sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Luiz Carlos Azedo - O estranhamento de torcer pelo Brasil sem vestir a camisa amarela

Correio Braziliense

A camisa da Seleção virou uma espécie de uniforme da extrema direita, que protesta à frente dos quartéis e bloqueia as estradas para impedir a posse do presidente Lula

Havia uma expectativa de que a Copa do Mundo de Futebol no Catar mudasse o clima político no país, mas ainda não é o que está acontecendo. Vamos ver se os jogos da nossa Seleção — que estreou com os pés de Richarlison fazendo dois gols, um dos quais uma pintura — contribuirão para criar um novo clima de diálogo e convivência, em que todos estejamos do mesmo lado, ao torcer pelo Brasil. Não vejo em ninguém um sentimento antipatriótico, de rejeição à Seleção Brasileira de Tite, mas também não vejo a mesma sensação de pertencimento e identidade com a camisa canarinho como em outras copas. É muito esquisito!

Talvez o Catar fique longe demais, a maioria conhece muito pouco esse Emirato, que é considerado o país mais rico do mundo. Protetorado britânico, após a queda da Império Otomano, o Catar é governado há 150 anos pela mesma família, que manteve o poder com mão de ferro após a independência, em 1971. Petróleo, gás e alumínio garantem ao país receitas muito superiores ao que gasta com importações, principalmente de bens de consumo, de alimentos, que o deserto não oferece, de carros de alto luxo.

Doha, a capital, é uma das cidades mais modernas do mundo, com seus prédios altíssimos e arrojados, fruto de uma política cujo objetivo é transformar o Emirato num polo turístico, comercial e financeiro. O velho conceito de Peter Ducker, de que as cidades devem ser boas para morar, trabalhar e visitar, simultaneamente, deve ter inspirado a modernização da cidade, considerada uma das mais seguras do mundo.

O Catar é um dos países com os quais o presidente Jair Bolsonaro conseguiu manter relações bem amistosas. Havia uma forte conexão entre a autocracia local e o projeto iliberal bolsonarista, que acabou derrotado nas urnas pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Obviamente, não tem sentido romper os laços comerciais e econômicos que foram estabelecidos na visita de Bolsonaro aos Emiratos, mas nosso rumo político tem outros paradigmas, cujo eixo é o Estado democrático e não o direito divino ditado pelo Alcorão.

Vale a pena examinar melhor o contexto em que a Copa se realiza. O Catar está entre os países do Oriente que se lançaram arrojadamente na globalização, sendo um dos líderes da corrida mundial para reinventar o Estado de forma a torná-lo mais eficiente e produtivo, tendo como modelo o capitalismo de Estado de Cingapura. O fato de ser uma monarquia autoritária, com grande disponibilidade de recursos, facilita muito as coisas. Entretanto, não pode servir de paradigma para nós.

Somos um país democrático do Ocidente, com uma população muito mais numerosa e território de dimensões continentais. Nossa sociedade não segue rígidos padrões de comportamento ditados por dogmas religiosos, como é o caso das sociedades muçulmanas. Além disso, o Catar tem uma espécie de apartheid, no qual os trabalhadores estrangeiros não têm os mesmos direitos que os demais cidadãos do ponto de vista social. Um abismo social separa a elite árabe dos trabalhadores estrangeiros, entre os quais indianos, malaios, nepaleses e coreanos.

Todos juntos

A Copa no Catar vai desnudar essas duas realidades para o mundo, com certeza. Mas também há um abismo social entre aqueles que estão lá, assistindo aos jogos nos seis magníficos estádios construídos para o torneio, e os milhões e milhões de torcedores brasileiros que veem os jogos pela tevê e pelas redes sociais. Obviamente, a imprensa ocidental não se limitará à cobertura esportiva, mostrará o outro lado da realidade do país que tem a maior renda per capita do mundo.

Mas, voltando ao futebol, vamos ver se a vitória do Brasil de 2 x 0 contra Sérvia fará a torcida brasileira pegar no tranco. Como disse, a sensação ainda é muito estranha, por causa da polarização política existente e pelo fato de a camisa da Seleção Brasileira ter virado uma espécie de uniforme da extrema direita bolsonarista, que protesta à frente dos quartéis, e dos caminhoneiros que bloqueiam as estradas.

Ontem, no primeiro jogo do Brasil, era nítida a preocupação dos que ganharam as eleições com o fato de que poderiam ser confundidos com os derrotados, por causa do uniforme canarinho. Na década de 1970, a Seleção Brasileira era uma unanimidade, mas o “pra frente Brasil”, slogan da equipe, foi usado pelo regime militar para estigmatizar a oposição como antipatriótica, na base do “ame-o ou deixe-o”.

Não é o caso agora. Muitos deixam de usar a camisa da Seleção para não serem confundidos com os bolsonaristas raiz, que a transformaram em uniforme político, sequestrando um dos símbolos de nossa identidade nacional. É uma bobagem, talvez seja a hora de mostrar que somos todos brasileiros e temos direito a usá-la, não importam as convicções políticas e religiosas. 

 

3 comentários:

  1. E o pior, Azedo é que não é só a camisa da seleção. O boçal é malandríssimo e pegou o hino nacional, a bandeira do Brasil, as Forças Armadas. A Simone Tebet se esforçou muito para mudar isso quando aparecia no horário eleitoral pregando que a bandeira nacional é de todos os brasileiros e não de nenhum candidato específico. tudo isso como símbolo do Capitão do Povo, o Mito. E outras coisas que estão no coração de todo mundo: Deus, Pátria, Família e até a Liberdade e a educação dos filhos sem mamadeira de piroca. Tudo isso com o amor à propriedade privada que a burguesia e a classe média têm. Amor que foi explorado até o limite. Os militantes do MSQ Movimento dos Sem Quartel apavoravam a classe média dizendo que quem tinha imóvel de mais de 60 metros quadrados teria que ceder um quarto para uma família de pobre no governo Lula. E o PT, os petistas, o lulopetismo, os petralhas substituíram o velho espantalho do comunismo. Houve bolsonarista dizendo que se devia fazer com os petistas o mesmo que o nazismo fez com os judeus. O próprio Bolsonaro apareceu em vídeo com um tripé à guiza de metralhadores falando em fuzilar petistas do Acre. Claro que tudo isso é previsto em teoria. O jornalista Chip Berlet já disse que “O fascismo é uma corrente política complexa que parasita outras ideologias, possui muitas tensões internas e contradições e possui um aspecto camaleônico que se apropria de símbolos históricos, ícones, slogans, tradições, mitos e heróis da sociedade que deseja mobilizar”. O boçal é um parasita de tudo isso que foi mencionado.

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  2. Eu NÃO usarei o manto sagrado (nem outros símbolos nacionais)
    Nunca, jamais, parecer com o gado!
    IRC!
    TRIPLO IRC!

    Depois, meu neto ou tataraneto, vendo uma foto minha de verde e amarelo, pode pensar q fui gado e q adorei um pneu ou um ET ou outra estupidez ruminante.
    IRC DE NOVO!
    JAMAIS!

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