O Globo
Existe uma ameaça de não aprovar a PEC da
Transição caso o STF considere inconstitucional o orçamento secreto
O orçamento secreto do Congresso está em
discussão tanto no Supremo Tribunal Federal (STF), que definirá se é
constitucional, quanto no Tribunal de Contas da União (TCU), que autorizou um
pedido do governo para deixar fora do teto despesas obrigatórias da
Previdência. O presidente eleito Lula procura ressaltar a todo momento que a
PEC da Transição, que permite um gasto bilionário fora do teto, não é de seu
governo, mas sim do governo Bolsonaro, que fez um orçamento fictício onde não
cabem o Bolsa Família de R$ 600 e mais R$ 150 por criança menor de 6 anos, e
nem gastos correntes como despesas do INSS com aposentadorias e outros
benefícios previdenciários, que chegaram a R$ 770,4 bilhões.
O atual Governo chegou ao mês de dezembro precisando ‘pedalar’ quase R$ 15,5 bilhões no Teto de Gastos, e conseguiu que o TCU aceitasse a imprevisibilidade de despesas obrigatórias da Previdência devido à pandemia o que as retirou do limite de Teto de Gastos, ampliando assim ainda mais o espaço para o orçamento secreto. A decisão do TCU, no entanto, não autorizou expressamente o governo a furar o teto. Se tomada, a decisão do governo terá que ser avaliada novamente pelo plenário, o que é arriscado.
O bloqueio de R$ 16,4 bilhões de créditos
para despesas discricionárias provocou o shut down parcial das atividades do
governo, com paralisação de pagamentos destinados a medicamentos, merenda,
água, luz, limpeza, despesas cruciais nas áreas de educação e saúde. Também
bolsas de estudos deixaram de ser pagas. Técnicos e auditores independentes
afirmam que esse apagão da administração pública federal é reflexo do orçamento
secreto, cujos problemas, que serão analisadas a partir de quarta-feira pelo
Supremo Tribunal Federal não se restringem apenas à transparência e aos casos
de corrupção com tratores e os escândalos descobertos na área da saúde.
O governo Lula pretende que as chamadas
emendas do relator sejam, além de transparentes, isto é, que se saiba quem é o
parlamentar que recebeu a verba, onde ela foi alocada e por que razão, sejam
compatíveis com as políticas públicas definidas pelo der Executivo federal.
Parecer Prévio do TCU das contas de 2021 já alertava: “A sistemática vigente
não estimula a coordenação programática entre as políticas públicas
desenvolvidas pelo Poder Executivo federal e as ações locais financiadas por
intermédio das emendas. As lógicas por detrás dessas duas formas de se alocar
os recursos públicos são bem distintas: apesar de conter falhas, o Executivo,
em tese, busca seguir um planejamento mais abrangente de suas ações, com lastro
em políticas setoriais, ao passo que as emendas – ao menos no modelo atual –
incentivam a atuação fragmentada baseada no paroquialismo”.
O TCU já havia alertado que, nas condições
atuais, o orçamento secreto estabelece uma concorrência desproporcional com as
políticas públicas definidas na Constituição e em leis, criando esse apagão da
máquina pública. Segundo o alerta do Tribunal de Contas, novas programações
incluídas no orçamento pelo relator-geral obrigam a supressão de programações
essenciais para a União honrar despesas obrigatórias e de despesas
discricionárias que abrangem, em alguns casos, as relacionadas com a
conservação do patrimônio público priorizadas Lei de Responsabilidade Fiscal.
Um exemplo dessa distorção de prioridades
foi dado pelo próprio TCU, que acusou que ela “contribuiu para falhas no
sistema de segurança e proteção patrimonial, o que resultou no incêndio de
grandes proporções que destruiu o Museu Nacional, a mais antiga instituição
científica do Brasil”.
A presidência da Câmara está se
movimentando para que o governo Lula não intervenha politicamente para que o
orçamento secreto seja considerado inconstitucional pelo plenário do Supremo. A
tendência é que haja maioria para derrotar o orçamento secreto, mas também é
possível que algum ministro peça vista para adiar uma decisão. Os ministros que
são contra a oficialização do orçamento secreto estão dispostos a antecipar
seus votos mesmo se houver pedido de vista, formando uma maioria que
pressionará o Congresso a mudar seus procedimentos neste caso.
O Congresso argumenta que já fez diversas
modificações no funcionamento das emendas de relator, que deixaram de ser
anônimas, e pede tempo ao Supremo para profundar as mudanças. Nas negociações
de bastidores, há até a ameaça de que a PEC da transição não será aprovada na
Câmara se o STF considerar inconstitucional o chamado orçamento secreto.
Pois é...
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