Folha de S. Paulo
Pacto entre Lula e Lira mostra que eleito
escolheu ilusória frente ampla
O Brasil é um país de conceitos políticos
difusos, em perene fluxo. Por aqui, fala-se de presidencialismo de coalizão,
semipresidencialismo e semiparlamentarismo. Hoje, assegura-se que teremos um
governo de frente –e adjetivada, ao sabor das conveniências, como
"ampla" ou "democrática". Entre nós, a linguagem serve mais
para iludir que para comunicar.
No segundo turno, configurou-se em torno de
Lula uma frente eleitoral, que merece o qualificativo "democrática"
por apoiar-se na repulsa ao golpismo da extrema-direita bolsonarista. Contudo,
em momento algum articulou-se uma frente política.
Uma frente política repousa sobre um
programa comum negociado por diferentes partidos. Durante a campanha do segundo
turno, Lula anunciou a incorporação de algumas propostas de Simone Tebet e de
Ciro Gomes, mas não modificou o núcleo de sua plataforma econômica, exposta em
discursos e declarações públicas. "Governo de frente" sem programa
comum é, na hipótese mais benevolente, a expressão de uma utopia pervertida.
Em tese, Lula poderia governar exclusivamente com sua coligação eleitoral. Contudo, essa frente de esquerda não é viável pois falta-lhe um mínimo de sustentação no Congresso.
Uma alternativa seria a construção tardia
de uma frente democrática, por meio da formulação de um programa de consenso
capaz de reunir os diversos partidos e facções partidárias que constituíram a
frente eleitoral do segundo turno. Lula teria que ceder em pontos relevantes de
suas promessas de campanha, especialmente na esfera da política econômica. No
governo de centro-esquerda resultante, o PT teria forte influência, mas não a
palavra final.
O pacto firmado entre Lula e Arthur Lira
evidencia que o presidente eleito escolheu um terceiro caminho, enraizado no
solo pútrido da tradição política nacional: uma ilusória frente ampla. Seu
governo será de frente e, simultaneamente, não o será. Não será porque
prescindirá de um programa negociado com os parceiros. Será porque derivará da
cooptação em massa de partidos e grupos parlamentares.
O tortuoso expediente destina-se a
circundar a negociação política, substituindo-a pelo loteamento da máquina
estatal. "Uma mão lava a outra", como quer o neoaliado Lira, cujas
prioridades absolutas são a sua reeleição para o comando da Câmara e a manutenção
do "orçamento secreto".
A PEC da Transição ilumina a estratégia de
Lula. O objetivo prioritário do novo governo é libertar-se das amarras fiscais
que limitam o gasto público. Trata-se de concluir, a qualquer custo, o serviço
conduzido pelo governo Bolsonaro. O preço econômico será pago sob a forma de
juros maiores e crescimento menor. O preço político, pela inclusão no governo
de correntes que apoiaram Bolsonaro e pela eternização do orçamento secreto.
A responsabilidade política vai para o ralo
para a responsabilidade fiscal poder ir para o ralo. A frente sem programa será
muito ampla, estendendo-se do PSOL ao PP, mas não faz jus ao adjetivo
"democrática".
Nos mandatos anteriores de Lula, o chamado
"presidencialismo de coalizão" notabilizou-se por instabilidade
estrutural, que foi solucionada por vias ilegais (mensalão e petrolão). Sua
nova versão sofrerá do mesmo defeito inato. A direita bolsonarista ou
semibolsonarista extrairá sucessivas concessões do Executivo, usando como moeda
de troca o apoio circunstancial a propostas enviadas ao Congresso.
De volta ao passado –ou seja, à estranha
aliança entre a esquerda e o centrão dos anos do lulismo triunfante?
Não exatamente. A novidade é a persistente agitação golpista da extrema direita. A ameaça à democracia que produziu a frente eleitoral em torno de Lula não evaporou com a apuração. Paradoxalmente, Lula precisa dos bolsonaristas nas ruas, em estado de permanente excitação. A ficção de um governo de frente democrática depende deles.
Grande Magnoli! Lula, para manter sua ficção governamental, precisa q o gado burro continue nas frentes dos quartéis e nos bloqueios de estrada e q insistam em contatos imediatos com ET.
ResponderExcluirDo contrário, o governo LULA queda inviável.
Genial!
Eu nunca desconfiei q o gado burro pra cacete, q crê q LULA recebe a alma do bolsonaro e este continua governando no corpo daquele, É, na realidade, UM PETISTA DISFARÇADO.
Como petista q sou, juntar-me-ei imediatamente ao gado burro na frente dos quartéis e garantirei a ficção governamental petista.
Obrigado, Magnoli, obrigado.
Agradeça ao gado também. O q seria do Lula sem ele.
ResponderExcluirKkkkkkkkkkkk
Perfeito !
ResponderExcluirQuando o colunista diz que a "linguagem serve mais para iludir que para comunicar", ELE SABE BEM do que está falando. Pois é sua GRANDE ESPECIALIDADE! E é o que em geral faz nos seus textos, inclusive neste! Palavras pra enganar os otários que gostam de ser enganados!
ResponderExcluirOnde o colunista escreveu "Entre nós, a linguagem serve mais para iludir que para comunicar.", ele queria na verdade dizer: PARA MIM, a linguagem serve mais para iludir que para comunicar! Só faltou coragem de assumir isto... Preferiu dividir a culpa com seus leitores...
ResponderExcluirO gado espantou e espanta os eleitores sérios.
ResponderExcluirMagnoli, o vidente que pouco ou nada vê! Enganador profissional...
ResponderExcluirMagnoli não é burro. Então tem má vontade. O resultado de sua fala está nos comentário dos anônimos. Demétrio quer um "programa" da frente ampla ou democrática. Numa situação dessas querer uma coisa dessas é ingenuidade. No século passado a humanidade se viu diante do nazismo fritando judeus, invadindo países e defendendo maluquices como raça superior, etc. Fez-se necessária uma "frente" que juntou potências capitalistas e a URSS contra Hitler. Só faltava Magnoli exigir um "programa comum" desses países. Que programa sairia de uma reunião que juntasse Stalin, Roosevelt, De Gaule e Churchill? O que os uniu foi apenas uma ideia: "Temos que parar esse baixinho". No nosso caso a ideia foi: "Temos que parar esse idiota".
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