sexta-feira, 22 de abril de 2022

Vera Magalhães: Indulto de Bolsonaro é só insulto ao STF

O Globo

Jair Bolsonaro concedeu indulto ao deputado federal Daniel Silveira um dia depois de o Supremo Tribunal Federal tê-lo condenado, por dez votos a um, a oito anos e nove meses de prisão em regime fechado e à perda de mandato e dos direitos políticos. O presidente anunciou a decisão na famigerada live das quintas-feiras e editou o decreto com o perdão em seguida, numa edição extra do Diário Oficial da União.

Sim, o indulto pessoal, ou graça, é uma previsão constitucional. Não, Bolsonaro não está pensando nisso, e sim em insultar, desta vez de forma frontal, o Judiciário. Está conclamando seus seguidores à guerra, e a batalha final todos sabem qual é: a eleição.

As primeiras reações colhidas junto a ministros do STF foram de cautela. “Vamos analisar”, repetiram três deles. Também ressaltaram que a graça é uma previsão legal e que o perdão à pena de prisão, segundo a súmula 631 do STJ, extingue “os efeitos primários da condenação, mas não atinge os efeitos secundários, penais ou extrapenais”. Ou seja: cassação de mandato e inelegibilidade permaneceriam.

Bernardo Mello Franco: Daniel Silveira é versão anabolizada do ʽhomo bolsonarusʼ

O Globo

A semana foi dura para três personagens da extrema direita que ascenderam na esteira do capitão. Em Brasília, o Supremo condenou o deputado Daniel Silveira por ameaças e incitação à violência contra ministros da Corte. Em São Paulo, o deputado estadual Arthur do Val renunciou para não ser cassado por quebra de decoro. No Rio, a Câmara Municipal anexou novas provas ao processo contra o vereador Gabriel Monteiro, investigado por assédio a assessores e menores de idade.

No caso de Silveira, a punição pode ser dupla. O brutamontes foi condenado a oito anos e nove meses de prisão, além da perda do mandato e dos direitos políticos. O Supremo concluiu que a imunidade parlamentar não pode servir de escudo para extremistas atentarem contra a democracia. Ontem Bolsonaro editou um decreto para perdoar o aliado, mas a palavra final ainda será dada pela Corte.

Míriam Leitão: Bolsonaro usa prerrogativa que tem para conspirar contra a democracia

O Globo

O presidente tem a prerrogativa de conceder indulto, mas a maneira como Bolsonaro o fez, a pessoa ao qual a graça foi concedida, o contexto em que tudo isso ocorre é mais um passo da sua conspiração contra a democracia.

Primeiro, aquilo que eu escrevi ontem aqui neste espaço acabou sendo confirmado por vários analistas. Fontes do STF tinham me dito que o ato de Bolsonaro não extingue as penas secundárias, ou seja, o deputado Daniel Silveira permanece inelegível. A inelegibilidade não tem natureza penal, portanto permanece. Ele não pode se candidatar.

Luiz Carlos Azedo: Perdão de Bolsonaro a Silveira confronta o Supremo

Correio Braziliense

A alternativa que se coloca para os ministros da Corte é anular a decisão de Bolsonaro que perdoa o deputado Daniel Silveira, para não serem desmoralizados e ficarem expostos a toda sorte de ataques

Ao conceder perdão ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado na quarta-feira a oito anos e nove meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente Jair Bolsonaro confrontou a Corte como nunca, instalando uma crise entre os Poderes da República, de consequências ainda imprevisíveis. Com base no artigo 734 do Código de Processo Penal, segundo o qual o presidente da República pode conceder “espontaneamente” a graça presidencial, em edição extraordinária do Diário Oficial, Bolsonaro livrou o deputado valentão da prisão, das multas e da cassação de mandato, sentença aprovada na quarta-feira, por acachapante maioria de 10 a 1.

