foi um fracasso. A alta do petróleo encarecerá os combustíveis nos Estados Unidos e impulsionará a inflação, hoje na faixa dos 8%, a poucas semanas das eleições de meio de mandato. É tudo o que Biden não quer. É praticamente certa a retomada, pelos republicanos, do controle da Câmara e a cada dia mais provável a do Senado. Confirmado o desastre político, restará a Biden cumprir os dois anos restantes do seu mandato isolado na Casa Branca, sem capacidade de aprovar projetos no Congresso.

Em resposta à Opep, ele determinou ao Departamento de Energia que libere no mês que vem 10 milhões de barris da reserva estratégica americana. Pode haver algum efeito imediato, mas, com a inflação em alta no mundo e agora impulsionada pelo corte de produção da Opep, as taxas de juros continuarão subindo. O Federal Reserve atrasou-se para começar a elevar os juros depois da invasão da Ucrânia e tem de correr atrás do prejuízo.

Durante toda a pandemia, os juros americanos estavam próximos a zero. Em setembro já oscilavam entre 3% e 3,5%. O Banco Central Europeu (BCE) segue a mesma tendência e elevou sua taxa em 0,75 ponto percentual no mês passado, para acima de 2% dependendo do tipo de empréstimo. Isso só faz aumentar a preocupação com a economia global, que emite há tempos sinais de estar à beira de uma recessão.

Para o Brasil e os demais países emergentes, haverá mais dificuldades na obtenção de empréstimos a taxas baixas no exterior e provável alta no câmbio, provocada pela saída de divisas atrás de remunerações mais vantajosas lá fora. A valorização do dólar inevitavelmente terá impacto na inflação brasileira. O Banco Central interrompeu seu ciclo de alta dos juros em 13,75%, mas a situação no ano que vem traz incerteza sobre a queda esperada doravante. O assunto poderá ser tema de debate na campanha do segundo turno.

Virada à paulista

Folha de S. Paulo

Datafolha confirma liderança de Tarcísio e cenário difícil para Haddad em SP

A primeira pesquisa do Datafolha sobre o segundo turno da corrida ao Palácio dos Bandeirantes confirma o que o resultado da primeira rodada já indicava: a eleição complicou-se sobremaneira para o outrora líder Fernando Haddad (PT).

O bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos), que foi o mais votado no último domingo (2), aparece agora com 50% das intenções, ante 40% do petista. Brancos e nulos somam 6%, e indecisos, 4%. Em votos válidos, são 55% a 45% para o candidato do Palácio do Planalto.

O antipetismo do eleitorado paulista, em particular o do interior, parece um dos fatores a explicar a arrancada de Tarcísio —ao que tudo indica, ele recebeu o voto útil de centristas e direitistas.

Essa hipótese se torna bastante verossímil quando se considera a votação do governador Rodrigo Garcia (PSDB). O tucano não estava tão atrás nas pesquisas, mas minguou nas urnas —um movimento sugestivo de que boa parte de seus potenciais eleitores migrou para o candidato bolsonarista.

São óbvias as dificuldades de Haddad agora. Viradas em segundo turno, embora obviamente possíveis, estão longe de ser a regra. Nunca aconteceram num pleito presidencial; nos estaduais e municipais, os postulantes que saem na frente confirmam a vitória em cerca de três quartos das vezes.

A rejeição ao ex-prefeito da capital, ademais, chega a 51%, enquanto a do rival é de 39%. Quanto aos padrinhos presidenciáveis, cumpre recordar que Jair Bolsonaro (PL) teve 48% dos votos válidos em São Paulo no primeiro turno, ante 41% de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Entre os eleitores de Rodrigo, 57% afirmam que ele deveria apoiar Tarcísio agora, enquanto 39% se inclinam por Haddad —os demais pregam voto branco ou nulo ou dizem não saber. O dado reforça a percepção de que, ideologicamente, os apoiadores do governador estão mais próximos do candidato do Republicanos.

