Em ofensiva de charme, Scholz busca reativar relação marcada por promessas, mas que nunca alcançou pleno potencial
Por André Duchiade / O Globo
Desde agosto de 2015 um chanceler alemão
não viaja a Brasília. Após os ex–presidentes Michel Temer e Jair Bolsonaro
serem ignorados, Luiz Inácio Lula da Silva recebe nesta segunda-feira no
Planalto Olaf Scholz, chefe de governo da quarta maior economia do mundo, com
meio ambiente, apoio à democracia e o acordo entre Mercosul e União Europeia
(UE) no topo da agenda. Para além das amabilidades, o desafio é fazer andar uma
parceria que há muito parece promissora, sem jamais alcançar o pleno potencial.
Para o Brasil, o interesse é elementar.
Após quatro anos de ostracismo, durante os quais não houve uma só recepção
oficial para Bolsonaro em uma grande capital europeia, o governo deseja antes
de tudo reativar a sua política externa e se aproximar de um país rico e
poderoso, com potencial de maior cooperação em áreas como clima e tecnologia e
interesses convergentes em temas difíceis como a reforma do Conselho de
Segurança da ONU.
— Este encontro tem a missão primária de restabelecer as relações. O Brasil precisa ter uma política exterior, o país é grande demais para não ter uma orientação no plano internacional como vinha acontecendo — afirmou ao GLOBO Dawisson Belém Lopes, professor de Relações Internacionais da UFMG. — A Alemanha é o país mais rico da Europa, fundamental nas relações internacionais, e as relações certamente estão abaixo do seu potencial. O Brasil busca retomar o curso normal.
Para a Alemanha, a situação é mais
complexa. Depois de obter enormes vantagens com a ordem internacional do
pós-guerra, sobretudo após o fim da Guerra Fria, Berlim se vê em um mundo mais
hostil, de rivalidade entre superpotências e uma guerra a 1.500 km a leste da sua
fronteira. O Brasil surge como potencial aliado importante:
— As transformações do sistema
internacional são muito preocupantes para a Alemanha. Um mundo mais multipolar
é mais hostil. A Alemanha se preocupa com a tensão crescente entre EUA e China
— afirmou Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da FGV/SP. — O
Brasil surge como um ator de destaque na própria região. Embora não se compare
com grandes potências como EUA e China, pode ser um parceiro importante para
garantir a resiliência do multilateralismo.
A vinda tão célere de Scholz — a primeira
de um líder europeu, que deve ser seguida em breve pelo presidente da França—
indica como o governo alemão quer demonstrar que valoriza a relação, numa
tática que o telejornal alemão Tagesschau chamou de “ofensiva de charme”. Outra
sinalização importante já aconteceu na posse de Lula, quando veio a Brasília o
presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, e a ministra do Meio Ambiente,
Steff Lemke.
Para além dos interesses geopolíticos, uma
afinidade ideológica liga desde os anos 1980 o Partido Social-Democrata (SPD),
de Scholz, e o PT de Lula. Em 2018, o presidente recebeu uma visita do ex-líder
do SPD Martin Schulz na prisão em Curitiba. Em novembro de 2021, Scholz, já
eleito, se reuniu com Lula em Berlim, e disse estar “encantado com as boas
discussões”. Apenas de 2003 a 2005, quando o chanceler era Gerhard Schröder,
petistas e sociais-democratas alemães lideraram governos federais ao mesmo
tempo
Influência diminuindo
Os desafios são muitos. A influência alemã
e europeia na América do Sul e no Brasil vem diminuindo. Enquanto o país
europeu tinha uma participação de 9,4% nas importações brasileiras em 2002,
esse percentual caiu para apenas 5,1%, enquanto as da China subiram e
alcançaram 22,4%.
Em análise recente, a Fundação de Ciência e
Política (SWP), de Berlim, diz que “narrativas que postulam ‘valores comuns’,
‘parceria estratégica’ ou um ‘diálogo olhos nos olhos’” são “retóricas
ilusórias” que “cada vez fazem menos justiça” aos fatos. “A base comum está
desmoronando”, diz o texto, que aponta o crescimento da influência chinesa.
Em, 2015, quando Angela Merkel veio ao
Brasil para se encontrar com a então presidente Dilma Rousseff, cujo governo já
estava em crise, manifestou interesse em investir em projetos de infraestrutura
e logística. O seu vice-ministro das Finanças deixou claro que isso não ia
acontecer — como de fato não ocorreu — exceto se o Brasil apresentasse um
“quadro mais interessante”, isto é, reformas estruturais que oferecessem maior segurança
e diminuição do "risco Brasil".