A alternativa que se coloca para os ministros do Supremo é anular a decisão de Bolsonaro, para não serem desmoralizados e ficarem expostos a toda sorte de ataques. O presidente da República exorbitou no decreto, segundo juristas, porque poderia perdoar a pena de prisão, que é de natureza criminal, mas não as multas e a cassação de mandato, que extrapolam o escopo do instituto da graça individual (perdão). Como sabe disso, Bolsonaro tem plena consciência de que escalou uma crise institucional.

Os ministros do Supremo reagiram à medida com incredulidade, não esperavam que o presidente da República fosse além das críticas à Corte. Havia um estresse entre os Poderes desde o começo da semana, em razão do julgamento, mas os recursos apresentados pela defesa de Silveira e a necessidade de uma decisão do Supremo sobre a cassação automática ou não do mandato do parlamentar, pleiteada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criavam um campo de modulação da sentença e de negociação entre os Poderes. Bolsonaro chutou o pau da barraca.

Eliane Cantanhêde: Em guerra

O Estado de S. Paulo

Bolsonaro endossa o condenado e os ataques à democracia e ao STF

O deputado federal Daniel Silveira (PTB, ex-PSL) foi preso e condenado pelo Supremo, por dez votos a um (do bolsonarista Kassio Nunes Marques), por incitar a violência contra a democracia e a própria Corte. Pois o presidente Bolsonaro desautoriza o STF e endossa o condenado.

O deputado estadual Arthur do Val (União Brasil, ex-DEM), o “Mamãe Falei”, renunciou à Assembleia Legislativa de São Paulo depois de condenado por unanimidade pelo Conselho de Ética por, entre outras coisas, difundir que as mulheres ucranianas, vítimas da guerra, “são fáceis porque são pobres”. Bolsonaro o apoia?

O vereador e ex-PM Gabriel Monteiro (PL, ex-PRP) é alvo de processo por quebra do decoro parlamentar na Câmara do Rio de Janeiro, acusado de estupro e vídeos alisando crianças. Bolsonaro o apoia?

A eles se soma a ex-deputada federal Flordelis, cassada pela Câmara e presa por arregimentar os próprios filhos para matar o marido. Ela, porém, não representa, como os outros três, a “nova política” empurrada por Bolsonaro, em 2018, para Câmaras, Assembleias, Congresso e governos estaduais – como o juiz Wilson Witzel, no Rio.

Daniel Silveira combate a democracia, defende o AI-5 e nunca reagiu como “maricas” à covid-19, que matou 663 mil brasileiros, enquanto sua mulher recebia auxílio emergencial. Ao ser barrado no plenário do STF, restrito ao seu advogado, ele estava com o deputado Eduardo Bolsonaro, o 03, para quem “basta um cabo e um soldado para fechar o… Supremo”. Era o pai dando seu recado.

Reinaldo Azevedo: Decreto ilegal, imoral e golpista

Folha de S. Paulo

O instrumento da 'graça' não é instância revisora do Judiciário

O presidente Jair Bolsonaro decidiu fazer a maior afronta ao Supremo desde o início do seu mandato ao conceder a graça a Daniel Silveira. E a questão será, também ela, examinada pelo tribunal. Ainda que a concessão do benefício seja uma prerrogativa do presidente, a que a autoridade costuma recorrer em períodos natalinos, como uma espécie de herança da benevolência do rei, é preciso que, em regimes constitucionais, exponham-se critérios em vez de premiar pessoas previamente escolhidas.

Bolsonaro pode até ficar chocado, mas ele não é um monarca absolutista, e a faculdade de conceder a graça não o torna uma instância revisora do Judiciário. O recurso nunca foi empregado com esse propósito e, portanto, é fácil sustentar que a decisão é ilegal porque nasce como desvio de finalidade. Não se trata da concessão de graça, mas de um ato de afronta ao Supremo, que fere o princípio da independência entre os Poderes.