O próprio Rodrigo, que encerrará um período de 28 anos de hegemonia tucana em São Paulo, já escancarou sua preferência —ou ao menos sua aposta política. Na terça-feira (4), declarou "apoio incondicional" a Bolsonaro e Tarcísio, num movimento que rachou ainda mais o já combalido PSDB.

Figuras históricas do partido, ainda identificadas à social-democracia, apressaram-se em distanciar-se do governador e declarar voto em Lula no segundo turno. Rodrigo perdeu ainda três de seus secretários, que não admitiram cerrar fileiras com o presidente.

Trata-se de desfecho um tanto melancólico para o sétimo mandato consecutivo do partido no estado, acentuando o esvaziamento nacional refletido na eleição de apenas 13 deputados federais.

Impunidade ambiental

Folha de S. Paulo

Ibama facilita prescrição de multas, contrariando norma e seguindo Bolsonaro

Jair Bolsonaro (PL) elegeu-se em 2018 prometendo acabar com aquilo que chamou de "festa" de multas ambientais por parte do Ibama.

Desde então, o governo não só tem se esmerado em cumprir esse desígnio antiecológico como vem buscando também tornar inócuas as punições expedidas antes de sua ascensão à Presidência.

Documentos obtidos por esta Folha comprovam que a cúpula do Ibama tem agido para facilitar a prescrição das sanções determinadas pela instituição.

Segundo um parecer da Procuradoria Federal junto à autarquia, a autoridade responsável pelo julgamento de recursos —seu presidente, Eduardo Fortunato Bim– vem declarando a prescrição de multas por entender que determinados despachos nos processos internos não interrompem a contagem de prazos.

Ocorre que tais decisões se dão ao arrepio de uma instrução normativa do Ibama de 2009, que foi atualizada em 2014. Bim, cumpre recordar, já chegou a ser afastado do cargo pelo STF por 90 dias, no âmbito da operação que investiga a suposta facilitação do contrabando de madeira da Amazônia pelo ex-ministro Ricardo Salles.

Na justificativa, o órgão simplesmente ignora a vigência da instrução normativa e afirma basear-se em precedentes julgados por tribunais regionais federais.

O impacto dessa arbitrariedade pode ser tremendo. O próprio Ibama estima que 45 mil processos, os quais totalizam R$ 18,8 bilhões em valores nominais, têm "elevada probabilidade de serem atingidos pela prescrição", caso o novo entendimento seja aplicado.

O número corresponde à soma das infrações encaminhadas para instrução e julgamento antes do decreto de Bolsonaro que, em 2019, instituiu a conciliação ambiental —medida destinada a protelar o andamento dos processos.

Ou seja, busca-se dificultar ainda mais o já problemático processo de recebimento do valor das autuações: apenas 5% delas são de fato pagas, dada a quantidade de recursos administrativos e judiciais.

Tal movimento se dá em paralelo ao desmonte da capacidade fiscalizadora do Ibama, que fez desabar a quantidade de multas e embargos nos últimos anos.

Ocioso dizer que tamanha impunidade funciona como um potente estímulo ao crime ambiental organizado —como repetidamente atestam os satélites que medem o desmatamento na Amazônia.

Riscos e oportunidades do Supremo

O Estado de S. Paulo

Senado bolsonarista traz riscos para a separação dos Poderes. É hora de o Supremo renovar, livre e corajosamente, sua compreensão sobre seus limites e seus deveres constitucionais

As eleições geraram uma nova camada de pressão sobre o Supremo Tribunal Federal (STF). Jair Bolsonaro, o político que, desde a redemocratização do País, mais enfrentou e atacou o Supremo, elegeu 20 aliados para o Senado, entre as 27 cadeiras disputadas neste ano. Na composição da próxima legislatura, o PL, partido de Jair Bolsonaro, terá a maior bancada da Casa, com 13 senadores, seguido por União Brasil (12), PSD (10), MDB (10), PT (9), PP (7) e Podemos (6). As outras legendas somam 14 cadeiras.