Um artigo publicado na semana passada no
site da rede pública DW afirma que na América do Sul “a Alemanha é um pouco
como o velho amigo de escola que bate à porta a cada poucos anos, brinda à
amizade mútua e aos velhos tempos e depois desaparece rapidamente. Uma
estratégia que está claramente a atingir os seus limites face à difícil
conjuntura geopolítica mundial”.
Para resolver isso, o SWP propõe “não
apenas retomar a cooperação, mas também remodelá-la”, por meio, por exemplo, de
“desenvolvimento tecnológico conjunto” ou do “uso sustentável de recursos”.
Scholz parece disposto a isso. Na Argentina e no Chile, onde o chanceler esteve
no fim de semana, estiveram em pauta projetos de desenvolvimento envolvendo
lítio e hidrogênio verde.
R$ 3,3 bilhões em recursos
No Brasil, o principal interesse está na
preservação da Amazônia. O Itamaraty informou que Scholz vai oficializar hoje a
liberação de € 31 milhões (R$ 172 milhões) para o Fundo Amazônia. Os recursos
serão divididos em duas partes, com € 10 milhões (R$ 55 milhões) destinados a
projetos de bioeconomia na região amazônica e outros € 21 milhões (R$ 116
milhões) para ações de combate ao desmatamento.
A Alemanha já se comprometeu em dezembro a
aplicar rapidamente € 35 milhões (R$ 194 milhões) do fundo, que tem cerca de €
600 milhões (R$ 3,33 bilhões) em recursos disponíveis para novos projetos. O
fundo está congelado desde 2019 quando o então ministro do Meio Ambiente,
Ricardo Salles, mudou as regras da gestão dos recursos sem consultar Alemanha e
Noruega, os seus doadores.
Dezenas de empresários viajam juntos a
Scholz, e eles se reúnem separadamente com o vice-presidente e ministro da
Indústria, Geraldo Alckmin. Também participa do encontro a ministra do
desenvolvimento da Alemanha, Svenja Schulze, que está no Brasil desde sábado, e
já se reuniu com o setor da indústria e do comércio.
Segundo Schulze, o foco da política de
desenvolvimento alemã no Brasil deve ser em “bens globais: clima, florestas
tropicais, biodiversidade. Especificamente, trata-se da proteção e uso
sustentável de florestas tropicais, energias renováveis e eficiência
energética, bem como desenvolvimento urbano sustentável”, afirmou em
comunicado.
Na agenda entre Lula e Scholz — que inclui
um encontro no Planalto à tarde, e um jantar no Itamaraty — também estará em
pauta o acordo Mercosul-UE, assinado em 2019 mas jamais ratificado. Países
europeus desde então atribuem à devastação na Amazônia durante o governo
Bolsonaro como motivo para o acordo não andar. Na quarta-feira, Lula disse no
Uruguai que considera a concretização do pacto uma pauta “urgente”.
O PT já sinalizou que deseja rever algumas
cláusulas, por considerá-las pouco vantajosas para produtores e empresários
brasileiros. Segundo Dawisson Belém Lopes, os setores que o PT deseja rever
incluem agricultura, agropecuária, compras governamentais, propriedade
intelectual e desenvolvimento sustentável.
Defesas enfáticas da preservação da
democracia e dos direitos humanos no Brasil devem ser feitas por Scholz à
imprensa. A guerra na Ucrânia pode vir a ser citada nas conversas, mas não deve
ocupar espaço central na agenda. Há grande cooperação acadêmica entre os dois
países, e anúncios neste sentido são aguardados.
No mais, a expectativa é de que este seja
só um primeiro passo de uma parceria mais intensa. Scholz já veio ao Brasil em
2013, quando era prefeito de Hamburgo. Na ocasião, disse que “a América Latina
apresenta um potencial incrível”. A aposta é que esse potencial enfim se
concretize em algo mais sólido.
— A Alemanha quer cooperar. Quer fazer contribuição com tecnologia, na economia, no meio ambiente — disse Kai Michael Kenkel, professor de Relações Internacionais da PUC-Rio. — Na Alemanha, há um enorme alívio por uma volta à normalidade no Brasil. Na imprensa alemã se diz que “temos nosso parceiro de volta”. Estão muito felizes por ter no Brasil alguém com quem possam falar sensatamente.
Em 1 mês, Lula reconstruiu quase todas as pontes que o GENOCIDA fujão dinamitou nos 4 anos do seu DESgoverno, auxiliado pelo canalha Ernesto Araújo, que idolatrava Trump e se orgulhava de transformar o Brasil em pária no mundo!
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