Ranier Bragon: A condenação de Daniel Silveira é uma condenação ao bolsonarismo

Folha de S. Paulo

Os crimes cometidos pelo deputado chulo não diferem dos perpetrados por seu inspirador

O Supremo Tribunal Federal condenou nesta quarta-feira (20) não só o deputado federal marombado que não via limites até que alguém achou por bem lhe impor algum. O bolsonarismo nasceu, prosperou e se sustenta na constante tarefa de testar limites democráticos, civilizatórios e humanistas.

A cada forçada, um leve recuo e, novamente, adiante, metodicamente, até que eventualmente um risco no chão seja marcado ou que não haja mais limite.

Daniel Silveira foi condenado por coagir julgadores e por ameaçar o Estado democrático de Direito. Crimes cometidos aos borbotões pelo bolsonarismo e, claro, Jair Bolsonaro (PL).

Hélio Schwartsman: Cana nele

Folha de S. Paulo

Crimes se cometem pela palavra, e defender liberdade de expressão não abarca tudo

Humanos usamos a linguagem para quase tudo, o que pode complicar as coisas quando se discutem os limites da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar. Foi o que se viu na condenação do deputado Daniel Silveira pelo STFO parlamentar e seus apoiadores tentam pintá-lo como um perseguido político, um mártir da liberdade de expressão, mas receio que esse a caricatura não passe mesmo de uma caricatura, daquelas bem distorcidas.

Entre as múltiplas aplicações da linguagem está a consecução de crimes. Alguns são quase inexequíveis sem o uso de palavras. Se o seu deputado favorito chega para você, diz que é um herdeiro nigeriano e que está disposto a doar-lhe uma fortuna, caso você lhe antecipe alguns milhares de reais para tocar o inventário, e você acredita e lhe adianta o dinheiro, lamento informar que foi vítima de estelionato. E acho que nem o mais ousado advogado tentaria defender o deputado argumentando que a história fraudulenta que ele lhe contou está protegida pela imunidade parlamentar, que é uma espécie de liberdade de expressão premium.

Bolsonaro enfrenta STF e concede perdão a Daniel Silveira

Presidente fez pronunciamento ao vivo e, em seguida, publicou decreto que extingue penas de prisão e multa impostas ao deputado do PTB

Weslley Galzo, Célia Froufe, Julia Affonso, Marcelo Godoy e Gustavo Queiroz, / O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Menos de 24 horas depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) condenar o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) a oito anos e nove meses de prisão, o presidente Jair Bolsonaro saiu em defesa do aliado. Ele editou um inédito decreto e concedeu perdão da pena imposta por dez dos 11 ministros da Corte.

A decisão de Bolsonaro foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) nesta quinta-feira, 21. Antes, ele havia anunciado o benefício da graça – perdão individual da pena – em transmissão nas redes sociais ao lado da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Na fala ao vivo, Bolsonaro desafiou o Supremo: “Este é um decreto que vai ser cumprido”, afirmou. Silveira, que foi à Corte no dia de seu julgamento acompanhado do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente, foi condenado por incitar agressões a ministros e atentar contra a democracia. Silveira defendeu também o fechamento do STF e estimulou animosidade com as Forças Armadas. A Corte mandou a Câmara cassar o mandato do parlamentar bolsonarista, que quer concorrer ao Senado pelo Rio.

Congressistas reagiram e prometeram entrar com ações no Supremo contra o ato presidencial. Segundo apurou o Estadãoministros dizem considerar Silveira inelegível, embora o decreto não se estenda apenas à ordem de prisão. Eles já esperam as ações contra o decreto.