O novo cenário traz riscos para o funcionamento do Estado Democrático de Direito. Não custa lembrar que, no ano passado, Jair Bolsonaro apresentou ao Senado uma denúncia de crime de responsabilidade contra o ministro Alexandre de Moraes. O pedido de impeachment não tinha nenhum fundamento. Foi uma tentativa nada sutil de constranger o magistrado responsável por inquéritos envolvendo bolsonaristas e o próprio Bolsonaro. Felizmente, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, rejeitou prontamente a denúncia, por absoluta inépcia. No entanto, a depender de quem venha a ocupar a chefia da Casa no próximo biênio, esse tipo de denúncia pode ter outros encaminhamentos, interferindo na separação dos Poderes. Com a turma bolsonarista, todo cuidado é pouco.

Ao mesmo tempo, a composição do Senado após as eleições pode ser uma excelente oportunidade para que o STF renove, sem medo e sem acanhamento, sua compreensão sobre suas próprias competências. Mais do que nunca, é necessário que a Corte esteja consciente de seus limites e seus deveres constitucionais.

Não é fácil a posição do Supremo. A Constituição de 1988 é abrangente e, ao longo do tempo, o Congresso ampliou ainda mais seu alcance. Ou seja, o STF tem, por força do próprio texto constitucional, uma amplíssima competência sobre o Estado e a sociedade. Não há como escapar disso, seja qual for a composição política do Senado. Afinal, a missão do Supremo é defender a Constituição.

Para piorar, o próprio Executivo e membros das Casas Legislativas recorrem muitas vezes ao Supremo para tentar reverter derrotas políticas sofridas no Congresso. Há uma frequente judicialização da política, com a tentativa de que o STF seja instância revisora da política. Trata-se de manobra que viola a independência dos Poderes. Cabe ao Supremo sumariamente rejeitá-la.

No Estado Democrático de Direito, questões políticas são decididas por quem recebeu voto – e os ministros do Supremo não receberam nenhum voto. A função dos magistrados é aplicar o Direito, e não arbitrar disputas políticas. Infelizmente, como este jornal alertou diversas vezes, o Supremo não tem sido, ao longo deste século, muito rigoroso em seus limites, usando interpretações expansivas para dar a algumas matérias o encaminhamento político da preferência dos magistrados – ou de parte da população que os pressiona.

A renovada compreensão por parte do STF de suas competências constitucionais não significa, no entanto, apenas reduzir sua atuação. É também uma maior consciência de seus deveres. Seja qual for a composição do Congresso, o Supremo tem a tarefa de defender a Constituição. Não foi por acaso que Jair Bolsonaro transformou o STF em seu adversário político. Toda a trajetória política do presidente está centrada na rejeição da Constituição de 1988 e de suas garantias fundamentais. Alguém que louva a ditadura e homenageia torturadores certamente atritará com o Supremo. Assim, um Senado mais bolsonarista é alerta para os ministros do STF.

A maior consciência de seus deveres – a percepção da relevância de seu trabalho para o País – deve levar o Supremo a ter uma nova velocidade. Os processos precisam ter duração de tempo razoável. Liminares não podem durar anos. A Justiça que tarda não é justiça. Em concreto, o STF deve enfrentar, de forma técnica e articulada, sem deixar brechas para novas manobras, a inconstitucionalidade gritante do orçamento secreto. Que a nova legislatura possa estrear num outro ambiente de moralidade e transparência, plenamente constitucional.

Nem mensalão, nem orçamento secreto

O Estado de S. Paulo

Para Lira, ‘o povo vai escolher’ se quer a manutenção do orçamento secreto ou ‘a volta do mensalão’; é uma falsa escolha: ambos violam princípios republicanos e democráticos

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem motivos de sobra para celebrar o protagonismo que conquistou nos últimos anos. Seu partido, o PP, se consolidou como dono da terceira maior bancada da Casa, e o deputado, o mais votado de Alagoas, não esconde a pretensão de manter-se no comando da Câmara. Esses feitos políticos parecem ter fortalecido sua confiança a tal ponto que ele se sentiu à vontade para enunciar declarações que soam como ameaça ao presidente que for eleito em outubro. Em entrevista à GloboNews, Lira defendeu a manutenção das emendas de relator, base do esquema por meio do qual o governo abriu mão do controle do Orçamento e garantiu o apoio do Legislativo. “O povo brasileiro vai escolher se quer orçamento feito pelo relator, distribuído pelos deputados e senadores, ou a volta do mensalão”, declarou. “São as duas maneiras de cooptar apoio no Congresso Nacional. Eu prefiro o orçamento municipalista.”

