O Globo
O debate religioso, para além do consenso
sobre a liberdade de credo, só interessa às pessoas que querem nos jogar num
mundo pré-moderno
A imprensa fala de uma guerra santa, movida
pela campanha de Bolsonaro. Isso interessa a ele, que vê guerra em todos os
lugares, possivelmente porque a vive dentro de si próprio. Além do mais, não
tem nada de santa: apenas uma tática para assustar as pessoas.
Por isso que o demônio ganhou tanto peso no
discurso oficial; ele é apontado aqui e ali, como se fosse um atributo da
oposição.
O diabo é um dos grandes temas do
monumental “Grande sertão: veredas”, de Guimarães Rosa. Mas aparece com tantas
nuances na cabeça do jagunço Riobaldo que alguns intérpretes afirmam que o
escritor usa o diabo para descrever a visão do mundo da personagem: um mundo de
coisas impermanentes, transitórias, sem existência autônoma. Para alguns, o
budismo no sertão de Minas.
O diabo existe ou não existe? Riobaldo já
nos primeiros parágrafos fala de um bezerro com cara de cachorro que ria como
uma pessoa. Foi morto porque era diferente.
Mas é pela sabedoria de um compadre Quelemém que ele chega à conclusão de que o diabo “vige dentro do homem, nos crespos do homem — ou é o homem arruinado ou o homem ao avesso. Solto por si, cidadão, é que não tem diabo nenhum”.