Bolsonaro desafia STF e concede perdão a deputado condenado

Presidente diz que decreto é resultado da “comoção” que decisão do Supremo provocou na sociedade

Por Matheus Schuch, Vandson Lima, Luísa Martins, Marcelo Ribeiro, Arthur Rosa e Joice Bacelo / Valor Econômico

Brasília e São Paulo - O presidente Jair Bolsonaro assinou ontem um decreto concedendo perdão ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 8 anos e 9 meses de prisão por ataques à democracia. Além de ampliar a crise institucional, a medida é vista com ressalvas por ministros do STF ouvidos pelo Valor. Em reservado, integrantes da Corte adiantaram que a iniciativa de Bolsonaro, ainda que venha a ser considerada legal, não reverterá a inelegibilidade do parlamentar. Parlamentares da oposição já questionam a medida no STF e cogitam novo pedido de impeachment contra Bolsonaro.

Silveira foi condenado pelo STF a regime fechado, multa de R$ 200 mil, perda do mandato e dos direitos políticos. A decisão foi apoiada por 10 dos 11 ministros da Corte - inclusive por um indicado pelo presidente à Corte, o ministro André Mendonça.

Na noite passada, Bolsonaro abriu transmissão ao vivo nas redes sociais e anunciou: “É uma notícia de extrema importância para a nossa democracia e a nossa liberdade; um documento que eu comecei a trabalhar desde ontem [quarta-feira], quando foi anunciada a prisão.”

Kassab sinaliza desistência de candidatura própria do PSD à Presidência

Em giro nacional, iniciado nesta semana no Rio, presidente da sigla esteve com líderes do partido e avançou na articulação para liberar alianças nos estados. Intenção é não fazer coligação no primeiro turno, o que frustra PT

Bernardo Mello / O Globo

RIO — O presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, iniciou nesta semana uma série de conversas com lideranças regionais do partido e sinalizou a desistência de lançar uma candidatura própria ao Palácio do Planalto. No Rio, terça-feira, Kassab e o prefeito Eduardo Paes (PSD) conversaram sobre liberar os estados para fazer palanques com diferentes presidenciáveis. O movimento frustra o PT, do ex-presidente Lula, que vem costurando apoios a candidatos do PSD em estados como Minas Gerais e Pernambuco na expectativa de fechar uma coligação nacional já no primeiro turno, algo que desagrada uma ala do partido.

Nas próximas semanas, Kassab deve reunir-se com os senadores Otto Alencar, da Bahia, e Omar Aziz, do Amazonas. Ambos já vinham manifestando apoio à candidatura presidencial de Lula, com aval da cúpula do PSD, mesmo quando o partido ensaiava ter candidato.

Sem um candidato próprio à Presidência, desejo inicial de Kassab, e com palanques estaduais liberados, o PSD tende a se aproximar de Lula em até 12 estados. Em seis, por outro lado, incluindo colégios eleitorais como Goiás e Paraná, a sigla pode se alinhar ao presidente Jair Bolsonaro.

Para interlocutores de Kassab, faltam hoje nomes com peso nacional e histórico na gestão pública que estejam dispostos a encabeçar uma chapa à Presidência pelo partido. Na avaliação desse grupo, o PSD tem cinco nomes que cumpririam esses requisitos: Paes, Otto Alencar, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), o governador do Paraná, Ratinho Jr., e o próprio Kassab. Nenhum deles topa a empreitada.

Maria Cristina Fernandes: Por que a terceira via “descobriu” o pedetista agora

Valor Econômico

Ciro é carta na manga para negociar com Lula

Apesar de estar desde o ano passado na estrada com sua pré-candidatura pelo PDT à Presidência da República, só agora o ex-ministro Ciro Gomes virou a bola da vez na terceira via. Todo o movimento dos pré-candidatos da terceira via dava-se à revelia dele, que, depois da inviabilidade da candidatura de Sergio Moro, é o único que se aproxima dos dois dígitos.

Ciro virou o eixo do pessoal da terceira via da noite para o dia. Já encontrou o pessoal do União Brasil e vai conversar com Gilberto Kassab. Em sabatina do “UOL” e da “Folha de S.Paulo” confirmou o encontro com o presidente do PSD sem precisar a data.