“Orçamento municipalista” é um eufemismo para o orçamento secreto, que “acalmou o Congresso”, nas palavras de Jair Bolsonaro, e proporcionou estabilidade política a um presidente acossado por mais de 140 pedidos de impeachment. Para Lira, a imprensa se recusa a compreender os méritos e benefícios de algo que ele considera ser o empoderamento do Congresso, já que as emendas seriam uma maneira de impedir a reedição do “toma lá dá cá” que marcava o mensalão – mecanismo por meio do qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva premiava parlamentares que integravam a base de seu governo.

Ao contrapor as duas práticas como se fossem muito diferentes, Lira destaca o quanto elas são essencialmente iguais – em um ato falho, o presidente da Câmara usou o termo “cooptar”, talvez o termo que melhor define o objetivo dessas práticas. Tanto o mensalão quanto o orçamento secreto, escândalo revelado pelo Estadão, não passam de mecanismos de corrupção por meio dos quais o Executivo literalmente compra o apoio do Congresso, com a diferença de que as bilionárias emendas de relator fazem os milionários desvios que financiaram mensaleiros no passado parecerem contravenções de menor potencial ofensivo.

Por sua simplicidade, o mensalão é facilmente compreendido e amplamente rejeitado, mas a relativa sofisticação das emendas de relator não esconde sua inspiração – o hoje esquecido escândalo dos Anões do Orçamento (1993). A distribuição das verbas não tem transparência, não segue critérios técnicos nem se submete a ferramentas de controle inerentes ao setor público; apenas deputados e senadores que votam com o governo são beneficiados; municípios governados pela oposição ou sem padrinho no Congresso são punidos; os recursos garantem a compra de bens e serviços muitas vezes controversos e quase sempre superfaturados; há suspeitas de que parte do dinheiro volte para o autor; e o fato de que 10 dos 13 deputados que mais receberam emendas foram reeleitos, como mostrou O Globo, reforça indícios de que o mecanismo tem funcionado como um fundo eleitoral paralelo – e três vezes maior.

A Câmara, como casa dos representantes do povo, tem entre suas tarefas mais nobres o dever de fiscalizar a aplicação dos recursos públicos. Isso em nada se confunde com avançar sobre atribuições que pertencem ao governo, tais como a elaboração e a execução do Orçamento. É, portanto, não apenas lamentável, mas rigorosamente equivocada a visão comercial que o atual presidente da Câmara tem sobre a natureza da relação entre os Poderes Executivo e Legislativo.

Esquemas como o mensalão e o orçamento secreto não são parte da lógica do presidencialismo de coalizão, mas atalhos que dispensam o presidente de articular uma maioria parlamentar disposta a apoiar um programa consistente e focado na solução dos reais problemas do País – a essência do ato de governar em um regime democrático. Quem não tem disposição para exercer um papel de liderança na construção dessa base e opta por comprá-la, assim como quem prefere vender seu apoio, revela não ter espírito republicano e nem aptidão para participar da vida pública.

Criminalização das pesquisas eleitorais

O Estado de S. Paulo

Ao ameaçarem pesquisadores com prisão, num PL estapafúrdio, governistas confirmam seus pendores autoritários

O deputado Ricardo Barros (PP-PR) pretende trancafiar na cadeia por até dez anos, nada menos, quem for incapaz de prever o futuro. É disso que trata o Projeto de Lei (PL) 2.567/22, apresentado pelo líder do governo na Câmara dos Deputados na quinta-feira passada. O objetivo do parlamentar é punir institutos de pesquisa cujas sondagens de intenção de voto divirjam dos resultados apurados pelo Tribunal Superior Eleitoral além da margem de erro.

