Valor Econômico
Reforma tributária deverá ser ponto de
embate
Eleito com 13,5 milhões de votos para
comandar a maior economia do país, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos)
quer estabelecer em São Paulo uma trincheira do pensamento liberal-democrata.
Com friso na palavra “democrata”.
Seu plano é projetar o Estado como um ator
de peso no debate nacional, informou a esta coluna o coordenador da transição
paulista, Guilherme Afif Domingos. Não será uma oposição pura e simples. Poderá
haver convergência com o governo federal em alguns temas, como a atração de
investimentos. Em outros, São Paulo deverá atuar como contraponto.
Não por acaso, é lá que estará o ministro da Economia, Paulo Guedes, a partir do dia 1º de janeiro. Atuará como conselheiro numa equipe formada por outros ex-integrantes de seu time no Ministério da Economia, como o próprio Afif e o futuro secretário de Fazenda, Samuel Kinoshita.
Um exemplo: os “paulistas” defenderão a
tese que a reforma tributária deveria ser precedida da administrativa. Uma vez
definido o tamanho do Estado, aí sim seria a hora de falar em cobrar impostos.
Do contrário, disse Afif, a tendência é que haja aumento de carga tributária.
Ao mesmo tempo em que planeja usar o peso
de São Paulo nos debates internos das grandes reformas, o governador eleito
quer turbinar a projeção internacional do Estado.
“Se São Paulo fosse um país e houvesse um
G-21, estaria nele”, comentou Afif. A economia de São Paulo é maior do que a
sul-africana. Maior do que a soma de Argentina, Paraguai e Uruguai, comparou. É
essa a dimensão que será utilizada para atrair investimentos estrangeiros para
concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs), independentemente do que ocorra
no campo federal.
O carro-chefe será a área de
infraestrutura, habitat natural de Tarcísio. Engenheiro, ex-diretor-geral do
Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e integrante do
primeiro time do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), é profundo
conhecedor do programa de concessões à iniciativa privada.
Tarcísio articula um nome de projeção
global para buscar parceiros externos. Atuará junto com Lucas Ferraz,
secretário de Comércio Exterior na equipe de Guedes, já escalado.
Paralelamente à atração de investimentos,
Tarcísio quer melhorar o ambiente de negócios no Estado. Convidou Caio Mario
Paes de Andrade, que foi secretário especial de Desburocratização, Gestão e
Governo Digital da equipe de Guedes no Ministério da Economia antes de ocupar a
presidência da Petrobras. Em sua gestão, foi criado o aplicativo gov.br.
São Paulo está atrasado na digitalização de
serviços, avaliou Afif. No campo tributário, por exemplo, a ideia é facilitar a
devolução de créditos do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) vinculados a investimentos, com uso de sistemas mais modernos. O
Poupatempo deverá migrar para o celular.
Nessa frente de investimentos, as agendas
estadual e federal coincidem em muita coisa.
No entanto, a trincheira paulista pode ser
um complicador a mais para a já difícil reforma tributária.
As duas propostas que estão no Congresso
Nacional, as Propostas de Emenda à Constituição (PECs) 45 e 110, já contam com
a oposição das empresas do setor de serviços, que veem aumento de sua carga
tributária. Também há resistência de prefeituras de grandes cidades, que
relutam em abrir mão do Imposto sobre Serviços (ISS), a ser fundido a outros
tributos sobre consumo para formar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
Por mais que o debate tenha amadurecido nos
últimos anos, ainda é grande o abacaxi a ser descascado.
O futuro ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, tem dado prioridade ao tema. Colocou em sua equipe Bernard Appy,
formulador do modelo que está na PEC 45, em análise na Câmara dos Deputados.
Além disso, disse que pretende começar as
negociações a partir das propostas que estão no Congresso Nacional, o que
significa que ganhará tempo. Deve buscar um roteiro parecido com o da reforma
da Previdência, amadurecida no governo de Michel Temer e aprovada no primeiro
ano do governo de Jair Bolsonaro.
Na criação do IVA, especificamente, São
Paulo não deverá reeditar sua queixa histórica sobre perda de arrecadação por
causa do local de cobrança. Será no Estado onde o bem é consumido, e não onde é
produzido, como é hoje o ICMS, num desenho que beneficia Estados industriais.
No entanto, há outros pontos em que pode
haver atrito. Por exemplo: Afif vê risco para o Simples. O sinal de alerta
acendeu quando o regime das micro e pequenas empresas voltou, depois de dois
anos, a ser classificado como um “gasto tributário”, ou seja, uma desoneração
destinada a estimular o setor.
É voz corrente entre especialistas que
esses “gastos”, de R$ 456 bilhões no ano que vem, precisam de um pente-fino. É
possível que isso ocorra, pois o próprio Haddad comentou que a ex-presidente
Dilma Rousseff exagerou nas desonerações.
Embora haja controvérsia se é ou não um
gasto tributário, o Simples aparece como o maior item da lista, nas planilhas
da Receita Federal: R$ 75,5 bilhões no ano que vem.
“É um alerta a todos os que defendem as
micro e pequenas empresas: cuidado com o Simples”, afirmou Afif com sua voz
profunda, já arregimentando forças.
Outro tema em que pode haver embate é a
criação de uma nova fonte de financiamento para a Previdência. A ideia circula
nas profundezas da transição. A dúvida é se o governo de Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) proporia criar esse tributo e, em caso positivo, se seria uma troca,
como defendeu Guedes nos últimos anos, ou uma adição.
O ano que vem está logo ali e traz muitos
desafios. Haverá quadros de qualidade nos dois lados da trincheira. Se forem
capazes de trabalhar juntos para criar condições para a economia crescer, será
um jogo de ganha-ganha.
Só Apple vagabund
ResponderExcluirTomara.
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