Ciro elogiou a pré-candidata do MDB, Simone Tebet, e tem no senador Tasso Jereissati seu principal aliado no PSDB. Já disse que senta pra conversar com todos da terceira via, só não fazia com Sergio Moro quando o ex-juiz estava na roda.

O que está por trás desse assédio não é a viabilidade eleitoral do pré-candidato do PDT. Ciro não vai tão mal nas pesquisas, tem um eleitorado cativo, de ciristas militantes mesmo, é muito ativo nas redes sociais e atento à dinâmica da linguagem. Durante a sabatina escapou da pergunta sobre aborto (“não é tema do Executivo”) argumentando que o bolsonarismo faria uso distorcido de qualquer trecho de sua fala e isso se voltaria contra si.

Sem acordo com PT, PSD de Minas acena para Ciro

Petistas insistem em lançar candidato próprio ao Senado

Por Cibelle Bouças /Valor Econômico

Belo Horizonte - A falta de consenso com o PT para candidato ao Senado por Minas Gerais tem levado o PSD a avaliar uma mudança da esquerda para o centro. Não por acaso, o pré-candidato à Presidência pelo PDT, Ciro Gomes, tem se aproximado mais do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Se PT e PSD não chegarem a um acordo nos próximos dias, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ficará fora do palanque do ex-prefeito e candidato ao governo do Estado Alexandre Kalil (PSD).

O partido de Gilberto Kassab já decidiu competir com chapa pura em Minas Gerais, tendo Kalil concorrendo ao governo estadual, o deputado Agostinho Patrus, como vice, e o senador Alexandre Silveira buscando a reeleição. O PT impôs como condição para Lula apoiar Kalil a candidatura do deputado Reginaldo Lopes ao Senado.

Ala tucana defende sair da corrida presidencial

Diagnóstico de parte da bancada do PSDB é que nem Doria nem Leite conseguirão reunificar a sigla

Por Marcelo Ribeiro e Raphael Di Cunto / Valor Econômico

Brasília - Em meio às divergências internas sobre a pré-candidatura de João Doria (PSDB) à Presidência da República, uma ala do PSDB passou a defender a tese de que o partido não apresente nenhum nome para a corrida ao Palácio do Planalto e concentre energias e recursos em uma estratégia que amplie as chances de vitória do governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), que concorrerá à reeleição, e que viabilize um aumento da bancada no Congresso Nacional. O grupo de Doria, que venceu as prévias feitas pelo partido no ano passado, rechaça essa ideia.

O eventual abandono da disputa nacional ganha adesões na bancada tucana, diante do diagnóstico de que tanto a permanência de Doria como pré-candidato como a substituição do ex-governador paulista por Eduardo Leite (PSDB) serão incapazes de reunificar a legenda comandada por Bruno Araújo.

Segundo apurou o Valor, a sugestão deve ser apresentada pelos parlamentares ao dirigente nacional como solução com potencial de restabelecer a unidade da sigla. Isso é considerado essencial por essa ala para que o partido não perca o controle do Estado de São Paulo, que está nas mãos do PSDB desde 1995.

Além disso, o fim da crise interna é fundamental para que a legenda volte a ter uma bancada numerosa na Câmara dos Deputados. Hoje, o PSDB conta com apenas 23 parlamentares. Na eleição de 2014, quando Aécio Neves (PSDB) foi derrotado por Dilma Rousseff (PT) no segundo turno da corrida presidencial, o partido elegeu 54 deputados.

César Felício: Custo de vida pode decidir uma eleição?

Valor Econômico

Na França, eleitor parece não se guiar pela perda de renda

A eleição deste domingo na França pode trazer recados surpreendentes ao presidente Jair Bolsonaro e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Estabelecer analogias entre o segundo turno do país europeu e o Brasil não será tão óbvio como se poderia inferir.