Tamanho grau de previsibilidade em pesquisas de intenção de voto é tecnicamente impossível de ser alcançado por qualquer instituto, pois, afinal, está-se no terreno do imponderável. Até o exato momento em que o eleitor se vê diante da urna eletrônica, seus humores podem variar por razões que só ele é capaz de definir, não um pesquisador. Na prática, criminalizar os estatísticos que não conseguiram antever exatamente o que o eleitor faria na solidão da cabine de votação é o mesmo que mandar prender as cartomantes cujas previsões não se confirmam.

A mera proposição de um desvario autoritário como o PL 2.567/22 já diz muito sobre o espírito antidemocrático que anima o presidente Jair Bolsonaro e seus aliados no Congresso. Mas o pior é que o projeto do deputado Ricardo Barros, que poderia ser apenas uma iniciativa sem maiores consequências, apenas para dar satisfação a bolsonaristas que acusam os institutos de pesquisa de manipulação para prejudicar Bolsonaro, tem chances de prosperar. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), outro bolsonarista fiel, prometeu colocar o projeto de lei em votação na Casa já na próxima semana. Se ainda havia dúvidas em relação aos pendores autoritários dessa turma no Congresso, não há mais.

Os ataques contra os institutos de pesquisa não vêm apenas do Palácio do Planalto e da Câmara dos Deputados. O senador Marcos do Val (Podemos-ES), outro bolsonarista, reuniu-se há poucos dias com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para apresentar um pedido de instalação de uma CPI para investigar os institutos de pesquisas por seus “erros”.

Em nota, a Associação Brasileira dos Pesquisadores Eleitorais (Abrapel) enfatizou o óbvio: que “o regime democrático demanda a livre circulação de ideias e de informação; e as pesquisas de opinião são fundamentais para o pleno exercício da cidadania”.

As pesquisas de intenção de voto, já dissemos em editorial recente, são informações valiosas à disposição dos cidadãos para que estes possam decidir melhor sobre seus votos. São tão relevantes que os próprios candidatos e partidos as usam e pagam por elas. Qualquer tentativa de dificultar o acesso dos eleitores à informação é, pois, uma ação deliberadamente antidemocrática.

É isso o que vai acontecer caso o PL 2.567/22 seja aprovado. Das duas, uma: ou os institutos deixarão de divulgar as pesquisas que realizam ou as apresentarão com uma margem de erro tão alta que as tornará inúteis. No fundo, é exatamente o que pretendem os que, a pretexto de impedir a “manipulação” dos eleitores, querem mantê-los no escuro, para manipulá-los à vontade.

4 comentários:

  1. Os Institutos viraram casos
    de polícia
    Com seus resultados adulterados cometeram a verdadeira fraude eleitoral, influenciando sim muitos eleitores a votarem em quem estava na frente com chances de vencer no primeiro turno , o Lula ladrão ,
    Sem dizer os erros grosseiros nas eleições de governadores e senadores
    Multa e cadeia para os criminosos fraudulentos

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    1. Eh, gado, foi do seu tocador de berrante a maior mentira, o maior erro de pesquisa. O genocida previu pelo menos 60% e enganou otários com vc.
      Lembro q o genocida ficou com 40%.
      Cê sabe, gado.

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  2. Este é um DESgoverno de MENTIRAS! O ministro na quinta disse que não tinha cortes no MEC, que era conversa fiada e chororô das universidades. Percebendo que ia perder votos, o GENOCIDA mandou o ministro desfazer a decisão. Afinal, "um manda, o outro obedece"! Na sexta, o mesmo MINISTRO MENTIROSO disse que tinha CANCELADO OS CORTES!

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  3. Mais uma derrapada. Desta feita, na regência: "...desta vez, a História não os perdoará!"

    CORRETO: ...desta vez, a História não lhes perdoará!

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