O Globo
Grupos antibolsonaristas que não são
necessariamente do PT precisam ser contemplados nesse novo governo
O PT não entendeu até agora o que aconteceu
na eleição presidencial. Depois de ter sido derrotado em 2018 com um candidato
“de raiz”, venceu desta vez por uma diferença ínfima tendo Lula como candidato.
É claro que houve um uso abusivo da máquina pública, mas nada indica que Lula
venceria se não tivesse o apoio de forças políticas de outras tendências.
O novo governo tem que dar motivos para que
parte desse eleitorado que votou em Bolsonaro sem ser bolsonarista volte a
acreditar no partido e em Lula. Para isso, precisa governar sem o radicalismo
de grupos petistas, e sem a arrogância petista. Lula saiu do governo com 80% de
aprovação, portanto muitos dessa metade que votou em Bolsonaro já gostou em algum
momento do Lula.
O desgoverno de Dilma Rousseff, e as
revelações de corrupção da Lava-Jato, confirmadas por confissões e devoluções
de dinheiro roubado dos cofres públicos, fizeram com que o antipetismo levasse
parte desse eleitorado, desinformado sobre o passado político dele, a escolher
o que seria a antítese do PT e de Lula: um Bolsonaro com fama de ilibado,
nacionalista, anticorrupção.
Nada disso se confirmou, os piores prenúncios, sim. Mesmo assim, na eleição presidencial, Lula teve pouco mais de 50% de votos. Uma diferença muito pequena, que só foi possível devido ao caráter de frente ampla que se formou. A montagem do novo governo começa a demonstrar que o PT não mudou, apesar das sinalizações que demonstram que precisa mudar para unir o país.
Mas desistir da Izolda Cela, uma técnica em
educação reconhecida, com resultados concretos de melhoria do ensino no Ceará,
para colocar o governador Camilo Santana, eleito senador pelo PT, é uma
demonstração de que a prioridade é ser petista. Além da capacidade técnica
testada concretamente, Izolda tem para apresentar até mesmo movimentos
políticos importantes. Era do PDT, saiu rompida com o grupo de Ciro Gomes, e
apoiou a candidatura de Lula.
Como não há lugar para dois representantes
do Ceará no ministério, Camilo Santana, de quem Izolda era vice-governadora,
quer a vaga para si, e ainda que Izolda continue sendo sua segunda no
ministério da Educação. Me parece um equívoco, até mesmo do ponto de vista
conceitual: mulher só serve para ser a segunda? Por que Camilo Santana precisa
ser ministro, se foi eleito senador?
Desistir da dra. Nísia Trindade, presidente
da Fiocruz, para colocar em seu lugar um deputado do PT porque o partido acha
que tem que ter as pastas de Saúde e Educação, é um engano revelador. É perigosa
essa tendência petista de achar que ganhou a eleição sozinho. Quem ganhou a
eleição foi Lula, apoiado pelo PT e por uma coligação de centro, que vai do
centro-direita, como o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, e a senadora
Simone Tebet, à centro-esquerda, com a ex-ministra Marina Silva.
Grupos antibolsonaristas que não são
necessariamente do PT precisam ser contemplados nesse novo governo. É o caso da
senadora Simone Tebet que, no segundo turno, foi fundamental para a vitória de
Lula. É compreensível que a gula do PT exija o ministério do Desenvolvimento
Social por causa do Bolsa Família, mas é outro engano. Patrus Ananias, que é
petista e foi quem descobriu o potencial eleitoral do Bolsa Família como
ministro, não teve grande futuro por causa disso.
O Bolsa Família é ligado essencialmente a
Lula, e à sua imagem. Simone Tebet tem razão em querer esse ministério, pois
nele terá espaço para uma ação política muito além do Bolsa Família. Além do
mais, ela foi escolhida como a coordenadora da área de desenvolvimento social
do governo de transição. Por que colocá-la nessa posição se não querem dar a
ela o posto? Mas querer que assuma o ministério do Desenvolvimento Social sem o
Bolsa Família é uma atitude política mesquinha do PT.
É uma mesquinharia do PT querer tudo para
si num momento como esse, em que, mais que durante a campanha, está em jogo a
democracia. Lula não pode esquecer da governabilidade, deve saber que seu
governo não pode ser só de uma parte das forças políticas que o apoiaram. Se
fizer um governo de esquerda e petista, vai impedir que pessoas que não são
bolsonaristas olhem para ele com boa vontade.
O PT não ganharia sozinho. Sozinho, não tem
maioria no Congresso para aprovar suas demandas — veja-se a PEC da Transição,
que subiu no telhado —, e nem mesmo para se defender dos ataques da oposição,
que será muito mais forte que hoje com um Parlamento mais conservador, eleito à
sombra do bolsonarismo.
É por isso que pessoas de capacidade inconteste deixam de acrescentar à administração pública.
ResponderExcluirVem aí mais do mesmo de sempre, só nós e mais ninguém.
ResponderExcluirO colunista tem razão!
ResponderExcluirMerval sendo Merval.
ResponderExcluir"O PT não entendeu até agora o que aconteceu na eleição presidencial."
ResponderExcluirMas Merval entendeu. Lula não entendeu, mas Merval entendeu. Haddad, Dino, não entenderam e, portanto, não explicaram ao PT.
Enfim, só Merval entendeu. Kkkkkkkkk
"mas nada indica que Lula venceria se não tivesse o apoio de forças políticas de outras tendências."
ResponderExcluirPor que nada indica? Haddad quase ganhou do genocida e "tudo indica", pra usar seus termos, q LULA ganharia, naquela eleição (por isso não o deixaram participar) e nesta (se fora uma eleição honesta - e não foi, como sabemos todos).