O presidente Emmanuel Macron, de centro-direita, é favorito para continuar no Palácio do Eliseu por mais quatro anos. Marine Le Pen, da extrema-direita, tende a perder. Isso indica que a maré a favor do populismo conservador e autocrático começa a refluir no mundo e pode fomentar um clima desfavorável à reeleição do presidente Jair Bolsonaro aqui? Não necessariamente. Sob um determinado ponto de vista, a provável vitória de Macron relativiza o peso da economia na campanha, um dos trunfos de Lula.

É fato que existem ondas na política eleitoral mundial. É impossível não estabelecer ligação entre a vitória de Donald Trump e do Brexit no Reino Unido em 2016 e a de Bolsonaro no Brasil, em 2018. Assim como não há dúvidas que é com Marine Le Pen que a direita conservadora brasileira mais se identifica. O maniqueísmo ideológico é uma paixão mundial.

Fernando Abrucio*: As peças-chave para as eleições 2022

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O tema do pleito deste ano não será a corrupção, nem o embate entre a velha e a nova política, e sim a avaliação do legado bolsonarista

Entender a eleição presidencial num país tão complexo em termos sociais e políticos como o Brasil é uma tarefa muito complicada. É sempre mais fácil explicar depois o que levou à vitória de um candidato e à derrota dos outros. Óbvio que não há bola de cristal entre os cientistas políticos, mas é possível pensar nos fatores que impactam a campanha eleitoral e mostrar como eles podem atuar especificamente num determinado pleito.

Eleições têm elementos que, em grande medida, repetem-se, como padrões de determinados eleitorados, a importância do bem-estar social do eleitor e as peças-chave que são estratégicas. Não obstante, cada disputa eleitoral tem sua singularidade, que fica mais clara quando se compara com a anterior. Assim, é essencial frisar, antes de mais nada, as diferenças de 2022 em relação ao que ocorreu em 2018.

O tema do pleito deste ano não será a corrupção, nem o embate entre a velha e a nova política. Evidente que parte do eleitorado continua a olhar para possíveis comportamentos corruptos dos candidatos e partidos - por isso que Bolsonaro e Lula vão tentar falar da corrupção do outro. Só que essa questão, tomada individualmente, não será a definidora do voto da maioria dos brasileiros.

Do mesmo modo, o vencedor não será aquele que se apresentar como o que vai sepultar os políticos oligárquicos, embora os dois líderes na pesquisa se beneficiem por terem um certo perfil antissistema, algo que tem apelo popular na maior parcela do eleitorado brasileiro.

O ponto de partida da eleição de 2022 será diferente. A crise de representação iniciada em 2013 teve seu auge em 2018, e pedia-se então alguém que refundasse o sistema. Agora está em jogo, principalmente, a avaliação do legado bolsonarista. Bolsonaro tentará mostrar não só o que fez, mas o que só ele poderá fazer - por exemplo, proteger a família e a liberdade (mesmo que defendendo a ditadura militar e os torturadores) e garantir a hegemonia política e moral de determinada fatia das organizações religiosas evangélicas, por meio de políticas públicas e mudanças no Supremo Tribunal Federal. Seus opositores somente vão ganhar força se forem capazes de centrar foco nos problemas do bolsonarismo, naquilo que a maioria do eleitorado (especialmente as classes D e E) acreditar ser um fracasso do atual governo, o que se soma, em menor medida, a temas em que a classe média avalia mal o presidente, como a questão ambiental e os maus modos políticos de Bolsonaro.

José de Souza Martins*: O brasileiro tem memória política curta

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O brasileiro esquece com facilidade as injúrias, as patifarias antissociais, as agressões ao próprio direito de ser representando no processo político

O período do governo Bolsonaro tem servido como uma espécie de período experimental de conhecimento das novas fragilidades do processo político no Brasil. Não só pelos constantes desafios a valores, costumes e regras da própria ciência no que diz respeito à gestão política do país, mas também pelas reiteradas ações de desconstrução das instituições.

