Folha de S. Paulo
Breve história de fantasmas de Natais
passados e de anos novos perdidos na economia
A manchete desta Folha na véspera do Natal
de 2002 era o anúncio completo do ministério de Lula 1. O assunto maior daquele
dezembro era outro. Havia frustração e fúria contra o anúncio da política
econômica "tucano bis" de Antonio
Palocci.
Agora, a crítica contra a persistência do
antigo regime tem o sinal trocado, baseada na suspeita de que Lula 3 possa ser
uma variação de Dilma 1. Não importa o sinal, a conversa ainda é a mesma. A
situação é muito pior.
Por volta de 2007, Lula desistiu de
aprofundar o programa de conserto das contas públicas e de uma reforma
tributária. Em parte, foi assim porque Lula apanhava de uma oposição
arrependida de não ter pedido o seu impeachment e furiosa com a derrota de
2006.
Teria sido mudança profunda, assim como o foi a esquecida solução para o problema das contas externas, que se deu no governo Lula, por um tanto de competência e outro de sorte (mudança na economia mundial, China etc.).
Endividado em dólar, com déficits ruins nas
transações com o exterior, o Brasil vivia crises periódicas de escassez de
moeda forte, quando então tinha de pedinchar ao FMI. Era uma desgraça
histórica, como essas
que ocorrem na Argentina em média a cada três anos.
Nunca mais voltamos a falar de crise de
financiamento externo. Em vez disso, nos dedicamos a cultivar crises no nosso
jardim: dívida pública doméstica excessiva que resulta em altas de juros e
risco de inflação desembestada.
É possível dar um jeito nessa crise que
começou a se desenhar em 2013, piorada por azares e por barbárie política. Mas
a situação de 2022 é muito pior do que a de 2002.
Em 2002, o governo federal gastou o
equivalente a 15,1% do PIB, com receita de 17,4% (superávit primário de 2,3%).
Em 2022, deve gastar 18,3% do PIB, com receita de 19,2%, um superávit mandrake
de 0,9%, fruto de receitas extraordinárias e de represamentos picaretas de
gastos do governo de trevas (2019-2022).
A situação é pior porque está difícil, em
termos políticos e econômicos, aumentar a carga tributária, embora seja
inevitável fazê-lo, de preferência eliminando favores para classe média, ricos
e empresas protegidas.
Está difícil conter despesas, embora seja
inevitável fazê-lo (bis). De 2002 a 2022, o gasto aumentou em 3,2% do PIB.
Cresceu 2,1 pontos na Previdência (INSS), 0,6 ponto em BPC (benefícios para
idosos e pessoas com deficiência pobres), 0,9 ponto para o Bolsa Família etc.:
"tudo pelo social".
Está difícil falar
de problema fiscal. Quem o faz é tido como sociopata, um idiota perverso da
elite ou da "Faria Lima" (de fato grossa e perversa, mas esse é outro
assunto). Enfim, pouca gente trata de como acelerar o crescimento econômico.
Lula 3 e seu culto falam sem parar de
"incluir
os pobres no Orçamento". Lula 1 dizia que viria o "milagre do
crescimento". Não foi lá milagre, mas veio e foi o maior responsável por
tirar tanta gente da pobreza, não o "Orçamento". Mesmo triplicando a
despesa com o Bolsa Família (de 0,5% do PIB na última década para 1,5% do PIB
em 2023), haverá muita miséria.
O PIB de 2022 vai ser um tico maior do que
o de 2014: década perdida. Sem terraplanismo econômico (pior de 2012 a 2014) e
barbárie política (pior de 2015 a 2022), não teria sido difícil ter crescido
uns 20% desde 2014. Estaríamos em outro mundo, embora ainda pobres, sujos e
malvados.
É possível ter políticas econômicas
diferentes, alternativas, mas não essas burrices em torno das quais giramos faz
décadas, entre elas a de achar que não há problema em pagar
juros indecentes a ricos por um endividamento equivocado, fora de hora
e sem limite.
Mas ainda dá para ter um feliz Natal em 2023.
O cara já está de olho no natal de 2023,rs.
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