É um governo interessante como cobaia da curiosidade científica a respeito da vulnerabilidade da ordem social e política. Muita coisa será aprendida até o final do ano e o final do governo para que os partidos democráticos possam se reorganizar e possam definir e empreender as profundas reformas políticas de que o país carece. Para que não recaia nas armadilhas da improvisação, do amadorismo e do autoritarismo embutido nas estruturas fundamentais do Estado brasileiro.

O novo governo chegou aparelhado por agentes de mentalidades exóticas, grupos extraoficiais de poder, invasivos, impunes e dotados de suficiente ousadia para desmontar o Estado e fragilizar a consciência crítica própria de uma sociedade que com dificuldade tem construído sua democracia.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Atacar a democracia é crime

O Estado de S. Paulo

Imunidade parlamentar não inclui agredir a democracia e o livre funcionamento das instituições republicanas, reafirmam PGR e STF. A condenação do bolsonarista é pedagógica

Ao condenar o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) a oito anos e nove meses de reclusão, pelos crimes de ameaça ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi pedagógico. Não existe liberdade de expressão para atacar a democracia. Não existe imunidade parlamentar para impedir o livre funcionamento das instituições republicanas.

Por 10 votos contra 1, o plenário do STF entendeu que a conduta de Daniel Silveira foi criminosa, isto é, que se enquadra naquelas hipóteses em que, ao atingir bens essenciais de uma sociedade, a lei prevê a imposição de uma pena. Os oito anos e nove meses de prisão não são desproporcionais, mas estrita aplicação da legislação a que todos os cidadãos estão sujeitos.

No processo, nada houve de perseguição política. Foi apenas o Estado, por meio de suas instituições, cumprindo seu papel de impedir que condutas consideradas criminosas pela lei fiquem impunes. Ao contrário do que os bolsonaristas dizem, não foi o Supremo que, num rompante autoritário, investigou, denunciou e puniu Daniel Silveira. A acusação contra o deputado bolsonarista não foi apresentada pelo ministro Alexandre de Moraes, e sim pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Foi ela quem primeiro entendeu que a atuação de Daniel Silveira havia sido criminosa.

É sintomático que o bolsonarismo, tão afeito ao punitivismo – sua retórica é sempre de aumento da pena –, tenha se mobilizado, de forma tão intensa, pela impunidade de Daniel Silveira. Não era apenas que “um dos nossos” estava sendo julgado por sua conduta tresloucada. Foi a própria tática política do bolsonarismo, de agressão contra as instituições, que estava no banco dos réus. Daí a importância do julgamento de quarta-feira passada: o Estado Democrático de Direito, por meio de suas instituições, reconheceu que a política também está sujeita a regras e a limites. Não é um vale-tudo, não é um mundo sem lei.

A atividade parlamentar dispõe de prerrogativas constitucionais. Como é próprio de um regime democrático, “os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos” (art. 53 da Constituição). No entanto, ameaçar e agredir não é uma opinião: é crime. E não cabe usar a imunidade parlamentar como “escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas”, lembrou Alexandre de Moraes.

Poesia | Joaquim Cardozo:Tarde no Recife

Tarde no Recife.
Da ponte Maurício o céu e a cidade.
Fachada verde do Café Maxime,
Cais do Abacaxi. Gameleiras.

Da torre do Telégrafo Ótico
A voz colorida das bandeiras anuncia
Que vapores entraram no horizonte.

Tanta gente apressada, tanta mulher bonita;
A tagarelice dos bondes e dos automóveis.
Um camelô gritando: — alerta!
Algazarra. Seis horas. Os sinos.

Recife romântico dos crepúsculos das pontes,
Dos longos crepúsculos que assistiram à passagem dos fidalgos
[holandeses,
Que assistem agora ao movimento das ruas tumultuosas,
Que assistirão mais tarde à passagem dos aviões para as costas
[do Pacífico;
Recife romântico dos crepúsculos das pontes
E da beleza católica do rio.

In: CARDOZO, Joaquim. Poesias completas. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. p.6-7